CSM|SP: Registro de imóveis – Procedimento de dúvida – Escritura pública de compra e venda de imóvel – Título que materializa transmissão da propriedade plena, sem relação com o registro anterior de instrumento particular de compra e venda com alienação fiduciária – Alienante que adquiriu a propriedade por meio de arrematação em processo judicial, e não apenas os direitos relacionados à compra e venda com alienação fiduciária – Exigência de apresentação de termo de quitação pelo credor fiduciário afastada – Óbice inoportuno – Acesso do título ao fólio – Sentença reformada – Apelo provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1017974-84.2020.8.26.0405, da Comarca de Osasco, em que é apelante WAGNER DOS SANTOS LENDINES, é apelado 1º OFICIAL DE REGISTROS DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE OSASCO.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento à apelação para julgar improcedente a dúvida, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FERNANDO TORRES GARCIA (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), BERETTA DA SILVEIRA (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), TORRES DE CARVALHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO), HERALDO DE OLIVEIRA (PRES. SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO) E CAMARGO ARANHA FILHO(PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 17 de outubro de 2024.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1017974-84.2020.8.26.0405

APELANTE: Wagner dos Santos Lendines

APELADO: 1º Oficial de Registros de Imóveis e Anexos da Comarca de Osasco

VOTO Nº 43.602

Registro de imóveis  Procedimento de dúvida  Escritura pública de compra e venda de imóvel  Título que materializa transmissão da propriedade plena, sem relação com o registro anterior de instrumento particular de compra e venda com alienação fiduciária  Alienante que adquiriu a propriedade por meio de arrematação em processo judicial, e não apenas os direitos relacionados à compra e venda com alienação fiduciária  Exigência de apresentação de termo de quitação pelo credor fiduciário afastada  Óbice inoportuno  Acesso do título ao fólio  Sentença reformada  Apelo provido.

Trata-se de apelação interposta por WAGNER DOS SANTOS LENDINES em face da r. sentença de fls. 90/91, proferida pela MMª Juíza Corregedora Permanente da Comarca de Osasco, que, em procedimento de dúvida inversa, manteve a negativa de registro da escritura pública de venda e compra tendo por objeto o imóvel da matrícula 112.409 do 1º Oficial de Registro de Imóveis de Osasco, em razão do desatendimento à nota de exigência para apresentação de termo de quitação da alienação fiduciária que recai sobre o bem, firmada entre o anterior proprietário e a Caixa Econômica Federal.

O recurso busca a reforma da sentença, ressaltando ser descabida a exigência para o registro da escritura de compra e venda, a fim de que seja apresentada a “carta de quitação” pela Instituição Financeira, tendo em vista que a exigência se refere ao processo de qualificação do título já registrado, referente à carta de arrematação expedida nos autos da ação judicial em favor do apelante, sem qualquer objeção ou exigência, tratando-se, portanto, de aquisição originária da propriedade. Acrescenta a impossibilidade de cumprimento da exigência feita para comprovação da quitação do financiamento, reafirmando que preço foi depositado nos autos do processo judicial da execução e o destino do valor ao credor fiduciário é ônus que não cabe ao apelante comprovar (fls. 92/102).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo improvimento do apelo (fls. 126/127).

É o relatório.

A apelação merece provimento.

De início, pondere-se que o procedimento trata de dúvida inversa, por envolver matéria de registro “stricto sensu”, ou seja, de qualificação de escritura pública de venda e compra do imóvel objeto da matrícula 112.409 do 1º Registro Imobiliário de Osasco.

E, sendo assim, o expediente que trata da matéria é o procedimento de dúvida (não pedido de providências) e o recurso que desafia a sentença proferida é a apelação, a ser julgada por este Conselho Superior da Magistratura.

De todo modo, como a nota de devolução foi expedida em 25 de setembro de 2020 (fl. 10), a dúvida (inversa) suscitada diretamente pelo interessado em 28 de setembro de 2020 e o arquivo eletrônico do título mantido na Serventia (art.194 da Lei 6.015/73), possível o exame do mérito do “pedido de providências”, apesar do erro na denominação.

No caso em exame, o apelante apresentou ao 1º Oficial de Registro de Imóveis de Osasco escritura pública de venda e compra do imóvel objeto da matrícula 112.409 do 1º Registro Imobiliário, título que recebeu protocolo nº 359.578, com a seguinte nota de devolução:

“Apresentar em protocolo separado o respectivo termo de quitação referente à propriedade fiduciária registrada sob o n. 5 na matrícula 112.409.”

Pois bem.

A exigência apresentada é realmente inoportuna.

Ainda que se pudesse cogitar da necessidade de termo de quitação decorrente do registro da alienação fiduciária pelo R. 4 da matrícula 112.409, a situação jurídica examinada é distinta.

O título objeto de qualificação registral é a escritura pública de venda e compra (fls. 44/46) lavrada em 18 de setembro de 2020, no 3º Tabelião de Notas de Osasco, livro 879, folhas 285/288, pelo qual Wagner dos Santos Lendines vendeu a propriedade do imóvel a Paulo Brancalião e sua mulher Ione Aparecida Gomes Brancalião.

Segundo o R.9 da matrícula 112.409, Wagner dos Santos Lendines adquiriu a titularidade do imóvel por carta de arrematação registrada na Serventia em 29 de janeiro de 2020 (fl. 09), quando o título apresentado foi qualificado positivamente pelo Oficial sem a exigência ora questionada. Não se tratou de aquisição apenas dos direitos pertencentes aos devedores fiduciantes ou de propriedade resolúvel definidas na Lei 9.514/97, mas efetivamente da propriedade, sendo fato que o Registro Imobiliário registrou a propriedade do imóvel em favor do alienante.

Assim, titularizando a propriedade atual e plena do imóvel, conforme R.9 da matrícula 112.409, Wagner do Santos Lendines alienou a propriedade por meio da escritura pública de venda e compra agora submetida à qualificação, objeto desta apelação, não guardando relação de encadeamento direto com o registro anterior do instrumento particular e alienação fiduciária feito no R. 4/M.112.409, a justificar, nesta altura, a exigência de apresentação de termo de quitação.

A propriedade do imóvel estava sedimentada em nome do alienante do imóvel constante na escritura pública submetida à qualificação.

Deste modo, o registro da escritura pública de compra e venda objeto deste procedimento de dúvida atende ao princípio da continuidade, em razão do encadeamento correto da propriedade, devendo-se respeitar o registro antecedente (arrematação), a propriedade consolidada em nome do alienante e os atos jurídicos perfeitos.

Ante o exposto, pelo meu voto, DOU PROVIMENTO à apelação para julgar improcedente a dúvida.

FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça e Relator 

(DJe de 24.10.2024 – SP)