1ª VRP|SP: Registro de Imóveis – Adjudicação compulsória extrajudicial – Impugnação por promitentes vendedores – Alegação de ausência de avaliação e quitação de preço – Improcedência da impugnação por versar matéria estranha à adjudicação compulsória – Regularidade do procedimento extrajudicial.

Sentença

Processo nº: 1142660-54.2024.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 8º Oficial de Registro de Imóveis da Capital e outros

Suscitado: Marcelo Winther de Castro e outro

Prioridade Idoso

Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo 8º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, em decorrência de impugnação apresentada por Mariza Amador Bueno Belekevicius e Luiz Adolfo Belekevicius contra requerimento de Marcelo Winther de Castro de adjudicação compulsória extrajudicial de parte do imóvel da matrícula n. 3.631 daquela serventia (prenotação n. 840.708).

O Oficial informa que Marcelo Winther de Castro e Mônica Moschetto Winther de Castro requereram a adjudicação compulsória extrajudicial, com o fito de obter o título de propriedade sobre a fração de 1/6 do imóvel objeto da matrícula n. 3.631; que os requerentes alegam que adquiriram a referida fração ideal mediante compromisso de compra e venda firmado com Mariza Amador Bueno Belekevicius, devidamente quitado, contudo, não lograram obter a respectiva escritura pública de compra e venda definitiva; que o requerimento relacionou diversas conversas travadas com a promitente vendedora, foi instruído por ata notarial, comprovantes de transferências bancárias de pagamento do preço ajustado, comprovante de pagamento do ITBI incidente sobre a transação e certidões regulamentares; que, autuado o requerimento, foram expedidas as notificações de praxe; que Mariza Amador Bueno Belekevicius e Luiz Adolfo Belekevicius apresentaram impugnação, sustentando que não receberam o valor referente ao seu quinhão no referido imóvel; que os requerentes ofertaram contrarrazões; que rejeitou a impugnação por considerá-la infundada, haja vista que ventila matéria estranha à adjudicação compulsória, com fulcro no artigo 440-AB, inciso III, do Provimento CNJ n. 150/2023; que, irresignada contra o despacho de rejeição, a parte impugnante apresentou recurso, sobrevindo contrarrazões do requerente; que, pautado nos critérios de prudência e razoabilidade, manteve o entendimento de que a impugnação é infundada, porquanto argui matéria estranha à adjudicação compulsória, e encaminhou os autos ao juízo para exame da relevância da impugnação (fls. 01/06).

Documentos e cópia do procedimento extrajudicial foram juntados às fls. 07/316.

Nas razões recursais, a impugnante aduz que, em virtude do óbito de Marlene Nelli, ocorrido em 25 de setembro de 2021, o imóvel da matrícula n. 3.631, do 8º RI, foi inventariado nos autos do processo n. 1030902-05.2021.8.26.0001, onde foi feito o pagamento do preço ajustado sem que a impugnante tivesse conhecimento do valor real de seu quinhão; que o imóvel foi adquirido pelo advogado que patrocinou o inventário, mas não houve avaliação; que, diante da ausência de avaliação do imóvel, não há prova da quitação do preço pactuado pelos requerentes; que, deste modo, o pedido de adjudicação compulsória deve ser indeferido (fls. 261/281).

Em contrarrazões, o impugnado sustenta, em síntese, que adquiriu em 2021, a fração ideal correspondente a 1/6 do imóvel da matrícula n. 3.631, pelo preço de R$ 60.000,00, devidamente quitado; que todos os comprovantes de pagamento do preço encontram-se indicados na ata notarial que instruiu o requerimento inicial; que os impugnantes apresentaram estimativa do valor total do imóvel (R$ 390.600,00) que se fosse aplicado à fração ideal de 1/6 resultaria em valor compatível com o negociado pelas partes (R$ 65.100,00); que a via extrajudicial não se mostra adequada para os argumentos aventados pelos impugnantes, devendo se socorrer das vias ordinárias; que o que se discute na adjudicação compulsória é somente a compra e venda, que encontra-se devidamente quitada; que os impugnantes fazem menção aos artigos 824 a 826 do Código de Processo Civil, que se aplicam à execução por quantia certa e, portanto, não se aplicam ao presente caso; e que diante de toda documentação apresentada, inclusive o contrato de compra e venda devidamente assinado e quitado, aliado à negativa dos vendedores em providenciar a lavratura da escritura pública, a adjudicação compulsória deve ser deferida pelo Oficial (fls. 309/316).

