TJ|SP: Inventário. Exclusão de bem do formal de partilha. Regime da separação total de bens. Inadmissibilidade. Imóvel era o domicílio do casal. Inteligência do artigo 1.829 do Código Civil de 2002. Recurso provido.

EMENTA

Inventário – Exclusão de bem do formal de partilha – Inadmissibilidade – Imóvel era o domicílio do casal – Inteligência do artigo 1.829 do Código Civil de 2002 – Recurso provido. (TJSP – Apelação Cível nº 595.009–4/1–00 – São Paulo – 9ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Jose Luiz Gavião de Almeida – Julgado em 03.02.2009)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 595.009–4/1–00, da Comarca de São Paulo, sendo AGRAVANTE Maria de Lourdes Marques e AGRAVADO O Juízo.

ACORDAM, em Nona Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça, por votação unânime, em dar provimento ao recurso.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento apresentado por Maria de Lourdes Marques contra ato que considera ilegal da MM. Juíza de Direito da 1ª Vara de Família e Sucessões do Foro Regional de Penha de França desta Capital e consistente em excluir bem objeto do inventário, onde é inventariante, da partilha.

Informações a fls. 72.

Recurso tempestivo e não contrariado.

É o relatório.

VOTO

Trata-se de agravo tirado de decisão dada no inventário dos bens de JOSUÉ FRANCISCO DO ROSÁRIO e que determinou a exclusão de um imóvel que ali havia sido arrolado para fins de partilha.

O referido bem havia sido adquirido, por usucapião, pelo pai do falecido, e a ele transmitido por via de sucessão hereditária.

A ilustre Juíza oficiante entendeu que, posto fosse o falecido casado pelo regime da separação total de bens com a inventariante, o bem não se comunicava. E também não era caso de concorrência sucessória, consoante jurisprudência que citou.

A certidão de casamento acostada aos autos (fls. 13) mostra que o regime de bens adotado pelo falecido foi o da separação total de bens, conforme pacto antenupcial que celebrou com a viúva inventariante, ora agravante.

Sendo o regime da separação de bens convencional, e tendo o bem sido adquirido pelo falecimento do pai do ora inventariado, não se pode falar em comunicação desse imóvel com o cônjuge supérstite.

Mas se não há comunicação, tendo o falecimento acontecido em 18.02.2006, aplicável é o artigo 1829 I do Código Civil de 2002:

Art. 1.829. A sucessão legítima defere–se na ordem seguinte:

I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único);…

Por isso, embora não tenha havido comunicação do bem, que conseqüentemente não será objeto de meação, o imóvel deve ser partilhado entre o cônjuge sobrevivente, ora agravante, e o filho que ainda é vivo.

Demais disso, tendo em vista a afirmação do consorte sobrevivo no sentido de que o imóvel era o domicílio do casal, tem este direito real de habitação sobre ele, nos termos do artigo 1831 do CC/02.

Com todo respeito ao posicionamento da ilustre Juíza, espaldada em precedentes jurisprudenciais, não se pode, ante à clareza do citado artigo 1829 I do CC/02, equiparar a hipótese da separação obrigatória de bens com a da separação convencional de bens.

No primeiro caso o legislador, como punição àqueles que casaram sem o poder ou sem o dever, pune-os com a incomunicabilidade dos bens e a impossibilidade de transferência posterior dos mesmos.

No segundo caso, quando a escolha do regime foi livre, quis o legislador amparar o consorte sobrevivente, garantindo-lhe parcela do patrimônio que não alcançou pela meação. Essa situação, aliás, já estava no nosso direito, na lei 883/49, nunca tendo sido contestada.

É verdade que a intenção das partes pode ter sido evitar ingresso de um no patrimônio do outro cônjuge, como quer crer a ilustre Juíza e os que ela segue. Mas a solução apenas de lege ferenda pode ser admitida.

No sentido de que há participação do cônjuge sobrevivente casado pelo regime da separação de bens convencional na herança do consorte falecido também já existem precedentes jurisprudenciais:

INVENTÁRIO. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. CONCORRÊNCIA DO CÔNJUGE SUPÉRSTITE COM OS FILHOS. CABIMENTO. 1. A lei que rege a capacidade sucessória é aquela vigente no momento da abertura da sucessão. Inteligência dos art. 1.787 do CCB. 2. Tendo o casamento sido realizado pelo regime da separação convencional de bens, o cônjuge supérstite deve ser chamado para suceder, concorrendo com os filhos do casal aos bens deixados pelo falecido. Inteligência do art. 1.829, inc. I, do CCB. 3. Depois de ter sido nomeado perito e oferecido o laudo com a apuração dos haveres, descabe oportunizar a nomeação de assistentes técnicos. Recurso desprovido. (TJRS, Agravo de Instrumento, Sétima Câmara Cível N° 70 020 919 817, Comarca de Canoas)

Dessarte dá-se provimento ao recurso para manter o imóvel no inventário, mas para que tenha ele a repartição nos moldes acima indicados.

Presidiu o julgamento o Desembargador JOÃO CARLOS GARCIA, sem voto, e dele participaram os Desembargadores GRAVA BRAZIL e VIVIANI NICOLAÜ.

São Paulo, 03 de fevereiro de 2009.

JOSE LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA – Relator.

Fonte: Boletim Eletrônico INR 4145 – Grupo Serac | Publicado em 10/09/2010