2ª VRP|SP: Tabelião de Notas – Escritura de compra e venda – Qualificação notarial – Menor – Alvará judicial que determinava o depósito judicial prévio – Descumprimento – Ilícito administrativo caracterizado.

Processo Digital nº: 0050251-81.2021.8.26.0100

Registros Públicos

Requerente: J.D.V.R.P.C. e outro

Vistos.

Trata-se de processo administrativo disciplinar instaurado em face da Sra. M. E. C. C. N., Oficial do Registro Civil e Tabeliã de Notas de Subdistrito da Comarca da Capital, em virtude da lavratura de escritura pública de compra e venda autorizada por alvará judicial sem o depósito judicial prévio da parte pertencente pelo vendedor incapaz, como determinado pela ordem judicial (a fls. 01/176).

A Sra. Oficial e Tabeliã foi interrogada (a fls. 188/190) e apresentou defesa prévia (a fls. 192/195). Produzida a prova oral e encerrada a instrução (a fls. 212/214), em alegações finais a Sra. Oficial e Tabeliã pugnou pela improcedência do processo administrativo disciplinar em razão de ter atuado conforme interpretação plausível do alvará expedido (a fls. 217/221).

É o breve relatório. Decido.

O objeto da imputação deste processo administrativo disciplinar encerra a lavratura de escritura pública de compra e venda de bem imóvel, de vendedor incapaz, com a utilização de alvará, sem a comprovação do depósito prévio do preço perante o Juízo que autorizou a venda do bem da propriedade do menor, como constava da autorização judicial.

É incontroverso, e documentalmente provado, a lavratura da escritura pública de compra e venda sem a comprovação do depósito prévio da parte pertencente pelo vendedor incapaz. No corpo do alvará judicial, que autorizava a venda de imóvel de propriedade em condomínio de interdito, constou a seguinte determinação:

(…) com a ressalva de que deverá depositar em Juízo a parte cabente ao curatelado A. N. C., condicionada a lavratura da escritura pública à comprovação ao Oficial de Registro de Imóveis do prévio deposito judicial.

Não obstante ao eventual equívoco do alvará ao referir o Oficial de Registros de Imóveis e não a Vara Judicial, a ordem judicial era clara quanto à impossibilidade da lavratura da escritura sem o depósito prévio da parte da titularidade do incapaz. Nessa perspectiva, qualquer que fosse a compreensão, era certo a impossibilidade da lavratura da escritura pública sem o prévio depósito judicial da parte do incapaz, como ocorreu. Desse modo, a realização da escritura pública contrariou expressa ordem judicial existente no alvará judicial.

Essa irregularidade poderia ser evitada ao tempo da qualificação notarial inicial, bem como, no momento da subscrição.

O erro é inescusável por evidente e passível de ser evitado acaso houvesse o correto cumprimento dos deveres de fiscalização e orientação da Sra. Titular.

A Sra. Titular, apesar de não haver realizado o ato diretamente, descumpriu seus deveres legais de fiscalização e orientação de seus prepostos, configurando conduta culposa e ilícito administrativo.

As alegações defensivas do Culto Dr. Advogado, respeitosamente, não são acolhidas pelas seguintes razões: Eventual dúvida acerca do conteúdo do alvará deveria conduzir a qualificação notarial negativa e não a lavratura do ato notarial; A interpretação de que o alvará judicial autorizava a realização da escritura pública não guarda razoabilidade com os dizeres do mandamento judicial, porquanto, havia ressalva expressa quanto à necessidade do prévio deposito judicial. Além disso, deve ser considerada a prudência e prática notarial, pois são comuns ordens judiciais determinando o prévio depósito judicial; que também exclui, no conjunto, a interpretação referida em sede de defesa.

Nessa ordem de ideias, repito, está caracterizado ilícito administrativo culposo relativamente ao descumprimento de deveres legais e funcionais da Sra. Oficial e Tabeliã quanto à orientação e fiscalização de seus prepostos.

Passo à fixação da pena administrativa, desde critérios de razoabilidade e proporcionalidade.

A falta é culposa e de média gravidade, assim, excessiva a suspensão e incabível a repreensão reservada à falta leve, donde cabe aplicação da pena de multa.

Estabelecidos os motes da culpabilidade, por critério de razoabilidade e proporcionalidade, tenho por cabível a imposição de multa no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Ante ao exposto, julgo procedente este processo administrativo disciplinar para imposição da pena de multa no importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais) a Sra. M. E. C. C. N., Oficial do Registro Civil e Tabeliã de Notas de Subdistrito da Comarca da Capital, com fundamento nos artigos 31, inc. I, 32, inc. II, e 33, inc. II, da Lei n. 8.935/94.

Encaminhe-se cópia desta decisão à E. Corregedoria Geral da Justiça, por e-mail, servindo esta decisão como ofício.

P.I.

(DJe de 02.05.2022 – SP)