O Ministério Público ofertou parecer, opinando pela rejeição da impugnação (fls. 329/330).

É o relatório.

FUNDAMENTO e DECIDO.

Considerando os elementos já presentes nos autos, entendo possível julgamento.

A adjudicação compulsória de imóvel ao compromissário comprador, ou ao cessionário de seus direitos de aquisição, está prevista no artigo 1.418 do Código Civil, nos seguintes termos:

“Art. 1.418. O promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros, a quem os direitos deste forem cedidos, a outorga da escritura definitiva de compra e venda, conforme o disposto no instrumento preliminar; e, se houver recusa, requerer ao juiz a adjudicação do imóvel.”

É importante pontuar que, com o advento da Lei n. 14.382/2022, o pedido de adjudicação compulsória de imóvel objeto de promessa de venda ou de cessão, sem prejuízo da via jurisdicional, poderá ser processado diretamente perante o Oficial de Registro de Imóveis da situação do imóvel, seguindo rito próprio da via extrajudicial, com regulação pelo artigo 216-B da Lei n. 6.015/73, pela Seção XVI, Cap. XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça e Provimento CNJ n. 149/2023, com as disposições específicas introduzidas pelo Provimento CNJ n. 150/2023.

Vale dizer, na esteira da evolução legislativa voltada ao tema da desjudicialização de alguns institutos antes restritos à via judicial, os contratos de compromisso de compra e venda e respectivas cessões podem agora ser executados na via extrajudicial, com a adjudicação compulsória do imóvel.

Assim, como a parte interessada optou pela via extrajudicial para alcançar o registro de transferência da propriedade do imóvel, a análise deve ser feita dentro de seus requisitos normativos.

O Provimento CNJ n. 149/2023, prestigiando a qualificação registral e a importância do processo de adjudicação compulsória pela via extrajudicial, estabelece que os requeridos serão notificados e poderão apresentar impugnação por escrito. Se o requerido impugnar o pedido, o Oficial notificará o requerente para eventual manifestação e, superado este prazo, deverá proferir decisão sobre a impugnação, indeferindo quando, dentre outras hipóteses, versar matéria estranha à adjudicação compulsória ou for claramente impertinente ou protelatória, indicando os motivos que o levaram a tal conclusão:

“Art. 440-AB. O oficial de registro de imóveis indeferirá a impugnação, indicando as razões que o levaram a tanto, dentre outras hipóteses, quando:

I – a matéria já houver sido examinada e refutada em casos semelhantes pelo juízo competente;

II – não contiver a exposição, ainda que sumária, das razões da discordância;

III – versar matéria estranha à adjudicação compulsória;

IV – for de caráter manifestamente protelatório.

Art. 440-AC. Rejeitada a impugnação, o requerido poderá recorrer, no prazo de 10 (dez) dias úteis, e o oficial de registro de imóveis notificará o requerente para se manifestar, em igual prazo sobre o recurso.

(…)

Art. 440-AE. Com ou sem manifestação sobre o recurso ou havendo manifestação de insurgência do requerente contra o acolhimento, os autos serão encaminhados ao juízo que, de plano ou após instrução sumária, examinará apenas a procedência da impugnação.

§ 1º. Acolhida a impugnação, o juiz determinará ao oficial de registro de imóveis a extinção do processo e o cancelamento da prenotação.

