Alguns aspectos da fiança no inquilinato, após a lei 12.112/2009
Sílvio de Salvo Venosa*
O art. 12 da Lei do Inquilinato expõe que “em casos de separação de fato, separação judicial, divórcio ou dissolução da união estável, a locação residencial prosseguirá automaticamente com o cônjuge ou companheiro que permanecer no imóvel”. Indubitável a lógica e justiça dessa norma, já presente na redação original da lei, com mínima alteração.
No art. 11 estão presentes outras hipóteses de sub-rogação da locação, pois morrendo o locatário ali se estampa que nas locações residenciais permanecem como inquilinos o cônjuge sobrevivente ou o companheiro ou sucessivamente os herdeiros necessários e pessoas que viviam sob a dependência econômica do falecido. Nas locações com finalidade não residencial, a sub-rogação será para o espólio ou o sucessor do negócio, conforme o caso.
Em todas essas eventualidades, o § 1º do art. 12, introduzido pela lei 12.112/2009, determina que a sub-rogação será comunicada por escrito ao locador e ao fiador, se esta for a modalidade de garantia locatícia. O § 2º do mesmo artigo, também trazido pela recente lei, explicita que o fiador poderá exonerar-se do ônus, no prazo de 30 dias do recebimento da comunicação, ficando responsável pelos efeitos da fiança durante 120 dias após a notificação ao locador.
Sendo a fiança uma garantia pessoal, não é exigível que o fiador continue a garantir a obrigação de outro afiançado com quem não contratou. Nas situações dúbias pode o fiador pedir declaração de exoneração da fiança. O texto atual coloca em situação mais clara e confortável o fiador, o qual, no entanto, ficará responsável pela fiança pelo prazo de 120 dias a contar de sua comunicação de exoneração no prazo de 30 dias, como reza o texto. Esse prazo de 120 dias é conferido, evidentemente, a fim de que as partes, senhorio e inquilino sub-rogado, possam providenciar novo fiador ou estabelecer nova modalidade de garantia locatícia. Desse modo, ocorre uma acomodação dos interessados, no que andou bem o legislador, fugindo do texto mais rigoroso do CC (art. 835).
A lei determina que a sub-rogação seja comunicada por escrito ao locador para que este possa exigir nova fiança ou novas garantias permitidas na lei. É evidente que, nas situações conjugais, é o próprio locatário originário quem permanece no imóvel, nada se altera. Trata-se aqui de obrigação do inquilino sub-rogado. Na sua omissão praticará infração legal. A finalidade da lei é impedir que a locação remanesça sem garantias ou com garantia duvidosa. O locador poderá exigir outra garantia. A lei não diz qual o prazo para o inquilino comunicar por escrito a sua sub-rogação na locação. Como passa ele a responder pelos encargos da locação, deverá fazê-lo até o primeiro pagamento que efetuar dos alugueres, sob pena de transgredir a determinação legal. Não obstante operar-se de pleno direito, a sub-rogação legal na locação só se conclui depois de feita a comunicação e quem permanecer no imóvel indicar novo fiador. A sub-rogação se mantém, contudo, se o locador se queda silente à comunicação recebida ou se o mesmo fiador concorda em garantir o novo obrigado. Pelos princípios do contrato de fiança, contudo, como regra geral, não pode o fiador garantir obrigação de quem não contratou. Interpreta-se e se aplica a fiança restritivamente.
Conforme acentuado, a modificação introduzida pelo §2º permite que o fiador se exonere do encargo no prazo de 30 dias da comunicação do sub-rogado, isto é, daquele que permanece no imóvel. O fiador ficará, porém, ainda responsável pela garantia durante 120 dias após a notificação ao locador. Nesse período, cumpre ao locatário providenciar nova garantia locatícia, sob pena de infração contratual. O texto é importante, pois vem dirimir dúvidas na jurisprudência.
Doutra parte, comunicada a mudança, silentes o locador e o fiador, não há mais que se responsabilizar o primitivo fiador que não garante o novo inquilino. Esta parece ser a melhor orientação.
Não comunicada ao locador a sub-rogação, fica o inquilino sujeito à ação de despejo. Isso porque resta o contrato sem a garantia pessoal fidejussória. Nada impede, no entanto, que o inquilino preste outras garantias permitidas por lei, que não a fiança.
A lei fala em comunicação por escrito ao locador. Não é idônea, portanto, a comunicação verbal. A lei anterior não fazia essa exigência, mas era de se entender como dificilmente subsistente a comunicação verbal. Possível, tacitamente, no entanto, quando, por exemplo, o locador passasse a fornecer recibos em nome do novo inquilino. A comunicação deve ser escrita, não se exigindo maior formalidade, mas deve de ocorrer a inequívoca ciência do locador.
Recusando-se o locador a permitir a sub-rogação, não recebendo os aluguéis, por exemplo, poderá o consorte remanescente propor ação de consignação, em que fará valer sua condição legal. A mesma questão poderá ser trazida como matéria de defesa em eventual ação de despejo.
Estes e demais aspectos da lei inquilinária são por nós tratados em nossa obra “Lei do Inquilinato Comentada”, prestes a sair devidamente atualizada em sua 10ª edição, pela Editora Atlas.
*Juiz no Estado de São Paulo por 25 anos. Aposentou-se como membro do extinto Primeiro Tribunal de Alçada Civil, passando a integrar o corpo de profissionais de grandes escritórios jurídicos brasileiros.
Fonte: Migalhas n. 2.308, 18/01/2010.