STJ: Recurso especial – Procedimento de dúvida suscitado pelo Oficial do Cartório de Registro de Imóveis – Discussão sobre a interpretação do art. 108 do CC – Procedência da dúvida nas instâncias ordinárias – Entendimento pela necessidade de escritura pública para registro de contrato de compra e venda de imóvel cujo valor da avaliação pelo Fisco foi superior a trinta salários mínimos, ainda que o valor do negócio declarado pelas partes tenha sido inferior – Insurgência da empresa requerente do registro – Hipótese em que o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis suscitou dúvida ao Poder Judiciário, referente à interpretação do art. 108 do CC – O oficial cartorário e a empresa requerente do registro divergem quanto ao valor a ser considerado para fins de incidência da regra legal em questão: para aquele, a escritura de compra e venda deve ser feita por instrumento público, já que o fisco municipal avaliou o imóvel em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos; para esta, a escritura de compra e venda pode ser feita por instrumento particular, pois o valor do negócio declarado pelas partes no contrato foi inferior a 30 (trinta) salários mínimos – As instâncias ordinárias entenderam que o valor a ser considerado, para fins de aferição da necessidade de escritura pública no caso concreto, não deve ser aquele declarado pelas partes, mas o da avaliação realizada pelo fisco, destacadamente quando o propósito dos interessados e a finalidade precípua do instrumento é a transferência de propriedade do bem, e não apenas o de retratar uma mera transação – 1. A interpretação dada ao art. 108 do CC pelas instâncias ordinárias é mais consentânea com a finalidade da referida norma, que é justamente conferir maior segurança jurídica aos negócios que envolvem a transferência da titularidade de bens imóveis – 2. O art. 108 do CC se refere ao valor do imóvel, e não ao preço do negócio. Assim, havendo disparidade entre ambos, é aquele que deve ser levado em conta para efeito de aplicação da ressalva prevista na parte final desse dispositivo legal – 3. A avaliação feita pela Fazenda Pública para atribuição do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos previstos em lei, refletindo, de forma muito mais consentânea com a realidade do mercado imobiliário, o verdadeiro valor do imóvel objeto do negócio – 4. Recurso especial desprovido.
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.099.480 – MG (2008/0230045-4)
RELATOR : MINISTRO MARCO BUZZI
RECORRENTE : CONSTRUTORA E INCORPORADORA TERRANOVA LTDA
ADVOGADO : JOSÉ CESAR PALACINI DOS SANTOS E OUTRO(S)
RECORRIDO : OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE
MONTE SANTO DE MINAS
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
EMENTA
RECURSO ESPECIAL – PROCEDIMENTO DE DÚVIDA SUSCITADO PELO OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS – DISCUSSÃO SOBRE A INTERPRETAÇÃO DO ART. 108 DO CC – PROCEDÊNCIA DA DÚVIDA NAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS – ENTENDIMENTO PELA NECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA PARA REGISTRO DE CONTRATO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL CUJO VALOR DA AVALIAÇÃO PELO FISCO FOI SUPERIOR A TRINTA SALÁRIOS MÍNIMOS, AINDA QUE O VALOR DO NEGÓCIO DECLARADO PELAS PARTES TENHA SIDO INFERIOR. INSURGÊNCIA DA EMPRESA REQUERENTE DO REGISTRO.
Hipótese em que o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis suscitou dúvida ao Poder Judiciário, referente à interpretação do art. 108 do CC.
O oficial cartorário e a empresa requerente do registro divergem quanto ao valor a ser considerado para fins de incidência da regra legal em questão: para aquele, a escritura de compra e venda deve ser feita por instrumento público, já que o fisco municipal avaliou o imóvel em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos; para esta, a escritura de compra e venda pode ser feita por instrumento particular, pois o valor do negócio
declarado pelas partes no contrato foi inferior a 30 (trinta) salários mínimos.
