Artigo: Dos regimes de bens, o regime misto e o registro
Felipe Leonardo Rodrigues,
tabelião substituto em S. Paulo
O pacto antenupcial é um contrato solene instituído pelos nubentes por meio de escritura pública, antes do casamento, para regular o regime patrimonial durante a sociedade conjugal (arts. 1.653 e 1640, pú, CC).
Tanto o Notário quanto o Oficial de Registro Civil devem orientar os nubentes sobre os diferentes regimes de bens, suas disposições, seus efeitos, advertindo-os sobre a incidência do regime legal se não for escolhido um regime diverso.
Devido à importância dos efeitos do pacto antenupcial para os futuros cônjuges e terceiros, a escritura pública é da substância do ato, conforme prescreve a lei civil. Desta forma, se os nubentes não celebrarem o pacto na forma prevista ou ocorrer à nulidade deste, prevalecerá o regime da comunhão parcial (art. 1. 640, CC).
Não se ignora que, nas rotinas processuais para a mudança de regime, os juízos têm ignorado a forma pública em atenção a simplificação de atos, já que a sentença autorizativa também seria uma espécie de instrumento público.
Por outro lado, a eficácia do pacto está sujeita à efetiva celebração do casamento e o seu registro no Oficial de Registro de Imóveis (arts. 1.653 e 1.657, CC).
Preceitua o CC que o pacto antenupcial será registrado, em livro especial, pelo Oficial do Registro de Imóveis do domicílio dos cônjuges, do contrário, não terá efeito perante terceiros (art. 1.657, CC). Referido livro especial é o Livro nº 3 – Registro Auxiliar (art. 178, inciso V, Lei 6.015/73). Se os cônjuges forem empresários deverá haver registro também na junta comercial.
Nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta: a) alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis; b) pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos; c) prestar fiança ou aval; d) fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação (art. 1.647, CC).
Vale lembrar que a Súmula 332 do STJ tem entendido pela anulação da fiança ou aval sem a vênia conjugal, implicando na ineficácia total da garantia.
Com exceção da separação absoluta de bens e da participação final dos aquestos quando haja cláusula expressa que afasta a vênia do outro cônjuge para alienação e gravação de ônus real sobre os bens particulares, todos os demais regimes necessitam de outorga conjugal para alienação ou oneração de bens de raiz.
Ressaltamos que, embora a lei seja silente sobre o assunto, o entendimento acima – com base nos reiterados julgados do STJ – se aplica as uniões estáveis. Assim, sugere-se que, nos negócios jurídicos, compareçam ambos os conviventes a fim de evitar discussões futuras. Se a parte for solteiro(a), deve declarar no ato que não convive em união estável.
Sobre a aparente contrariedade entre o inciso I do art. 1.647 e o art. 1.665 do CC, ambos os dispositivos devem ser interpretados harmonicamente, cuja administração e a disposição caberá ao cônjuge proprietário, mas para alienar e gravar de ônus real os bens imóveis é necessária a anuência do outro cônjuge.
O CC informa que são válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada, ainda que não haja anuência do outro cônjuge (art. 1.647 e pú, CC). Aqui o legislador fez nova ressalva quanto a desnecessidade de vênia do cônjuge quando um deles doar bens aos filhos que se casarem ou estabelecerem economia própria. E essa circunstância deve ser relatada de forma clara – pelo notário – na escritura.
Quando um dos cônjuges denegue a vênia conjugal sem motivo justo, ou lhe seja impossível concedê-la, o outro cônjuge pode pleitear ao juiz que supra a outorga (art. 1.648, CC), p. ex.: quando haja uma proposta vantajosa para o núcleo familiar, imprevistas doenças incapacitantes, rusga com parentes etc.
Se o cônjuge praticar algum ato sem a supressão da outorga pelo juiz, o ato é anulável, podendo o outro cônjuge pleitear a anulação, até dois anos depois de terminada a sociedade conjugal (art. 1.649, CC). No entanto, o ato pode ser convalidado por instrumento apartado, por escritura pública ou documento particular com assinatura reconhecida (art. 1.649, pú, CC).
