1ª VRP|SP: Pedido de providências – Averbação de restabelecimento de cláusulas restritivas – Ocorrência de fraude à execução – Ineficácia das transmissões feitas pelo executado – Distrato social da empresa proprietária – Transferência formalizada por instrumento público – Cláusulas que não poderão incidir nos imóveis antes gravados em decorrência de anterior doação – Pedido improcedente.

Processo 1115386-33.2015.8.26.0100

Pedido de Providências

Registro de Imóveis

7º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo

C. D. M. e outros

Pedido de providências – averbação de restabelecimento de cláusulas restritivas – ocorrência de fraude à execução – ineficácia das transmissões feitas pelo executado – distrato social da empresa proprietária – transferência formalizada por instrumento público – cláusulas que não poderão incidir nos imóveis antes gravados em decorrência de anterior doação – pedido improcedente.

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado pelo Oficial do 7º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de C. D. M., F. S. D., S. B. e M. V. J. D., pleiteando a averbação do restabelecimento de cláusulas restritivas em relação aos imóveis matriculados sob nºs 13.424 e 15.404.

Relata o Registrador que, por força do R.03 da matrícula nº 13.424 e R.05 da matrícula nº 15.404, M. V. J. D. e J. J. D. doaram a F. S. S. e C. D. M., com reserva de usufruto e imposição das cláusulas restritivas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, os imóveis acima mencionados.

Posteriormente, os donatários transmitiram a nua propriedade do imóvel matriculado sob nº 13.424 e a plena propriedade do imóvel matriculado sob nº 15.404 a título de conferencia de bens para integralização do capital social à empresa E. A. e C. LTDA.

Informa que, em razão das transmissões, as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade foram devidamente canceladas, tendo em vista que tais vínculos, ainda que vitalícios, não podem ir além da figura dos donatários.

Esclarece que foram expedidas pelos MMºs Juízos da 3ª Vara do Trabalho da Capital (processo nº 2.669/08) e 17ª Vara do Trabalho da Capital (Ação de Execução Trabalhista nº 01590200801702004), certidões de declarações de ineficácia das transmissões feitas pelo executado F. S. D. à empresa E. A. e C. LTDA, ou seja, a metade ideal da nua propriedade do imóvel matriculado sob nº 13.424 e da plena propriedade o imóvel matriculado sob nº 15.404, em decorrência de fraude às execuções (Av.09/13424 e Av.11/15404).

Salienta a impossibilidade da averbação do restabelecimento pleiteado, uma vez que a fraude à execução torna ineficaz o negócio jurídico entre as partes contratantes e o credor da execução, todavia permanece válido em relação à terceiros.

Aduz que havendo o cancelamento das averbações de declaração de ineficácia, com o consequente adimplemento das dívidas resultantes das penhoras, os registros anteriores voltarão a produzir os seus efeitos, especificamente em relação á cadeia sucessória de transmissão, hipótese em que o donatário alienantes não mais figurará como titular de domínio do imóvel.

Por fim, assevera que havendo a extinção da sociedade, com o retorno do patrimônio aos antigos sócios, as cláusulas restritivas não voltam automaticamente a gravar os bens, sendo que tais atos decorrem de atos graciosos ou de mera liberalidade, e o distrato social impõe que a transmissão do seu patrimônio aos ex sócios seja formalizada por instrumento público, nos termos do artigo 108 do Código Civil.

Os interessados sustentam a possibilidade do restabelecimento das cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade, sob o ótica de que se o principal registro for nulo a averbação acessória também será (fls. 29/31).

O Ministério Público opinou pela improcedência do pedido (fls.37/38).

É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.

Com razão o Registrador e o Douto Promotor de Justiça. Primeiramente há que se distinguir os efeitos da nulidade e da ineficácia dos negócios jurídicos. A nulidade é vício intrínseco ao negócio jurídico, que o torna defeituoso, gerando efeitos em face de terceiros, enquanto que a ineficácia ocorre quando fatores externos ao ato praticado impedem a produção de efeitos que atinjam terceiros, embora o ato jurídico seja perfeito, ou seja, o negócio praticado diz respeito apenas às partes.

Na presente hipótese verifica-se a ocorrência de fraude à execução em relação aos dois imóveis dados pelo donatário, ora executado F. S. S., em integralização ao capital social da empresa E. A. e C. LTDA. Como bem ponderado pelo Registrador, a decretação de fraude à execução e a consequente declaração de ineficácia da alienação dizem respeito somente ao credor da execução.

O negócio jurídico, consistente na transmissão a título de conferência de bens para integralização do capital, é considerado ineficaz somente em relação à partes nele envolvidas. Cancelada a averbação de declaração de ineficácia (Av.09/13424 e Av.11/15404), os registros anteriores (R.06/13424 e R.09/15.404) voltam a produzir seus efeitos jurídicos.

Assim, verifica-se que sendo válido o negócio perante terceiros, o alienante deixa de ser o titular do imóvel, não havendo a possibilidade de restabelecer as cláusulas de impenhorabilidade e incomunicabilidade provenientes da doação efetivada.

No mais, como é sabido a efetivação da dissolução da pessoa jurídica implica em sua extinção e consequentemente em transferência e divisão do patrimônio entre os sócios, que não precisam ser necessariamente os donatários.

Ora, o simples ato de dissolução da empresa não acarreta automática transferência de domínio, sendo imprescindível que o ato traslativo se efetive por escritura pública, nos termos do artigo 108 do Código Civil, que dispõe:

“Não dispondo a lei em contrário, aescritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicosque visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reaissobre imóveisde valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País”.

Cumpre salientar que, em observância à forma prescrita em lei, o supradito negócio envolvendo direitos reais deve ser feito por escritura pública específica, sendo esta pressuposto de validade.

Logo, diante da não invalidação do negócio jurídico entabulado, mas apenas a declaração de sua ineficácia, não há que se cogitar em restabelecimento das cláusulas que anteriormente incidiam sobre os imóveis em questão.

Diante do exposto, julgo improcedente o pedido de providências formulado pelo Oficial do 7º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de C. D. M., F. S. D., S. B. e M. V. J. D..

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Oportunamente, remetam-se os autos aos arquivos, com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

São Paulo, 17 de fevereiro de 2016.

Tania Mara Ahualli

Juíza de Direito

(DJe de 22.02.2016 – SP)