As instâncias ordinárias entenderam que o valor a ser considerado, para fins de aferição da necessidade de escritura pública no caso concreto, não deve ser aquele declarado pelas partes, mas o da avaliação realizada pelo fisco, destacadamente quando o propósito dos interessados e a finalidade precípua do instrumento é a transferência de propriedade do bem, e não apenas o de retratar uma mera transação.
1. A interpretação dada ao art. 108 do CC pelas instâncias ordinárias é mais consentânea com a finalidade da referida norma, que é justamente conferir maior segurança jurídica aos negócios que envolvem a transferência da titularidade de bens imóveis.
2. O art. 108 do CC se refere ao valor do imóvel, e não ao preço do negócio. Assim, havendo disparidade entre ambos, é aquele que deve ser levado em conta para efeito de aplicação da ressalva prevista na parte final desse dispositivo legal.
3. A avaliação feita pela Fazenda Pública para atribuição do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos previstos em lei, refletindo, de forma muito mais consentânea com a realidade do mercado imobiliário, o verdadeiro valor do imóvel objeto do negócio.
4. Recurso especial desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo (Presidente), Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília (DF), 02 de dezembro de 2014 (Data do Julgamento)
MINISTRO RAUL ARAÚJO
Presidente
MINISTRO MARCO BUZZI
Relator
RECURSO ESPECIAL Nº 1.099.480 – MG (2008/0230045-4)
RECORRENTE : CONSTRUTORA E INCORPORADORA TERRANOVA LTDA
ADVOGADO : JOSÉ CESAR PALACINI DOS SANTOS E OUTRO(S)
RECORRIDO : OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE MONTE SANTO DE MINAS
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):
Trata-se, na origem, de procedimento de dúvida suscitado pelo OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE MONTE SANTO DE MINAS em relação a pedido de registro de escritura de compra e venda feito por CONSTRUTORA E INCORPORADORA TERRANOVA LTDA.
Segundo o oficial cartorário suscitante, a escritura de compra e venda em questão deveria ser feita por instrumento público, nos termos do art. 108 do CC, já que o fisco municipal avaliou o imóvel em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos.
Em contrapartida, a empresa requerente do registro alegou que a escritura de compra e venda poderia ser feita por instrumento particular, pois o valor do negócio declarado pelas partes no contrato foi inferior a 30 (trinta) salários mínimos.
O Juízo de primeiro grau julgou procedente a dúvida suscitada, entendendo que o valor a ser considerado, para fins de aferição da necessidade de escritura pública no caso concreto, não deve ser aquele declarado pelas partes, mas o da avaliação realizada pelo fisco. Confira-se, a propósito, o seguinte excerto da parte dispositiva da sentença (e-STJ fls. 74-77):
Ante o exposto e considerando o que tudo dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada pelo Oficial do Registro de Imóveis, e mantenho a recusa de acesso do título ao sistema registrário, cumprindo-se o inciso I do artigo 203 da Lei de Registros Públicos, ratificando a determinação para não proceder a nenhum registro de escritura particular cuja avaliação pelo fisco seja superior ao limite estabelecido no artigo 108 do Código Civil Brasileiro, conforme ofício 10/2006, expedido por ocasião da correição ordinária de ano de 2006.
Interposta apelação, o TJMG negou provimento ao recurso, em acórdão assim ementado (e-STJ fls. 189-199):
SUSCITAÇÃO DE DÚVIDA – IMÓVEL AVALIADO PELO FISCO POR VALOR SUPERIOR A TRINTA SALÁRIOS MÍNIMOS – NECESSIDADE DE ESCRITURA PÚBLICA.
A escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País (art. 108, Código Civil). O valor do imóvel a ser considerado deve ser o da avaliação efetivada pelo Fisco – e não o constante do instrumento da transação pactuada. Os enunciados disponibilizados pelo Conselho da Justiça Federal, e elaborados durante a 4ª Jornada de Direito Civil, não têm força de lei – e não produzem os efeitos almejados pela apelante.
