STJ: Agravo Regimental. Recurso Especial. Direito de Família. Requisitos da União Estável. Separação de Fato. Comprovação. Inversão do julgado. Impossibilidade. Necessidade de reexame de fatos e provas. Incidência da Súmula 07⁄STJ.
EMENTA
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. REQUISITOS DA UNIÃO ESTÁVEL. SEPARAÇÃO DE FATO. COMPROVAÇÃO. INVERSÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 07⁄STJ. 1. Para a caracterização da união estável, devem-se considerar diversos elementos, tais como o ânimo de constituir família, o respeito mútuo, a fidelidade, a coabitação, a comunhão de interesses e a estabilidade da relação. 2. Esta Corte Superior consagrou o entendimento de que o relacionamento amoroso, paralelo a casamento válido, não pode ser reconhecido como união estável (é concubinato), salvo se configurada separação de fato ou judicial entre os cônjuges. 3. Se o Tribunal de origem assentou a existência de separação de fato e a ocorrência de união estável, examinando, para tanto, o acervo fático-probatório dos autos, alterar tal entendimento encontra óbice na Súmula 07 do STJ. 4. “Provada a separação de fato e a longa e estável união, cabível é que a mulher partilhe os bens adquiridos durante a convivência, não impedindo tal pretensão a circunstância de não ter havido a separação judicial” (REsp 202.278⁄SP, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 13.08.2001). 5. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ – AgRg no Resp nº 650.826 – RJ – 3ª Turma – Rel. Min. Vasco Della Giustina – DJ 27.08.2010)
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Massami Uyeda (Presidente), Sidnei Beneti e Paulo de Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 19 de agosto de 2010 (Data do Julgamento).
Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador Convocado do TJ⁄RS) – Relator
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto por A A G A, contra a r. decisão de fls. 1096⁄1100, que negou seguimento ao recurso especial.
O agravante alega, nas razões recursais, que:
O Agravante interpôs Recurso Especial, porque o Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro contrariou a Lei Federal nº 9278⁄96, ao reconhecer a União Estável entre homem casado e concubina, estando ainda, ausente o requisito essencial da affectio maritalis, posto que o Agravante jamais admitiu a hipótese de se separar de sua legítima esposa, permanecendo como está até a data de hoje casado, muito embora residam em países diferentes (…).
(…)
Segundo entendimento do Ilustre Ministro Relator Julgador da Decisão proferida, ora agravada, foi negado seguimento do Recurso Especial do Agravante, por motivo de comprovação de separação de fato entre o demandado e sua esposa e a longa e estável união com a Recorrida. Por conta desse entendimento o Julgador decidiu ser cabível que a recorrida partilhe dos bens adquiridos durante a convivência.
Ocorre que, a Decisão proferida nesse processo pelo relator não é a mais acertada com o bom Direito e Justiça, pois, conforme está fartamente demonstrado nos autos, o Agravante está casado até a data de hoje com a legítima esposa Sra. Maria Helena da Silva Lucas Moreira Azevedo e, ainda, conforme documentos acostados no processo, o Agravante viaja em média por ano de duas a quatro vezes para estar com a Família em Portugal e a sua permanência no Brasil é pelo fato de exercer há anos a atividade de comerciante.
(…)
Outrossim, a Recorrida não comprovou nos autos que ela tivesse tido condições financeiras ou tivesse compartilhado de alguma forma para fazer jus a partilha de bens do casal legítimo (Agravante e sua esposa, Maria Helena). (fls. 1105⁄1107).
Assim, postula pela reconsideração do decisum ora hostilizado ou pela apreciação do feito pelo órgão colegiado competente, haja vista a não configuração de união estável na espécie.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ⁄RS) (Relator): Não obstante os argumentos expendidos pelo agravante, verifica-se que a tese jurídica veiculada nas razões do regimental não é capaz de modificar o posicionamento anteriormente firmado.
Deveras, como consignado na decisão agravada, esta Corte Superior consagrou o entendimento de que a relação de convivência, paralela a casamento válido, não pode ser reconhecida como união estável (é concubinato), salvo se configurada separação de fato ou judicial entre os cônjuges (v.g.: REsp 931.155⁄RS, Rel. Min. NANCY ANDRIGHI, DJ 20.08.2007 e REsp 684.407⁄RS, Rel. Min. JORGE SCARTEZZINI, DJ 27.06.2005).
