TJ|SP: Agravo de Instrumento. Locação. Imissão na posse. Abandono. Prova inequívoca. Demonstração de forma inequívoca por meio de ata notarial dotada de fé pública. Recurso improvido.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n° 990.10.459908-3, da Comarca de São José dos Campos, em que é agravante ELCANA AUTO POSTO LTDA sendo agravado IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S/A.
ACORDAM, em 32ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores RUY COPPOLA (Presidente sem voto), FRANCISCO OCCHIUTO JÚNIOR E WALTER CÉSAR EXNER.
São Paulo, 09 de dezembro de 2010.
WALTER ZENI
RELATOR
Comarca de SÃO JOSÉ DOS CAMPOS – 3ª Vara Cível
Agravante: ELCANA AUTO POSTO LTDA
Agravada: IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S/A
Voto n° 12.046
AGRAVO DE INSTRUMENTO – LOCAÇÃO DE IMÓVEL – DESPEJO POR INFRAÇÃO CONTRATUAL – Pedido de antecipação de tutela. Imissão da autora na posse do imóvel locado. Deferimento sem o direito de promover alterações físicas no imóvel, sob pena de configuração de atentado. Existência dos pressupostos do artigo 273 do Código de Processo Civil. Reconhecimento. Possibilidade. Decisão mantida.
Caracterizada a verossimilhança das alegações da autora por meio de prova inequívoca e havendo o fundado receio de dano de difícil reparação, presentes os requisitos legais (CPC/273), está justificada a concessão da tutela antecipada.
RECURSO IMPROVIDO.
Trata-se de agravo de instrumento, interposto pela ré, da decisão proferida nos autos da ação de despejo por infração contratual, fundada em contrato de locação de posto de serviços e atividades a ele vinculadas, entendendo que a situação de abandono ficou suficientemente provada pela ata notarial de fls. 40/41, deferiu a antecipação da tutela para imitir a autora na posse do imóvel sem o direito de promover alterações físicas neste, sob pena de configuração de atentado (fls. 50/51).
Alega a agravante, em resumo, que: o imóvel não está abandonado, pois ocupado por pessoas de sua confiança que fazem a manutenção do local e pagam as contas de água e luz; foram tiradas fotografias apenas dos locais que estavam em obra; o contrato deixou de ser cumprido por culpa exclusiva da agravada, que atrasou a entrega do posto de combustível vindo a atrasar a sua abertura aos clientes; embora a agravada tenha se obrigado a realizar o processo de remediação do solo, em razão da Resolução 273/06 do CONAMA, não o iniciou; foi notificada diversas vezes e multada pelo órgão competente; teve a obra paralisada em razão da multa aplicada, impedindo o início de suas atividades e acarretando-lhe prejuízos imensuráveis; a agravada não cumpriu o contrato de empreitada para o término da obra no imóvel locado em 2008; somente lhe entregou os tanques de combustíveis apenas em 02/10/2009. Asseverando presentes o fumus boni juris e o periculum in mora, postula a concessão de efeito suspensivo ao recurso e, a final, seu provimento para revogar a tutela antecipada deferida.
Agravo preparado, processado com atribuição de efeito suspensivo (fl. 88), e respondido (fl. 92/101).
É o relatório, no essencial.
Respeitada a combatividade do douto patrono da agravante, data venia, o recurso não comporta provimento, na medida em que se encontram presentes os requisitos necessários à antecipação da tutela postulada pela agravada e que foi deferida pelo MM. Juiz a quo, para imitir a autora na posse do imóvel se o direito de promover alterações físicas neste, sob pena de configuração de atentado, a fim de evitar dano ao direito demandado em juízo diante do fundado (fls. 50/51).
Como sabido, a concessão da antecipação da tutela condiciona-se à existência de prova inequívoca da verossimilhança da alegação, isto é, a probabilidade da existência do direito deve ser mais do que a simples aparência (CPC, art. 273).