Opostos embargos de declaração, foram rejeitados (e-STJ fls. 217-221).
Inconformada, a recorrente interpôs o presente recurso especial (e-STJ fls.
244-261), com fundamento no art. 105, III, “a” e “c”, da CF, alegando violação dos arts. 104, 107, 108, 113, 422, 1.227 e 1.245 do CC, 5º e 6º da LNDB, 35, II, do CTN e 460, 535 e 537 do CPC. Sustenta, em síntese, que “o termo valor inserto no artigo 108 do Novo Código Civil significa, para os negócios onerosos, (…) aquele estabelecido e convencionado pelas partes na realização do negócio”, e não o da avaliação feita pela Fazenda Pública.
Sem contrarrazões (e-STJ fl. 285).
Juízo de admissibilidade positivo (e-STJ fls. 286-287).
Parecer do Ministério Público pelo não conhecimento do recurso ou, caso conhecido, pelo seu desprovimento (e-STJ fls. 294-297).
É o relatório.
Hipótese em que o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis suscitou dúvida ao Poder Judiciário, referente à interpretação do art. 108 do CC.
O oficial cartorário e a empresa requerente do registro divergem quanto ao valor a ser considerado para fins de incidência da regra legal em questão: para aquele, a escritura de compra e venda deve ser feita por instrumento público, já que o fisco municipal avaliou o imóvel em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos; para esta, a escritura de compra e venda pode ser feita por instrumento particular, pois o valor do negócio declarado pelas partes no contrato foi inferior a 30 (trinta) salários mínimos.
Instâncias ordinárias entenderam que o valor a ser considerado, para fins de aferição da necessidade de escritura pública no caso concreto, não deve ser aquele declarado pelas partes, mas o da avaliação realizada pelo fisco, destacadamente quando o propósito dos interessados e a finalidade precípua do instrumento é a transferência de propriedade do bem, e não apenas o de retratar uma mera transação.
1. A interpretação dada ao art. 108 do CC pelas instâncias ordinárias é mais consentânea com a finalidade da referida norma, que é justamente conferir maior segurança jurídica aos negócios que envolvem a transferência da titularidade de bens imóveis.
2. O art. 108 do CC se refere ao valor do imóvel, e não ao preço do negócio. Assim, havendo disparidade entre ambos, é aquele que deve ser levado em conta para efeito de aplicação da ressalva prevista na parte final desse dispositivo legal.
3. A avaliação feita pela Fazenda Pública para atribuição do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos previstos em lei, refletindo, de forma muito mais consentânea com a realidade do mercado imobiliário, o verdadeiro valor do imóvel objeto do negócio.
4. Recurso especial desprovido.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO MARCO BUZZI (Relator):
O recurso não merece provimento.
1. A controvérsia consiste em definir se um contrato de compra e venda de imóvel, cujo valor declarado pelas partes foi de R$ 3.000,00 (três mil reais), mas que foi avaliado pelo fisco em R$ 35.990,76 (trinta e cinco mil novecentos e noventa reais e setenta e seis centavos), deve ser formalizado por escritura pública ou pode ser feito por instrumento particular, a fim de ser levado a registro no cartório imobiliário.
Assim, o cerne da lide está na interpretação do art. 108 do CC, que prevê a necessidade de escritura pública para a validade de negócios jurídicos que visem à transferência de bens imóveis cujo valor seja superior a 30 (trinta) salários mínimos. Eis o teor do referido dispositivo legal:
Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.
De acordo com a interpretação dada pela sentença de primeiro grau e pelo acórdão recorrido, pouco importa o valor atribuído pelas partes contratantes: se a compra e venda se refere a imóvel cuja avaliação do fisco foi superior a 30 (trinta) salários mínimos, é imprescindível a lavratura de escritura pública para a operação de transferência da titularidade do bem perante o Cartório de registro de imóveis.
