1ª VRP|SP: Dúvida – Escritura que noticia cessão de direitos de compromissário comprador que tinha bens declarados indisponíveis – Impossibilidade de registro – Ainda que o compromissário não seja parte diretamente envolvida no negócio jurídico de compra e venda, a indisponibilidade de bens impede que haja transferência de seus direitos sobre bem imóvel – Dúvida procedente.

Processo 1121211-55.2015.8.26.0100

Dúvida

Registro de Imóveis

K. C. L.

Dúvida – escritura que noticia cessão de direitos de compromissário comprador que tinha bens declarados indisponíveis – impossibilidade de registro – ainda que o compromissário não seja parte diretamente envolvida no negócio jurídico de compra e venda, a indisponibilidade de bens impede que haja transferência de seus direitos sobre bem imóvel – dúvida procedente.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de K. C. L., após negativa de ingresso de escritura de compra e venda cujo objeto é um apartamento e vaga de garagem do edifício de matrícula nº 163.585.

O título foi desqualificado por nele constar que G. T. era titular de direitos de compromissário comprador do imóvel, e que os transfere à suscitada. O Registrador constatou que Giuseppe encontra-se com seus bens indisponíveis, o que impede a eficácia do negócio jurídico celebrado.

Foram juntados documentos às fls. 06/62.

A suscitada juntou impugnação às fls. 63/67, acompanhada dos documentos de fls. 68/74.

Alega que não consta na matrícula do imóvel a propriedade de G. T., e que este só foi citado na escritura para fins de esclarecimento, mas que a cessão dos direitos ocorreu em outra ocasião, de modo que a indisponibilidade não atinge o título apresentado.

Alega que o imóvel é utilizado para residência familiar, e que sua regularização é essencial para o bem estar de seu filho.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls. 82/84), além de requerer que seja dada notícia às varas que declararam a indisponibilidade de bens de que houve tentativa de alienação.

É o relatório. Decido.

Em que pese o fato de que não consta no registro de imóveis qualquer título que vincule o bem objeto da escritura a G. T., e a narrativa de que o imóvel é destinado a moradia de menor, a segurança jurídica e a ordem judicial que declarou a indisponibilidade de bens levam à conclusão de que, de fato, o registro da escritura não pode ser realizado.

Cito, inicialmente, o decidido na apelação cível 0043598-78.2012.8.26.0100. j. 26/09/13:

“REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida inversa julgada improcedente – Escritura de Venda e Compra e Cessão – Questionamento parcial das exigências formuladas pelo Registrador – Circunstância que torna prejudicado o julgamento da dúvida – Pertinência do óbice apresentado – Impossibilidade de ingresso do título em razão de indisponibilidade determinada por Juiz Federal – Recurso não conhecido.”

No citado precedente, a situação é semelhante: a propriedade ainda estava em nome da incorporadora, e havia compromisso de compra e venda não levado a registro. O compromissário cedeu seus direitos, mas o título não foi recebido pois havia indisponibilidade de bens em seu nome.

No presente caso, diz o título que “a presente escritura é lavrada em cumprimento total ao Instrumento Particular de Compromisso de Venda e Compra, datado de 27 de junho de 2001, não registrado, (..) no qual a vendedora se comprometeu a vender [o imóvel] para G. T.”. Mais a frente, se lê que “G. T. (…), em 05 de janeiro de 2015 (…)cedeu e transferiu todos os direitos e obrigações que detinha sobre [o imóvel]”. Ou seja, durante esse lapso temporal, Giuseppe foi titular de direitos sobre o bem, que não podem ser transferidos devido à indisponibilidade decretada.

Mesmo que a proprietária tabular ainda seja a incorporadora, esta reconhece na escritura que Giuseppe tinha direitos sobre o bem, não podendo o Oficial omitir-se com relação a este fato.

Ressalto que a realização do ato implicaria na transferência de direito declarado indisponível, já que o direito de compromissário comprador é abrangido pela expressão “bens” utilizada na ordem de indisponibilidade.

Não cabe a esta Corregedoria Permanente determinar que a indisponibilidade não atinge o imóvel em tela. Isto deve ser arguido perante o Juízo que decretou a limitação, para que se pondere sobre a legalidade da cessão de direitos de Giuseppe perante a ordem emitida.

Por fim, a tentativa de cessão de direitos após a decretação da indisponibilidade deve ser noticiada à autoridade competente. Assim, expeça-se ofício a 1ª Vara Cível de Jacareí, à 1ª Vara de Execuções Fiscais do TRF Terceira Região, além da 1ª Vara do Trabalho de Jacareí, com cópia da escritura de fls. 08/13.

Do exposto, julgo procedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 15º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de K. C. L., mantendo o óbice enquanto perdurar a indisponibilidade de bens. Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento.

Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 20 de janeiro de 2016

Tania Mara Ahualli

Juíza de Direito

(DJe de 01.02.2016 – SP)