Na lição de TEORI ALBINO ZAVASCKI, “o risco de dano irreparável ou de difícil reparação e que enseja antecipação assecuratória é o risco concreto (e não o hipotético ou eventual), atual (ou seja, o que se apresenta iminente no curso do processo) e grave (vale dizer, o potencialmente apto a fazer perecer ou prejudicar o direito afirmado pela parte).” (“Antecipação da Tutela”, RT., 1.997, p. 77).
A medida antecipatória, portanto, visa antecipar os efeitos da tutela definitiva, ou, mais precisamente, antecipar os efeitos que a futura sentença definitiva de procedência poderá produzir no plano concreto.
No caso vertente, embora a agravante afirme que o imóvel não está abandonado, a agravada demonstrou de forma inequívoca, por meio de certidão de ata notarial dotada de fé pública (fls. 46/47 verso) que no local do imóvel “não havia qualquer barreira, muro ou portão que impedisse a entrada” de pessoas, sendo constatada a existência de “uma edificação em construção de alvenaria não acabada e uma ‘casa’ de madeira com paredes pintadas na cor branca e vermelha como se fosse um canteiro de obra”, bem como “a existência de diversos tubos de gasolina na cor azul cravados na terra”, além de “diversos buracos, morros de terra, mato e lixo”, evidenciando, prima facie, a situação de abandono do imóvel locado à agravante.
Por outro lado, constata-se que a agravada foi imitida na posse do imóvel em 17/09/2010 (fl. 102), ou seja, dezenove dias antes da interposição do presente agravo de instrumento pela agravante, que nada mencionou a respeito em suas razões recursais (fls. 02/08), fato que confere maior verossimilhança à alegação de abandono do imóvel, pois induz a crer que a agravante já não exercia a posse e qualquer cuidado do imóvel ao menos desde aquela data.
Nesse contexto, como anotado pelo eminente Desembargador ORLANDO PISTORESI, socorrendo-se da ponderação de ADROALDO FURTADO FABRÍCIO, no julgamento do Agravo de Instrumento 679.609-0/3 que tramitou perante o extinto Segundo Tribunal de Alçada Civil:
“se a demora na entrega da prestação jurisdicional cria o risco de sua inutilidade prática quando ao fim sobrevier, ou de sua reduzida efetividade prática, podem-se instituir mecanismos assecuratórios tendentes a preservar o bem da vida em disputa, colocando-se sob custódia judicial a fim de que ele se conserve com o mínimo de desgaste ou deterioração, até que se decida de sua titularidade. Se, por outro lado, a alta probabilidade de ter razão o autor desde logo se impõe ao espírito do Juiz, razoável é, por igual, que àquele se outorgue, mesmo provisoriamente, a fruição desse bem durante o curso do processo ou, quando menos, a subtração desse desfrute ao réu. Tem-se, no primeiro caso, a tutela de urgência e, no segundo, a tutela de evidência” (“Breves notas sobre provimentos antecipatórios, cautelares e liminares”, in Inovações do Código de Processo Civil, Ed. Livraria do Advogado, pág. 12).
Por outro lado, pondera-se que não se vislumbra perigo de irreversibilidade do provimento antecipatório, visto que a agravada foi imitida na posse “sem o direito de promover alterações físicas neste, sob pena de configuração de atentado”, sendo que, em caso de eventual improcedência da demanda, a empresa agravante poderá cobrar da agravada os eventuais danos e despesas decorrentes do seu cumprimento.
Em suma: presentes os respectivos pressupostos, viabiliza-se a concessão de tutela/antecipada requerida, visto que os fatos narrados são capazes, segundo a ordem jurídica, de conduzir ao resultado que se postula.
No mais, a análise mais aprofundada da matéria debatida nestes autos representaria inoportuna intromissão no mérito da demanda, o que não se admite, visto que a questão ora apreciada restringe-se apenas à verificação da presença ou não dos requisitos autorizadores da antecipação da tutela.
Ante o exposto, NEGA-SE PROVIMENTO ao recurso.
WALTER ZENI
Relator