Já a recorrente alega o oposto: segundo sua argumentação, a avaliação do imóvel feita pela Fazenda, para fins tributários, não pode ser considerada como parâmetro para a incidência do art. 108 do CC, mas sim o valor do negócio declarado pelas partes no contrato. Cita, em favor da sua tese, o enunciado nº 289 das Jornadas de Direito Civil, de autoria do doutrinador Sílvio de Salvo Venosa, cujo teor é o seguinte:
Enunciado 289: O valor de 30 salários mínimos a que se refere o art. 108 do Código Civil brasileiro, ao dispor este sobre a forma pública ou particular dos negócios jurídicos que envolvam bens imóveis, é o atribuído pelas partes contratantes, e não qualquer outro valor arbitrado pela Administração Pública com finalidade exclusivamente tributária.
Não procedem, todavia, as razões recursais, pois a interpretação dada ao art. 108 do CC pelas instâncias ordinárias é mais consentânea com a finalidade da referida norma, que é justamente conferir maior segurança jurídica aos negócios que envolvem bem imóveis.
Saliente-se, no particular, que a escritura pública é ato realizado perante o tabelião, em que as partes manifestam sua vontade na realização de determinado negócio jurídico, observando todas as solenidades prescritas em lei; tal documento, portanto, demonstra de forma pública e solene a substância do ato, de modo que seu conteúdo goza de presunção de veracidade, trazendo, assim, maior segurança jurídica e garantia para a regularidade do negócio, neste caso, da compra e venda de bem imóvel.
Nesse sentido, merecem transcrição, respectivamente, os seguintes excertos da sentença e do voto condutor do acórdão recorrido:
Inteira razão está com o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis ao recusar o registro da escritura particular apresentada pela suscitada, considerando-se que desde a última correição este Juízo Corregedor determinou que obstasse de registrar qualquer uma que pela avaliação do fisco municipal tivesse valor superior ao limite mínimo estabelecido pelo artigo 108 do vigente Código Civil. E assim o fez no intuito de fiscalizar o recolhimento da taxa judiciária, bem como para conferir segurança aos negócios jurídicos, haja vista que a regra para a validade daqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis é a escritura pública, quando a lei não diz o contrário. Está aí um dos princípios mais conhecidos da exegese legal. A exceção deve sempre ser expressa em lei e os casos em que se admite a escritura particular de qualquer valor constam de leis especiais, nas quais não se enquadra a hipótese presente, mormente quando a diferença da avaliação para efeito fiscal é dez vezes maior do que a declarada no instrumento particular em questão. Bem observado pelo Ministério Público que a suscitação veio em boa hora. O legislador quis, ao editar o artigo 108, possibilitar transações imobiliárias sem muito custo às partes de baixa renda. Soa lógico que ao referir ao valor que permite a escritura particular o fez ligando-o ao do imóvel e não ao do negócio. Exatamente para evitar fraudes e sonegação de toda sorte. O fisco faz a avaliação o imóvel de maneira objetiva e próxima da realidade mercadológica, considera uma pauta legalmente aprovada seja pelo Município ou pelo Estado, servindo de parâmetro para todos os demais cálculos sejam de custas judiciais ou emolumentos extrajudiciais.
O argumento de que as partes exprimiram sua vontade ou de que se trata de pessoas próximas ou parentes, antes de conferir transparência ao negócio, o põe em dúvida, dada a subjetividade da declaração quanto ao valor do bem transacionado que pode nem mesmo ser o real, como pode pretender simular situação fática diversa da efetivamente transacionada. Pertinente a manifestação do Ministério Público quando questiona o valor do bem, valor do negócio e a situação do negócio sem valor, como no caso da doação pura, reforçando a idéia de que é necessário um parâmetro real para considerar o valor do imóvel. (e-STJ fls. 75-76)
A prevalecer o entendimento defendido, bastaria que as partes, ao realizarem o negócio jurídico de compra e venda de imóveis, estampassem no respectivo instrumento valores ínfimos, desvirtuando, totalmente, o espírito e a finalidade da lei, com a exclusiva finalidade de burlar o fisco e não recolher os tributos e emolumentos devidos. (e-STJ fl.