A decretação de invalidade dos atos praticados sem outorga, sem consentimento, ou sem suprimento do juiz, só poderá ser demandada pelo cônjuge a quem cabia concedê-la, ou por seus herdeiros, em caso de falecimento deste (art. 1.650, CC).
O regime de bens visa disciplinar a vida econômica e familiar desde a realização do casamento até a sua dissolução (ou separação legal ou de fato, conforme tem admitido a jurisprudência), como um corolário do crescimento econômico da relação afetiva.
É sabido que a escolha do regime de bens decorre da vontade dos nubentes, ou da lei para certas pessoas. E também quando as partes não escolhem regime diverso, ou quando o pacto for nulo ou ineficaz.
O CC prevê um rol taxativo para os regimes de bens e se apresentam em quatro espécies:
a) regime de comunhão parcial (art. 1.658 ao art. 1.666, do CC);
b) regime de comunhão universal (art. 1.667 ao art. 1.671, do CC);
c) regime de participação final nos aquestos (art. 1.672 ao art. 1.686, do CC);
d) regime de separação de bens (arts. 1.687 e 1.688, do CC).
Para certas pessoas, a lei impõe o regime da separação de bens (art. 1.641). São elas: a) pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento; b) pessoa maior de 70 (setenta) anos; e, c) todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.
Nos casos das letras “a” e “c” a mutabilidade do regime de bens é factível, jamais para a letra “b”.
Assim, se um dos nubentes tiver 70 anos ou mais, deverão se casar pelo regime da separação obrigatória de bens – e de acordo com a súmula 377 do STF, a grosso modo, converte-se em “comunhão parcial de bens”. Esse entendimento aplica-se também as uniões estáveis, em decorrência da jurisprudência do STJ, repisa-se, apesar de a lei ser silente neste caso.
Se os companheiros fizerem prova de que a convivência iniciou-se antes dos 70 anos, poderão requerer ao juízo a escolha de regime diverso do impositivo.
Após a vigência do Código Civil de 2002, a doutrina tem debatido a subsistência da Súmula 377 do STF (inexigência de prova de esforço comum) no mundo jurídico. Uns entendem que a súmula está em pleno vigor; para outros, no entanto, entendem que a súmula não mais subiste.
Certo é que, a jurisprudência dos tribunais, inclusive do STJ, vem mantendo a incidência da Súmula 377 do STF sobre o regime da separação legal de bens.
Para nós, com a vigência do novo Código Civil, a referida súmula não mais incide sobre o regime da separação legal de bens, pois nos parece que o teor do art. 259 do Código Civil revogado não fora recepcionado pelo atual, desaparecendo a incidência de seu comando no novo regramento civil e por ipso facto as razões que motivaram a tal súmula.
Assim, para nós, para os casamentos celebrados na vigência do Código Civil de 2002 sob o regime da separação obrigatória de bens tal súmula não se aplica – tão somente nos casamentos realizados sob a égide do Código Civil revogado. Devemos fazer uma releitura deste tema!
No tocante aos regimes:
O regime de comunhão parcial está disciplinado nos arts. 1.658 a 1.666 do Código Civil. O CC dispõe que estão excluídos da comunhão (art. 1.659, CC) os seguintes bens: a) os bens que cada cônjuge possuir ao casar, e os que lhe sobrevierem, na constância do casamento, por doação ou sucessão, e os sub-rogados em seu lugar; b) os bens adquiridos com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges em sub-rogação dos bens particulares; c) as obrigações anteriores ao casamento; d) as obrigações provenientes de atos ilícitos, salvo reversão em proveito do casal; e) os bens de uso pessoal, os livros e instrumentos de profissão; f) os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge; g) as pensões, meios-soldos, montepios e outras rendas semelhantes.