§ 2º. Rejeitada a impugnação, o juiz determinará a retomada do processo perante o oficial de registro de imóveis.

§ 3º. Em qualquer das hipóteses, a decisão do juízo esgotará a instância administrativa acerca da impugnação.”

Na sequência, havendo recurso contra a decisão do Oficial acerca da rejeição da impugnação, os autos serão encaminhados ao juízo que, de plano ou após instrução sumária, examinará apenas a procedência da impugnação.

Na espécie, verifica-se que Marcelo Winther de Castro e Mônica Moschetto Winther de Castro requereram a adjudicação compulsória extrajudicial, com o fito de obter o título de propriedade sobre a fração de 1/6 do imóvel objeto da matrícula n. 3.631; que os requerentes alegam que adquiriram a referida fração ideal mediante compromisso de compra e venda firmado com Mariza Amador Bueno Belekevicius, devidamente quitado, contudo, não lograram obter a respectiva escritura pública de compra e venda definitiva, razão pela qual pedem a adjudicação compulsória do imóvel (fls. 09/39).

Notificados, Mariza Amador Bueno Belekevicius e Luiz Adolfo Belekevicius, apresentaram impugnação, asseverando que o imóvel da matrícula n. 3.631, do 8º RI, foi inventariado nos autos da ação de inventário e partilha n. 1030902-05.2021.8.26.0001, em decorrência do óbito de Marlene Nelli, ocorrido em 25 de setembro de 2021. Afirmam que o pagamento do preço do contrato foi feito, mas sem que os impugnantes tivessem conhecimento do valor real de seu quinhão. Sustentam que, como não houve a avaliação do imóvel, não há prova da quitação do preço pactuado pelos requerentes. Referem que já manifestaram sua indignação com relação à compra e venda de referido imóvel nos autos da ação de inventário e partilha n. 1030902-05.2021.8.26.0001 (fls. 209/224).

Pese embora o alegado pela parte impugnante, era de rigor o indeferimento da impugnação por versar matéria estranha à adjudicação compulsória e ante o caráter meramente protelatório.

Nesta senda, constata-se que os requerentes apresentaram o instrumento particular de compromisso de compra e venda celebrado com Mariza Amador Bueno Belekevicius e Luiz Adolfo Belekivicius em 27 de dezembro de 2021, tendo por objeto a aquisição da fração ideal do imóvel, pelo preço ajustado de R$ 60.000,00 (fls. 95/99).

Outrossim, a ata notarial coligida atesta os pagamentos efetuados pelos adquirentes, referentes a cada uma das parcelas, ensejando a quitação do preço pactuado, bem como a negativa dos promitentes vendedores de providenciarem a escritura pública de venda e compra definitiva (fls. 53/72).

Com efeito, a impugnação não apresenta insurgência com relação ao teor do instrumento particular de compromisso de compra e venda celebrado, apresentando argumentos genéricos e abstratos que não afetam diretamente a validade e eficácia do negócio jurídico.

Em contrapartida, os requerentes instruíram o requerimento de adjudicação compulsória observando os requisitos do artigo 216-B, § 1º, da Lei de Registros Públicos e do artigo 440-M do Provimento CNJ n. 149/2023, com cópia do instrumento de promessa de compra e venda, provas do adimplemento integral do preço e ata notarial, não tendo os impugnantes apresentado elementos jurídicos aptos a demonstrar o alegado inadimplemento do título aquisitivo.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE a dúvida suscitada para manter o indeferimento da impugnação apresentada por Mariza Amador Bueno Belekevicius e Luiz Adolfo Belekevicius, determinando o retorno dos autos ao Oficial de Registro de Imóveis, que prosseguirá com o procedimento extrajudicial.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 01 de outubro de 2024.

Renata Pinto Lima Zanetta

Juíza de Direito 

(DJe de 04.10.2024 – SP)