TJ|SP: Usucapião constitucional urbana. Autor não comprovou sua moradia ou de sua família no local. Inicial que inclusive apresenta endereço de residência e domicílio do polo ativo em lugar diverso. Pretensão de se valer de accessio possessionis para completar o prazo da prescrição aquisitiva. Inviabilidade. Requisitos da usucapião especial urbana não cumpridos quando do ajuizamento. Sentença mantida. Recurso desprovido.

Registro: 2017.0000148598

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0001769-18.2000.8.26.0366, da Comarca de Mongaguá, em que são apelantes ANTONIO SOARES DOS SANTOS (JUSTIÇA GRATUITA) e MARIA DA CONCEIÇÃO ALVES SOARES (JUSTIÇA GRATUITA), é apelado O JUÍZO.

ACORDAM, em 20ª Câmara Extraordinária de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SALLES ROSSI (Presidente sem voto), LUIS MARIO GALBETTI E MARCIA DALLA DÉA BARONE.

São Paulo, 9 de março de 2017.

Moreira Viegas

RELATOR

Assinatura Eletrônica

Apelação nº: 0001769-18.2000.8.26.0366

Comarca: Mongaguá

Apelantes: ANTONIO SOARES DOS SANTOS E OUTRA

Apelados: SEBASTIÃO NUNES DE OLIVEIRA E OUTROS

Usucapião constitucional urbana. Autor não comprovou sua moradia ou de sua família no local. Inicial que inclusive apresenta endereço de residência e domicílio do polo ativo em lugar diverso. Pretensão de se valer de accessio possessionis para completar o prazo da prescrição aquisitiva. Inviabilidade. Requisitos da usucapião especial urbana não cumpridos quando do ajuizamento. Sentença mantida. Recurso desprovido.

VOTO Nº 17.782

Ação de usucapião especial urbana julgada extinta, sem julgamento de mérito, na forma do artigo 267, VI do antigo Código de Processo Civil (fls. 491/494).

Apelam os autores buscando a cassação da sentença. Sustentam, em apertada síntese, a presença de todas as condições da ação. Certo que, o Código Civil prevê a possibilidade de somar o tempo de posse em todas as modalidades de usucapião (fls. 498/507).

Recurso processado, sem resposta (fls. 515).

É o relatório.

A usucapião especial urbana, prevista na Constituição Federal (art. 183), Estatuto da Cidade (art. 9º) e Código Civil (art. 1.239), como é sabido, pressupõe a efetiva e pessoal utilização do imóvel para moradia do usucapiente ou de sua família.

No caso dos autos, nada, absolutamente nada, indica tenham os ora apelantes cumprido, integralmente, os requisitos para a usucapião constitucional urbana. Ao contrário, tudo aponta em sentido contrário.

Veja-se que, logo, ao propor a ação, declinaram como endereço e domicílio lugar diverso, o que, por si só, já demonstra inobservância do indispensável. Fato e circunstância que ganha relevo por respaldado pelas testemunhas ouvidas na audiência de justificação de posse (fls.36 e 37).

Esse, no entanto, não é o único entrave. No caso, para compor o lapso temporal da prescrição aquisitiva pretendem os autores seja considerada a acessio possessionis, assim somando-se com o tempo de posse do antecessor, o que não é possível.

O tempo de posse para a aquisição do imóvel pela usucapião especial urbana individual não pode ser somado à posse exercida anteriormente, excetuado apenas o caso do herdeiro (art. 9º, § 3º do Estatuto da Cidade), o que se vem decidindo mesmo depois da vigência do Código Civil de 2002. Neste sentido: TJSP, Ap. Civ. 010871-37.2010.8.26.0100, j. 05/05/2011; Ap. Civ. 0893693-36.1999.8.26.0100, j. 2/12/2010.

Conforme já se assentou, “as usucapiões especiais urbana e rural, todavia, exigem posse pessoal do usucapiente. O art. 1.239 exige que o possuidor tome a gleba produtiva com o seu trabalho, ou de sua família, tendo nela sua moradia. O art. 1.240 exige posse sobre área urbana, “utilizando-a para sua moradia ou de sua família”. Vê-se, portanto, que ambas as modalidades, por sua própria natureza social, exigem atividade pessoal do possuidor, que não pode aproveitar o tempo de moradia alheia, nem o trabalho de outrem para tornar a gleba produtiva. A pessoalidade da posse mostra-se incompatível com a accessio possessionis, como já reconheciam nossos tribunais antes do advento do Código Civil de 2002 (RJTJESP 189/176, Rel. Des. J. Roberto Bedran; RTTJESP 146/202, rel. Des. Silvério Ribeiro)” (Ap. civ. 0114400-86.2007.8.26.0000, j. 25/10/2007).

Ainda a esse respeito a doutrina de Benedito Silvério Ribeiro: “porém, no que toca à usucapião urbana, que exige do possuidor a utilização da área para a sua moradia ou de sua família, afigura-se evidente que não pode ser contado o tempo do antecessor, o que representaria uma diminuição do prazo prescricional para o sucessor a título singular (‘acessio possessionis‘)” (Tratado de Usucapião, v. 2, 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 951 ).

Por fim, assentada a questão pelo Enunciado 317 da IV Jornada de Direito Civil, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ), no Superior Tribunal de Justiça: “a accessio possessionis, de que trata o art. 1.243, primeira parte, do Código Civil, não encontra aplicabilidade relativamente aos arts. 1.239 e 1.240 do mesmo diploma legal, em face da normatividade do usucapião constitucional urbano e rural, arts. 183 e 191, respectivamente”.

E nem se olvide não beneficiar os autores prazo contável depois do ajuizamento eis que, conforme a lição de Benedito Silvério Ribeiro, “o tempo precisa estar completado quando promovida a ação declaratória de usucapião, sob pena de extinção do processo, por ausência de uma de suas condições” (Tratado de Usucapião, v. 1, p. 720).

Logo, nada há que se alterar na bem lançada sentença de improcedência do MM. Juiz de Direito da Comarca.

Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao apelo.

JOÃO FRANCISCO MOREIRA VIEGAS

Relator