São incomunicáveis os bens cuja aquisição tiver por título uma causa anterior ao casamento (art. 1.661, CC). Ou seja, bens que devido a alguma circunstância veio a integrar o patrimônio do casal após a celebração do casamento. A aquisição foi diferida por força de condição ou termo. Casos comuns são os compromissos de compra e venda assinados antes do casamento e a outorga da escritura definitiva se deu durante o casamento.
Importante que o Notário esteja atento e perquira sobre a forma de aquisição do bem, para que não gere discussões futuras sobre o ato notarial, bem como não haja enriquecimento sem causa por parte do outro cônjuge.
Outro ponto importante são as sub-rogações! Os bens particulares que cada cônjuge possuía antes do casamento podem ser substituídos por outro em seu lugar sem que haja confusão ou comunicação patrimonial. A sub-rogação serve para preservar a harmonia conjugal e a equação patrimonial originária.
E se o outro cônjuge contribuiu na aquisição do bem sub-rogado? Parece-me que o excesso à sub-rogação deverá ser partilhado (art. 884, CC).
Quando o bem for adquirido com valores exclusivamente pertencentes a um dos cônjuges tem o mesmo regramento.
O Notário e seus prepostos devem esclarecer – com as partes – se o produto da aquisição (ou parte dele) é advindo de recursos próprios ou em sub-rogação, isso se faz necessário porque as partes, geralmente, são leigas e não tem conhecimento técnico suficiente.
Esclarecida esta circunstância, o notário fará constar na escritura pública o assessoramento notarial prestado, evitando dissabores para as partes e eventuais correções (reti-rati) desnecessárias do ato notarial.
Por outro lado, enuncia o CC que se comunicam os seguintes bens: a) os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só em nome de um dos cônjuges; b) os bens adquiridos por fato eventual, com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior; c) os bens adquiridos por doação, herança ou legado, em favor de ambos os cônjuges; d) as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge; e) os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.
Aspecto não menos importante são as doações: se feitas ao cônjuge ou ao casal. Esta circunstância também deve ser esclarecida com o doador.
Às vezes o doador deseja contemplar apenas um dos cônjuges e se a redação notarial for mal redigida ou dúbia, o outro cônjuge poderá ser contemplado, não atendendo a vontade do doador, podendo gerar discussão sobre o ato.
Lembre-se: para a incidência da comunicação (art. 1.660, III), ela deve ser expressa!
No regime de comunhão parcial, presumem-se adquiridos na constância do casamento os bens móveis, quando não se provar que o foram em data anterior (art. 1.662, CC). Neste caso o pacto antenupcial poderá ser de grande valia para fixar a data e os bens móveis adquiridos por cada cônjuge.
As dívidas contraídas no exercício da administração obrigam os bens comuns e particulares do cônjuge que os administra, e os do outro na razão do proveito que houver auferido (art. 1.663, § 1º, CC).
A anuência de ambos os cônjuges é necessária para os atos, a título gratuito, que impliquem cessão do uso ou gozo dos bens comuns (art. 1.663, § 2º, CC).
Em caso de malversação (má gerencia ou dilapidação) dos bens, o juiz poderá atribuir a administração a apenas um dos cônjuges (art. 1.663, § 3º, CC).
Os bens da comunhão respondem pelas obrigações contraídas pelo marido ou pela mulher para atender aos encargos da família, às despesas de administração e às decorrentes de imposição legal (art. 1.664, CC). Ambos os cônjuges respondem com o patrimônio comum.
As dívidas, contraídas por qualquer dos cônjuges na administração de seus bens particulares e em benefício destes, não obrigam os bens comuns (art. 1.666, CC).
O regime de comunhão universal é disciplinado nos arts. 1.667 a 1.671 e importa a comunicação de todos os bens presentes e futuros dos cônjuges e suas dívidas passivas. Enquanto durar a sociedade conjugal, a propriedade e a posse dos bens são comuns.
