Artigo: Regularização de Imóveis no Litoral, por Regina Pedroso
Não há como não falar de imóvel no litoral sem tratar da enfiteuse, aforamento ou emprazamento, que seria uma espécie de direito real sobre imóvel alheio, onde o proprietário (senhorio) transfere ao adquirente (enfiteuta), em caráter perpétuo, o domínio útil, a posse direta, o uso, o gozo e o direito de disposição sobre bem imóvel, mediante pagamento de renda anual (foro) .
Existem duas modalidades: enfiteuse civil regulada pelo Código Civil, vide Arts. 678 a 694 do CC/16 e Art. 2.038 do CC/atual ; e enfiteuse administrativa ou especial, constituída sobre os imóveis dominiais da União, vide Decreto-Lei 9.760/46 ( Dispõe sobre os bens imóveis da União) e 9.636/98 (Dispõe sobre a regularização, administração, aforamento e alienação de bens imóveis de domínio da União).
Ainda sobre o tema é importante conhecer a Lei 5.972/73 (Regula o procedimento para o Registro da propriedade de bens imóveis discriminados administrativamente ou possuídos pela União); Decreto 2.398/87 ( Disciplina os valores devidos a título de foro e laudêmio, assim como as certidões exigíveis para a negociação de imóveis da União aforados, e as informações a serem prestadas pelos Cartórios de Notas, Registro de Imóveis e de Títulos e Documentos relativas a essas transações, por meio da Declaração de Operação Imobiliária em Terrenos da União -DOITU ); o Art. 49, § 3o, do ADCT, da CF/1988 (Impõe o regime de enfiteuse aos terrenos de marinha e seus acrescidos, situados na faixa de segurança) e por fim, a atual Medida Provisória 759/2016, que promete acelerar os procedimentos de alienação de imóveis da União.
A que nos interessa no momento é a enfiteuse especial ligada aos bens da União, que incluem os terrenos de marinha e acrescidos, nos termos da Lei 9.760/46, art.1º e sgts:
Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:
a) os terrenos de marinha e seus acréscidos ;
Art. 2º São terrenos de marinha, em uma profundidade de 33 (trinta e três) metros, medidos horizontalmente, para a parte da terra, da posição da linha do preamar-médio de 1831:
a) os situados no continente, na costa marítima e nas margens dos rios e lagoas, até onde se faça sentir ainfluência das marés;
b) os que contornam as ilhas situadas em zona onde se faça sentir a influência das marés.
Parágrafo único. Para os efeitos dêste artigo a influência das marés é caracterizada pela oscilação periódica de 5 (cinco) centímetros pelo menos, do nível das águas, que ocorra em qualquer época do ano.
Art. 3º São terrenos acrescidos de marinha os que se tiverem formado, natural ou artificialmente, para o lado do mar ou dos rios e lagoas, em seguimento aos terrenos de marinha.
Definidos alguns conceitos e sua natureza jurídica de direito real (alienável e transferível) é necessário saber quais são as obrigações relativas a estes imóveis para que se considerem regulares.
A competência da gestão dos imóveis da União cabe a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), Orgão do Ministério do Planejamento, que inclusive trata da demarcação dos terrenos de marinha, nos termos dos artigos do Decreto-Lei 9.760/46.
Neste procedimento a SPU deverá demarcar a linha preamar e ao final os terrenos de marinha demarcados deverão ser registrados no Registro de Imóveis (art. 2o, Parágrafo único, da Lei 9.636/1998) com posterior abertura de matricula nos termos do art. 176 da Lei 6.015/76 (Lei de Registros Públicos).
Art. 2o Concluído, na forma da legislação vigente, o processo de identificação e demarcação das terras de domínio da União, a SPU lavrará, em livro próprio, com força de escritura pública, o termo competente, incorporando a área ao patrimônio da União.
Parágrafo único. O termo a que se refere este artigo, mediante certidão de inteiro teor, acompanhado de plantas e outros documentos técnicos que permitam a correta caracterização do imóvel, será registrado no Cartório de Registro de Imóveis competente.
Consolidado o registro e abertura da matricula do imóvel da União demarcado, ele poderá ser objeto de aforamento no todo ou parcial, através do desmembramento da area aforada e consequente abertura de nova matricula para os lotes que deverão receber o registro dos contratos de aforamento para aquisição do dominio útil.
A SPU deve informar na certidão de desmembramento o RIP – Registro Imobiliário Patrimonial da area destacada e que também servirá para calculo e arrecadação de foro e laudêmio.