Ressalte-se ainda que o artigo 108 do Código Civil, ao prescrever a escritura pública como essencial à validade dos negócios jurídicos que objetivem a constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais, refere-se ao valor do imóvel e não ao preço do negócio. Assim, havendo disparidade entre ambos, é aquele que deve ser levado em conta para efeito de aplicação da ressalva prevista na parte final desse dispositivo legal. Nesse sentido, confira-se a seguinte opinião doutrinária, que se relaciona exatamente à situação em discussão nestes autos:
O ponto escorregadio diz respeito à admissibilidade do instrumento particular para negociar direitos reais sobre imóveis com fundamento na parte final do art. 108 do CC, cujo requisito é o valor do imóvel transacionado, o que não pode ser confundido com o preço do negócio. À toda evidência, valor do imóvel e preço do negócio são coisas distintas. Todo imóvel tem um valor, mas nem todo negócio tem um preço, como ocorre com a doação pura (sem ônus ou encargo).
A questão é: quando o registrador pode considerar preenchido o requisito do art. 108 do CC, referente ao valor do imóvel, para autorizar a instrumentação do negócio por documento particular?
Nos negócios de doação, venda, permuta e dação em pagamento, pode-se considerar como valor do imóvel a avaliação da coletoria estadual (doação) ou municipal (venda, permuta, dação em pagamento) para fins de cobrança do imposto devido, e não, necessariamente, o valor atribuído ao imóvel nos contratos gratuitos ou o valor da transação (preço) declarado nos contratos onerosos, por razões óbvias: nem sempre o valor declarado é real.
Assim, num escrito particular em que a compra e venda é realizada por valor inferior a 30 vezes o maior salário mínimo vigente no País e a guia do imposto de transmissão apresenta avaliação do imóvel com valor superior, está patente que o escrito particular não atende o disposto no art. 108 do CC, devendo ser exigida a escritura pública.
(COSTA, Valestan Milhomem da. “Indispensabilidade da escritura pública na essência do art. 108 do CC”. Revista de Direito Imobiliário , nº 60, janeiro-junho de 2006, p. 162)
Destaque-se, finalmente, que a avaliação levada a termo pela Fazenda Pública para fins de apuração do valor venal do imóvel é baseada em critérios objetivos, previstos em lei, os quais admitem aos interessados o conhecimento das circunstâncias consideradas na formação do quantum atribuído ao bem.
Portanto, agiram bem as instâncias ordinárias ao considerarem imprescindível, no caso dos autos, a escritura pública para formalização do registro da compra e venda do imóvel em foco, já que ante a avaliação do fisco competente o valor do bem é superior a 30 (trinta) salários mínimos.
2. Do exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.
É como voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
QUARTA TURMA
Número Registro: 2008/0230045-4 PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.099.480 / MG
Números Origem: 10432070136937 10432070136937001 10432070136937003
PAUTA: 02/12/2014 JULGADO: 02/12/2014
Relator
Exmo. Sr. Ministro MARCO BUZZI
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro RAUL ARAÚJO
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS
Secretária
Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI
AUTUAÇÃO
RECORRENTE : CONSTRUTORA E INCORPORADORA TERRANOVA LTDA
ADVOGADO : JOSÉ CESAR PALACINI DOS SANTOS E OUTRO(S)
RECORRIDO : OFICIAL DO CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DE MONTE SANTO DE
MINAS
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS
ASSUNTO: REGISTROS PÚBLICOS
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão, Raul Araújo (Presidente), Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator.
DJe: 25/05/2015