Somente excluem-se da comunhão: a) os bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar; b) os bens gravados de fideicomisso e o direito do herdeiro fideicomissário, antes de realizada a condição suspensiva; c) as dívidas anteriores ao casamento, salvo se provierem de despesas com seus aprestos, ou reverterem em proveito comum; d) as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro com a cláusula de incomunicabilidade; e) Os bens referidos nos incisos V a VII do art. 1.659.
Queremos abordar um ponto rapidamente. A sub-rogação na universal de bens. Os bens advindos de doação ou de herança com cláusula de incomunicabilidade poderão ser objeto de sub-rogação, cujo bem não se comunicará com o outro cônjuge.
Vale lembrar que havendo cláusula de inalienabilidade, nas doações ou testamentos, importa em impenhorabilidade e incomunicabilidade (art. 1.911, CC e Súmula 49 do STF).
Aplicam-se também as doações antenupciais feitas por um dos cônjuges ao outro. Nestes casos o notário também deve ficar atento e esclarecer essa situação no ato notarial.
Regime de participação final nos aquestos (= nos bens adquiridos onerosamente na constância do casamento) está regulado nos arts. 1.672 a 1.686 do CC e prevê que cada cônjuge possuirá patrimônio próprio, conforme dispõe o art. 1.673 do CC e que caberá a época da dissolução da sociedade conjugal ao cônjuge direito à metade dos bens adquiridos pelos dois, a título oneroso, na constância do casamento, exceto os de herança e doações.
São bens próprios de cada cônjuge, aqueles anteriores ao casamento e os adquiridos na constância do casamento quando assim mencionados no título aquisitivo.
Os bens móveis podem livremente ser alienados pelo cônjuge titular sem a anuência do outro.
Quanto aos bens imóveis, serão de propriedade do cônjuge em cujo nome estiver inscrito no Registro Imobiliário, salvo prova em contrário (art. 1.681, CC). Desejando alienar ou gravar de ônus reais, deverá o cônjuge titular ter anuência do outro cônjuge.
Contudo, se no pacto antenupcial estiver convencionado a livre disposição dos bens imóveis, desde que particulares, não haverá necessidade de vênia conjugal (art. 1.656, CC).
No caso de bens adquiridos pelo trabalho conjunto, terá cada um dos cônjuges uma quota igual no condomínio ou no crédito por aquele modo estabelecido (art. 1.679, CC).
O direito à meação não é renunciável, cessível ou penhorável na vigência do regime matrimonial (art. 1.682, CC). Contudo, isso poderá acorrer se dissolvida a sociedade conjugal, apurado o acervo e feita a partilha.
Em eventual dissolução da sociedade conjugal, será apurado o montante dos aquestos (todos aqueles havidos onerosamente durante a constância do casamento, ainda que não mais integrem o patrimônio comum), excluindo-se da soma os patrimônios próprios (art. 1.674), ou seja, não se comunicam: a) os bens anteriores ao casamento e os que em seu lugar se sub-rogaram; b) os que sobrevieram a cada cônjuge por sucessão ou liberalidade; c) as dívidas relativas a esses bens. Os bens móveis presumem-se adquiridos durante o casamento, salvo prova em contrário.
Veja que se excluem do patrimônio comum os bens sub-rogados, o alerta notarial anterior serve para estes casos também.
No montante dos aquestos será computado o valor das doações feitas por um dos cônjuges, sem a necessária autorização do outro; nesse caso, o bem poderá ser reivindicado pelo cônjuge prejudicado ou por seus herdeiros, ou declarado no monte partilhável, por valor equivalente ao da época da dissolução (art. 1.675, CC).
Incorpora-se ao monte o valor dos bens alienados em detrimento da meação, se não houver preferência do cônjuge lesado, ou de seus herdeiros, de os reivindicar (art. 1.676, CC).
Se um dos cônjuges solveu uma dívida do outro com bens do seu patrimônio, o valor do pagamento deve ser atualizado e imputado, na data da dissolução, à meação do outro cônjuge (art. 1.678, CC).
