1ª VRP|SP: Dúvida – Instrumento de quitação de alienação fiduciária – Recusa de registro sob o fundamento de que não há prova da entrega do valor excedente apurado às devedoras fiduciantes, nos termos do § 4º do art. 27 da Lei 9.514/97 – Exigência indevida – Dúvida improcedente.

Processo 1078792-83.2016.8.26.0100

Dúvida

Registros Públicos

L. M.

Dúvida – instrumento de quitação de alienação fiduciária – recusa de registro sob o fundamento de que não há prova da entrega do valor excedente apurado às devedoras fiduciantes, nos termos do §4º do art. 27 da Lei 9.514/97 – exigência indevida – Dúvida improcedente.

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de L. M., diante da negativa de registro de três títulos: Instrumento particular de quitação entabulado pela Agin Vergueiro Empreendimento Imobiliário SPE LTDA, através do qual se declarada quitada a dívida do contrato de financiamento com alienação fiduciária em virtude da consolidação da propriedade em nome da empresa, referente ao imóvel matriculado sob nº 197.423; Escritura de venda e compra referente à aquisição pelo requerente do mencionado imóvel; Instrumento particular firmado pelo Banco ABN AMRO Real AS, autorizando o cancelamento de hipoteca referente às das averbações 1 e 4, na matrícula número 197.423.

Os entraves consistem no fato do valor constante na escritura pública do imóvel arrematado ser muito superior àquele consolidado (av. 6/197.432), ou seja, R$ 845.000,00 (oitocentos e quarenta e cinco mil reais) na arrematação, em oposição aos R$ 276.753,29 (duzentos e setenta e seis mil setecentos e cinquenta e três reais e vinte e nove centavos) da consolidação.

Aduz ser necessária a prestação de contas ao devedor fiduciante da diferença, com a comprovação de quitação por ambas as partes. Juntou documentos às fls. 7/120.

O interessado, em sua impugnação (fls.121/134), argumenta que as exigências referem-se à obrigação de natureza pessoal e que a diferença obtida entre a consolidação da propriedade e o leilão foi depositada judicialmente em favor do devedor fiduciante.

Sustenta, ainda, que o entendimento adotado pelo Registrador é contrário à jurisprudência do E. Conselho Superior da Magistratura, não sendo cabível o impedimento aduzido.

O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida (fls.137/140).

É o relatório. Decido.

Em decisão, nos autos do processo número 1010103-21.2015.8.26.0100, envolvendo a mesma matéria posta a desate, houve o entendimento de se obstar o registro em caso de não apresentação da comprovação de quitação, conforme segue:

“Na alienação fiduciária em garantia o imóvel financiado permanece na propriedade do agente fiduciário, até que se verifiquem adimplidas as obrigações do fiduciante. Ao devedor é conferida a posse indireta sobre a coisa dada em garantia. Na hipótese dos autos, a credora (Caixa Econômica Federal) deve satisfazer seu crédito (dívida e despesas), entregando, no prazo de cinco dias do leilão, ao devedor fiduciante a quantia que eventualmente sobejar, existindo desta forma, a mútua quitação da obrigação principal da qual a garantia real é acessória. Todavia, a comprovação desta formalidade não ocorreu. Não basta que a CEF deixe à disposição do ex-devedor fiduciante o saldo excedente de R$ 75.001,68, sendo imprescindível a efetiva entrega deste valor. Nem mesmo existe a certeza de que Denise e Paula foram notificadas a respeito do montante que estaria à disposição para levantamento, ou de que houve concordância ou impugnação da quantia ofertada, configurando inobservância aos preceitos legais.”

“Cumpre consignar que incumbe ao Registrador, ao examinar o instrumento de quitação do financiamento, bem como a carta de arrematação, verificar se foram observados os requisitos formais do contrato, também no tocante às condições nele estabelecidas (o valor, a data de quitação do imóvel, bem como a qualificação completa do arrematante, incluindo o nome e qualificação de sua esposa), a fim de fazer constar corretamente na matrícula do bem, visando com isso a segurança jurídica perante terceiros.”

Todavia, conforme atual decisão do Egrégio Conselho Superior da Magistratura, houve mudança de orientação dada à questão, no tocante à não comprovação da quitação da dívida. Em síntese diz o parecer:

“[…] não é atribuição do registrador de imóveis, ao qualificar a escritura de compra e venda apresentada, verificar o cumprimento do referido dispositivo legal, e, ainda que assim não fosse, está demonstrado que a Caixa Econômica Federal deu a quitação da dívida e prestou contas em relação ao valor excedente apurado, e não o disponibilizou às devedoras de imediato em cumprimento ao mandado de penhora expedido na ação monitória na qual uma delas figurou como ré executada, depositando-o em juízo. Posteriormente, em razão da desconstituição da penhora, a guia de levantamento do valor depositado a título de penhora foi expedida em favor da devedora fiduciante (credora), que era executada na ação monitória. Não há dúvida, em suma, de que o valor excedente foi entregue para uma das devedoras (credoras), que tem o dever de entregar à outra credora a parte que lhe cabe, e, no mais, eventual inobservância do dever de repasse da quantia recebida por uma das credoras à outra, ou mesmo discordância do valor excedente apurado, deve ser objeto de ação própria e adequada. Isto posto, dou provimento ao recurso para julgar improcedente a dúvida e determinar o registro da escritura de compra e venda.”

Desta feita, não é razoável manter um entendimento que seja diverso do adotado pelo E. Conselho Superior da Magistratura. Feito o exposto julgo improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial do 14º Registro Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de L. M., e consequentemente determino o registro dos títulos.

Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios decorrentes deste procedimento. Oportunamente, arquivem-se os autos.

P.R.I.C.

São Paulo, 06 de setembro de 2016

Tania Mara Ahualli

Juíza de Direito

(DJe de 12.09.2016 – SP)