A aquisição do dominio útil através do contrato de aforamento gera também a obrigação de comunicar a Prefeitura do Municipio onde está localizado o imóvel, para consequente arrecadamento de ITBI e IPTU.
Necessário portanto saber se consta da matricula do imóvel a existência de contrato de aforamento (Art. 14 Lei 9.636/98) entre a SPU e o particular, e eventual construção (benfeitoria) realizada no terreno devidamente averbada.
No que diz respeito a transferencia do aforamento em terreno de marinha, só poderá ser feito por contrato de compra e venda, permuta, doaçao ou dação em pagamento, mediante escritura pública e certidão autorizativa de transferência (CAT) emitida pela SPU.
No que diz respeito ao foro, laudêmio (recolhido nas transfências onerosas inter vivos), taxa de ocupação e outros assuntos ligados ao tema é necessário conhecer o Decreto 2.398/87, onde, entre outros assuntos:
Art. 3º A transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil e da inscrição de ocupação de terreno da União ou de cessão de direito a eles relativos dependerá do prévio recolhimento do laudêmio pelo vendedor, em quantia correspondente a cinco por cento do valor atualizado do domínio pleno do terreno, excluídas as benfeitorias. (Redação dada pela Medida Provisória nº 759, de 2016)
1° As transferências parciais de aforamento ficarão sujeitas a novo foro para a parte desmembrada.
2o Os Cartórios de Notas e Registro de Imóveis, sob pena de responsabilidade dos seus respectivos titulares, não lavrarão nem registrarão escrituras relativas a bens imóveis de propriedade da União, ou que contenham, ainda que parcialmente, área de seu domínio:
I – sem certidão da Secretaria do Patrimônio da União – SPU que declare:
a) ter o interessado recolhido o laudêmio devido, nas transferências onerosas entre vivos;
b) estar o transmitente em dia, perante o Patrimônio da União, com as obrigações relativas ao imóvel objeto da transferência; e
c) estar autorizada a transferência do imóvel, em virtude de não se encontrar em área de interesse do serviço público;
II – sem a observância das normas estabelecidas em regulamento;
3o A SPU procederá ao cálculo do valor do laudêmio, mediante solicitação do interessado.
4o Concluída a transmissão, o adquirente deverá requerer ao órgão local da SPU, no prazo máximo de sessenta dias, que providencie a transferência dos registros cadastrais para o seu nome, observando-se, no caso de imóvel aforado, o disposto no art. 116 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946.
5º A não observância do prazo estipulado no § 4º sujeitará o adquirente à multa de 0,50% (cinquenta centésimos por cento), por mês ou fração, sobre o valor do terreno, excluídas as benfeitorias. (Redação dada pela Medida Provisória nº 759, de 2016)
6o É vedado o loteamento ou o desmembramento de áreas objeto de ocupação sem preferência ao aforamento, nos termos dos arts. 105 e 215 do Decreto-Lei no 9.760, de 1946, exceto quando:
a) realizado pela própria União, em razão do interesse público;
b) solicitado pelo próprio ocupante, comprovada a existência de benfeitoria suficiente para caracterizar, nos termos da legislação vigente, o aproveitamento efetivo e independente da parcela a ser desmembrada.
Art. 3o-A Os cartórios deverão informar as operações imobiliárias anotadas, averbadas, lavradas, matriculadas ou registradas nos Cartórios de Notas ou de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos que envolvam terrenos da União sob sua responsabilidade, mediante a apresentação de Declaração sobre Operações Imobiliárias em Terrenos da União – DOITU em meio magnético, nos termos estabelecidos pela Secretaria do Patrimônio da União.
Em resumo, o ponto de atenção é como sempre a matricula do imóvel, onde deve constar informações relevantes como a demarcação do terreno de marinha e o contrato de aforamento. Observado e confirmado estes dois aspectos é necessário aprofundar nos detalhes e inclusive confrontar com a localização atual do imóvel, cadastros na SPU e Prefeitura, além dos recolhimentos de tributos. Essa é a cautela mínima exigida para qualquer transação que envolve este tipo de imóvel.
Fonte de Pesquisa: Irib – Instituto de Registro Imobiliário do Brasil e site do Planalto ( www.planalto.gov.br)
Regina Pedroso é Especialista em Direito Civil pela Universidade Mackenzie e advogada. Diretora da Fomenta Gestão
Fonte: GenJurídico.com.br | Publicado em 17 de abril de 2017