Na dissolução do regime de bens por separação judicial ou por divórcio, o montante dos aquestos será verificado na data em que cessou a convivência (art. 1.683, CC). O legislador exige um marco temporal, no caso de falecimento, a data do óbito, no caso de dissolução, a data da separação (legal ou de fato).
A lei sempre quer evitar o condomínio dos bens nas dissoluções e se não for possível nem conveniente a divisão de todos os bens, será calculado o valor de alguns ou de todos para reposição em dinheiro ao cônjuge não-proprietário. Não se podendo realizar a reposição em dinheiro, serão avaliados e mediante autorização judicial, alienados tantos bens quantos bastarem (art. 1.684 e pú, CC).
Na dissolução da sociedade conjugal por morte, será verificada a meação do cônjuge sobrevivente de conformidade com os artigos antecedentes, deferindo-se a herança aos herdeiros na forma estabelecida no Código Civil (art. 1.685, CC).
O regime de separação de bens é regulado nos arts. 1.687 e 1.688 CC. Nele, os bens de cada cônjuge permanecerão sob a administração exclusiva de cada cônjuge, podendo ser livremente alienados ou gravados de ônus real.
O pacto antenupcial por cláusula expressa deve deixar claro que a separação é absoluta, não se comunicando os bens e dívidas adquiridos anterior ou posteriormente a realização do casamento.
E se um ou mais bens forem adquiridos em conjunto na constância da relação familiar? Simples, aplica-se a divisão conjunta ou nas respectivas proporções de aquisição.
Pelo art. 1.568 os cônjuges são obrigados a concorrer, na proporção de seus bens e dos rendimentos do trabalho para o sustento da família e educação dos filhos, qualquer que seja o regime patrimonial. Na separação de bens os nubentes podem estipular de forma diversa, onde cada um pode contribuir em percentual diferente para as despesas da família ou especificar as contribuições e despesas de cada um, por exemplo.
De volta ao pacto antenupcial. Será puro quando eleger um regime de bens tipificado no Código Civil. Será misto (híbrido, ou combinado) quando misturar caracteres próprios dos regimes existentes. Não se trata de um quinto regime de bens!
O art. 1.639 do Código Civil enuncia que é lícito aos nubentes antes de celebrado o casamento estipular quanto aos bens o regime que lhes aprouver. Este artigo diz respeito não só aos conhecidos regimes tipificados e disciplinados no Código Civil, mas inclusive o novo, o de participação final nos aquestos. Este de pouca eleição entre os nubentes!
Assim, os nubentes podem livremente estipular, celebrar o que desejarem: tendo plena liberdade de escolha.
Os nubentes podem adotar um daqueles regimes, já mencionados, inclusive estabelecer previamente a transição de um para outro em determinado período ou condição, ou ainda criar um regime com a combinação de disposições de outro regime, desde que não contrarie a ordem pública ou fraude lei imperativa. A lei é implacável! É nula a convenção ou cláusula que contravenha disposição absoluta de lei (art. 1.655, CC).
Para nós, desde 2004 tínhamos como plenamente válido e possível o regime misto:
Primeiro porque o regime de bens é o conjunto de princípios e normas referentes ao patrimônio dos futuros cônjuges, que regulam os interesses econômicos oriundo do casamento, podendo ser chamado “estatuto patrimonial” da sociedade (v. Maria Helena Diniz, Curso de D. Civil – 16ª ed., v. págs. 135 e 136).
Desta forma, em regra geral, vigora o princípio da autonomia da vontade ou liberdade, quanto à escolha pelos nubentes de um regime de bens tipificado, híbrido ou ainda, de regras especiais, e se necessário combinando-os.
Poderíamos ainda obter a faculdade prevista dos contratos atípicos, conforme faculta o art. 425 do CC que diz: é lícito às partes estipular contratos atípicos, observado as normas gerais (resguardados a ordem pública, os costumes e os princípios gerais de direito) fixadas no Código Civil.
