TJ|SP: Sucessão – Herança – Companheira – Concorrência com filhos decorrente da união estável e filho da relação do “de cujus” e terceira pessoa – Ausência de regra legal específica – Determinação de que receba a metade do que couber aos descendentes comum e exclusivo – Solução que preserva a igualdade entre os descendentes – Recurso não provido.

INVENTÁRIO – Partilha judicial – Participação da companheira na sucessão do “de cujus” em relação aos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável – Concorrência da companheira com descendentes comuns e exclusivos do falecido – Hipótese não prevista em lei – Atribuição de cotas iguais a todos – Descabimento – Critério que prejudica o direito hereditário dos descendentes exclusivos, afrontando a norma constitucional de igualdade entre os filhos (art 227, § 6o da CF) – Aplicação, por analogia, do art 1790, II do Código Civil – Possibilidade – Solução mais razoável, que preserva a igualdade de quinhões entre os filhos, atribuindo à companheira, além de sua meação, a metade do que couber a cada um deles – Decisão reformada – Recurso provido. (TJSP – Agravo de Instrumento nº 994.08.138700–0 – São Paulo – 7ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Alvaro Passos – Julgado em 24.03.2010)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n° 994.08.138700–0, da Comarca de SÃO PAULO – FAMÍLIA, em que são agravantes VERA LÚCIA CARLETTI BUFFOLO, ELISABETE CARLETTI DE LACERDA e OSANA CARLETTI SENNA sendo agravados ELAINE CRISTINA CARLETTI, JOSÉ LUIZ CARLETTI, VERA LÚCIA BONTEMPO, SANDRA RENATA CARLETTI SANDRI, NATHALIA DANIELE BONTEMPO e DENYS RODRIGO BONTEMPO CARLETTI.

ACORDAM, em 7a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “DERAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores LUIZ ANTÔNIO COSTA (Presidente sem voto), ELCIO TRUJILLO E SOUSA LIMA.

São Paulo, 24 de março de 2010.

ALVARO PASSOS

RELATÓRIO E VOTO

Vistos.

Trata–se de agravo de instrumento interposto contra decisão que, nos autos do inventário dos bens deixados por Lourivaldo Carletti, relativamente à partilha dos bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, atribuiu à companheira sobreviva, além de sua meação, cota igual aos dos oito herdeiros filhos, ou seja, 1/9 da herança.

Em apertada síntese, sustentam as agravantes que a partilha determinada sobre a totalidade dos bens contraria a lei e a proporção estabelecida (1/9) prejudica os herdeiros exclusivos do de cujus.

Concedido efeito suspensivo (fls. 384), o recurso foi processado com as manifestações dos demais herdeiros, estando em termos para julgamento.

É o relatório.

De início, convém esclarecer que a r. decisão agravada tratou, especificamente, da participação da companheira na sucessão do de cujus, definindo a partilha judicial tão somente dos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável ante a omissão do legislador, que se esqueceu de prever, no art. 1790 do Código Civil, a cota hereditária do companheiro na hipótese de haver descendentes comuns e também exclusivos, como no caso em exame.

Descabida, portanto, a alegação de que a partilha determinada envolveu a totalidade dos bens da herança.

Contudo, no que se refere ao quinhão hereditário conferido à companheira, que concorre tanto com descendentes comuns como com exclusivos do de cujus, a solução adotada pelo ilustre magistrado singular merece reparo, pois prejudica os filhos exclusivos, afrontando a norma constitucional que assegura a igualdade entre todos os filhos (art. 227, § 6o da CF).

Com efeito, como destacam Euclides Benedito de Oliveira e Sebastião Amorim, “enquanto não se pacifica a questão, parece–nos mais adequado interpretar o artigo 1.790, na hipótese de concorrência do companheiro com filhos híbridos, sob o mesmo critério adotado na hipótese de concorrência do cônjuge, regulada no artigo 1.832, ou seja, somente atribuir ao companheiro quota igual à dos descendentes quando forem todos comuns: se houver descendentes exclusivos do autor da herança, o companheiro não terá aquele direito à quota inteira, mas sim à metade do que couber a cada herdeiro”.[1]

Nesse sentido, inclusive, já se pronunciou esta C. Corte:

SUCESSÃO – Herança – Companheira – Concorrência com filhos decorrente da união estável e filho da relação do “de cujus” e terceira pessoa – Ausência de regra legal específica – Determinação de que receba a metade do que couber aos descendentes comum e exclusivo – Solução que preserva a igualdade entre os descendentes – Recurso não provido. (Agravo de Instrumento n° 652.505– 4/0–00 – São Paulo – 5a Câmara de Direito Privado – Relator: Rober Mac Cracken – 09.09.09 – V.U. – Voto n° 5371)

Assim, não havendo consenso entre todos os herdeiros e diante da lacuna da lei acerca do tema, inclino–me pela aplicação, por analogia, do art. 1790, II do Código Civil, de sorte a preservar a igualdade de quinhões entre os filhos, atribuindo à companheira, além de sua meação, metade da cota de cada um deles.

Pelo exposto, dou provimento ao agravo nos termos supramencionados.

ALVARO PASSOS – Relator.


Notas

[1] Inventários e partilhas: direito das sucessões: teoria e prática. 22a ed.rev. e atual. São Paulo: Livraria e Editora Universitária de Direito, 2009. Página 176.

Fonte: Boletim INR | Grupo Serac | 4302 | São Paulo, 06 de Dezembro de 2010.