1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Processamento da Adjudicação compulsória extrajudicial – Consulta – Emolumentos – Forma de Cobrança.

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1036456-20.2023.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis

Requerente: Primeiro Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo

Requerido: Jayme Alves Saraiva

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de consulta formulada pelo Oficial do 1º Registro de Imóveis da Capital acerca da cobrança de emolumentos para o processamento da adjudicação compulsória.

O Oficial informa que prenotou requerimento de processamento e registro de adjudicação compulsória sob n. 430.720 em 20 de março de 2023. Assim e pela ausência de previsão na tabela de custas e emolumentos do Registro de Imóveis (Tabela II), questiona se possível a aplicação dos critérios de cobrança do procedimento de reconhecimento extrajudicial de usucapião (Provimento CNJ 65/2017).

Documentos vieram às fls.02/27.

A fim de viabilizar pronta aplicação da decisão ao caso concreto, determinou-se a intimação da parte interessada (item 72.2, Cap.XIII, das NSCGJ – fl.28), a qual não se manifestou (fls. 29/30 e 33).

O Ministério Público opinou pela improcedência (fls. 36/37).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, verifica-se que cobrança na forma sugerida pelo Oficial é possível. Vejamos os motivos.

A melhor doutrina ensina que os emolumentos notariais e registrais possuem natureza jurídica de taxa (artigo 145, inciso II, da Constituição Federal):

“(…) perante a realidade instituída pelo direito positivo atual, parece-me indiscutível a tese segundo a qual a remuneração dos serviços notariais e de registro, também denominada emolumentos, apresenta natureza específica de taxa. O presente tributo se caracteriza por apresentar, na hipótese da norma, a descrição de um fato revelador de atividade estatal (prestação de serviços notariais e de registros públicos), direta e especificamente dirigida ao contribuinte; além disso, a análise de sua base de cálculo exibe a medida da intensidade da participação do Estado, confirmando tratar-se da espécie taxa…” (Carvalho, Paulo de Barros. Natureza jurídica e constitucionalidade dos valores exigidos a título de remuneração dos serviços notariais e de registro. Parecer exarado na data de 05.06.2007, a pedido do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo – SINOREG).

Outro não é o entendimento jurisprudencial a respeito:

“Direito constitucional e tributário. Custas e emolumentos: Serventias Judiciais e Extrajudiciais. Ação direta de inconstitucionalidade da Resolução nº 7, de 30 de junho de 1995, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná: Ato Normativo. (…) 4. O art.145 admite a cobrança de taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição. Tal conceito abrange não só as custas judiciais, mas também, as extrajudiciais (emolumentos), pois estas resultam, igualmente, se serviço público, ainda qu prestado em caráter particular (art.236). Mas sempre fixadas por lei. No caso presente, a majoração de custas judiciais e extrajudiciais resultou de Resolução do Tribunal de Justiça e não de Lei formal, como o exigido pela Constituição Federal…” (ADI 1444 PR, Rel. Min. Sydney Sanches, Tribunal Pleno, julgamento em 12/02/2003, D.J. 11/04/2003).

Diante de tal natureza jurídica, certo é que cobrança e eventual isenção somente poderão ser veiculadas por lei específica, conforme dispõe expressamente o artigo 150 da Constituição Federal1.

No Estado de São Paulo, regulamentação é feita pela Lei Estadual n. 11.331/022, a qual estipula tabela própria para cobrança.

O instituto da adjudicação compulsória extrajudicial foi criado recentemente em nosso sistema jurídico por meio da Lei n. 14.382/2022. Como consequência, não vem previsto na Lei n. 11.331/02 para fins de emolumentos.

Por outro lado, o caput do artigo 5º da Lei n. 11.331/02 é claro ao mencionar que “os valores dos emolumentos são fixados de acordo com o efetivo custo e a adequada e suficiente remuneração dos serviços prestados, levando-se em conta a natureza pública e o caráter social dos serviços notariais e de registro“. Logo e considerando que o processamento da adjudicação compulsória envolverá a prática de atos pela serventia, não há como se admitir que a prestação do serviço se dê de forma gratuita.

Em outros termos, embora não previsto expressamente na Lei n. 11.331/02, o instituto da adjudicação compulsória extrajudicial já existe em nosso sistema jurídico e envolve a prestação de serviços pelo Oficial de Registro de Imóveis, os quais merecem remuneração.

Neste contexto e tendo em vista que há regramento de instituto bastante próximo, o Provimento CNJ 65/2017, que tratou da usucapião extrajudicial, concluo que a cobrança poderá se dar, por analogia, na forma de seu artigo 26:

Art. 26. Enquanto não for editada, no âmbito dos Estados e do Distrito Federal, legislação específica acerca da fixação de emolumentos para o procedimento da usucapião extrajudicial, serão adotadas as seguintes regras:

I – (…);

II – no registro de imóveis, pelo processamento da usucapião, serão devidos emolumentos equivalentes a 50% do valor previsto na tabela de emolumentos para o registro e, caso o pedido seja deferido, também serão devidos emolumentos pela aquisição da propriedade equivalentes a 50% do valor previsto na tabela de emolumentos para o registro, tomando-se por base o valor venal do imóvel relativo ao último lançamento do imposto predial e territorial urbano ou ao imposto territorial rural ou, quando não estipulado, o valor de mercado aproximado“.

Diante do exposto, respondo a consulta observando que possível cobrança dos emolumentos relativos ao processamento da adjudicação compulsória com base no Provimento CNJ 65/2017.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Não havendo recurso, remeta-se à E. CGJ cópia integral dos autos para reexame e uniformização do entendimento administrativo a ser adotado no Estado, conforme determinam o artigo 29, §2º, da Lei n.11.331/02 e o item 72.1, Cap.XIII, das NSCGJ. A presente decisão serve como ofício.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 04 de maio de 2023.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito

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1 “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; (…)

§ 6º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g”.

2 “Do Fato Gerador

Artigo 1º – Os emolumentos relativos aos serviços notariais e de registro têm por fato gerador a prestação de serviços públicos notariais e de registro previstos no artigo 236 da Constituição Federal e serão cobrados e recolhidos de acordo com a presente lei e as tabelas anexas”.

(DJe de 08.05.2023 – SP)