O espírito deste artigo é ressaltar a autonomia e a liberdade contratual, dinamizando os atos, negócios e contratos, inclusive adequando-os as constantes evoluções da sociedade.
Segundo porque o parágrafo segundo do art. 1.639 do Código Civil dispõe que a mudança do regime de bens, após o casamento somente será obtida mediante autorização judicial, por meio de pedido motivado dos cônjuges. Deferido o pedido e ressalvados os direitos de terceiros, a alteração deverá ser feita no assento de casamento respectivo.
Assim, com fulcro nos artigos 1.639, 425 e 104 do Código Civil:
1.639 – (É lícito aos nubentes, antes de celebrado o casamento, estipular, quanto aos seus bens, o que lhes aprouver); parágrafo primeiro – (O regime de bens entre os cônjuges começa a vigorar desde a data de casamento); parágrafo segundo [parte final] – (ressalvados os direitos de terceiros). Grifo meu.
425 – (É lícito às partes estipular contratos atípicos (alusivos às contratações que não tem regramento tipificado na lei civil), observado as normas gerais fixadas neste Código). Grifo meu.
104 – (A validade do negócio jurídico requer: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei). Grifo meu.
Vemos juridicamente possível os nubentes – além da adoção de um daqueles regimes, já mencionados, – estabelecerem previamente a transição de um para outro regime em determinado período ou condição, ou ainda criar um regime com a combinação de disposições de outro, desde que não contrarie a ordem pública ou fraude lei imperativa.
Há debate sobre a possibilidade de regramento de temas não patrimoniais, entendo que, não havendo violação a direitos e garantias constitucionais, é possível a estipulações de outros temas despatrimonializados.
A título de exemplo, as partes podem estabelecer:
a) a aplicação das regras do regime da separação de bens para os bens adquiridos no período de cinco anos a partir do casamento e a aplicação das regras do regime da comunhão parcial de bens para o patrimônio adquirido a partir do sexto ano de casamento;
b) que determinado bem particular se comunicará com a celebração do matrimônio;
c) multa pecuniária em decorrência de infração aos deveres conjugais, comprovada extra ou judicialmente;
d) que determinado bem se comunicará passados cinco anos da celebração do casamento;
e) percentuais sobre as contribuições de cada cônjuge ou definir os responsáveis por certas despesas;
f) deveres domésticos;
g) escola dos filhos etc.
Em tese, a mudança do regime convencionado no pacto antenupcial seria automática se previsto anteriormente ao casamento e, se após, demandaria autorização judicial com pedido motivo e ressalvado os direitos de terceiros.
Como dito acima, atendidos os requisitos do art. 1.639, § 2º, CC, é possível a modificação do regime de bens. Esta faculdade está disponível para os casos do art. 1.641, I e III, CC. A ação deve der proposta perante a vara de família (jurisdição voluntária), desde que haja consenso.
Vale ressaltar que a referida alteração opera-se também para os regimes decorrentes dos casamentos celebrados na égide do Código Civil de 1916, mediante pedido judicial.
Em relação à apuração dos bens e a respectiva partilha, os cônjuges têm duas opções:
a) apurar os bens comuns e realizar a partilha, evitando confusão patrimonial futura;
b) não apurar os bens comuns nem realizar a partilha, ficando os bens em condomínio;
Quanto à incidência tributária:
Na opção “a”, se houver igualdade de valores, ou seja, a partilha for igualitária, nada será devido ao ente municipal ou estadual (a título oneroso ou gratuito).
Se houver desigualdade de valores, haverá incidência de tributo (Súmula 116 do STF).
Na opção “b” não há incidência tributária.
Segue abaixo quadro sinótico com a simulação da alteração dos regimes de bens, seus efeitos no registro de imóveis e a incidência ou não de tributo:
Clique no link para ver o quadro: https://goo.gl/s90y1t
Escrito originalmente em 2004, atualizado em maio de 2015