Outrossim, para a caracterização da união estável, devem-se considerar diversos elementos, tais como o ânimo de constituir família, o respeito mútuo, a fidelidade, a coabitação, a comunhão de interesses e a estabilidade da relação. A respeito:
DIREITO DE FAMÍLIA. UNIÃO ESTÁVEL. CONFIGURAÇÃO. COABITAÇÃO. ELEMENTO NÃO ESSENCIAL. SOCIEDADE DE FATO. AUSÊNCIA DE PROVA DE COLABORAÇÃO PARA A AQUISIÇÃO DOS BENS EM NOME DO DE CUJUS. NÃO CONFIGURAÇÃO DA SOCIEDADE DE FATO. UNIÃO ESTÁVEL. PRESUNÇÃO DE MÚTUA COLABORAÇÃO PARA FORMAÇÃO DO PATRIMÔNIO. DIREITO À PARTILHA.
– O art. 1º da Lei nº 9.278⁄96 não enumera a coabitação como elemento indispensável à caracterização da união estável. Ainda que seja dado relevante para se determinar a intenção de construir uma família, não se trata de requisito essencial, devendo a análise centrar-se na conjunção de fatores presente em cada hipótese, como a affectio societatis familiar, a participação de esforços, a posse do estado de casado, a fidelidade, a continuidade da união, entre outros, nos quais se inclui a habitação comum.
(…)
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 275.839⁄SP, Rel. para acórdão Min. NANCY ANDRIGHI, DJe 23.10.2008).
DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728⁄96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA⁄STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA⁄STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.
I – Não exige a lei específica (Lei n. 9.728⁄96) a coabitação como requisito essencial para caracterizar a união estável. Na realidade, a convivência sob o mesmo teto pode ser um dos fundamentos a demonstrar a relação comum, mas a sua ausência não afasta, de imediato, a existência da união estável.
II – Diante da alteração dos costumes, além das profundas mudanças pelas quais tem passado a sociedade, não é raro encontrar cônjuges ou companheiros residindo em locais diferentes.
III – O que se mostra indispensável é que a união se revista de estabilidade, ou seja, que haja aparência de casamento, como no caso entendeu o acórdão impugnado.
(…)
VII – Consoante o § 3º do art. 20, CPC, “os honorários serão fixados (…) sobre o valor da condenação”. E a condenação, no caso, foi o usufruto sobre a quarta parte dos bens do de cujus. Assim, é sobre essa verba que deve incidir o percentual dos honorários, e não sobre o valor total dos bens.
(REsp 474.962⁄SP, Rel. Min. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, DJ 01.03.2004).
No caso em tela, como se depreende do acórdão recorrido, a configuração da união estável se deu pela análise de diversos fatores – entre eles, a presença dos pressupostos de tal instituto jurídico, bem como a comprovação de ocorrência de separação de fato entre o demandado e sua esposa -, apreciados no contexto do caso concreto. Ora, a inversão do julgado encontra óbice na Súmula 07⁄STJ. Sob esse prisma:
CIVIL E PROCESSUAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. UNIÃO ESTÁVEL RECONHECIDA PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. REEXAME. SÚMULA N. 7⁄STJ. CERCEAMENTO DE DEFESA, OMISSÕES, OBSCURIDADES E CONTRADIÇÕES NO JULGADO RECORRIDO. INOVAÇÕES. INADMISSIBILIDADE. DISPOSITIVOS E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. VIOLAÇÃO. PREQUESTIONAMENTO. COMPETÊNCIA DO C. STF PARA APRECIAÇÃO. DESPROVIMENTO. (AgRg no Ag 998.677⁄DF, Rel. Min. ALDIR PASSARINHO JUNIOR, DJe 01.09.2008).
DIREITOS PROCESSUAL CIVIL E CIVIL. UNIÃO ESTÁVEL. REQUISITOS. CONVIVÊNCIA SOB O MESMO TETO. DISPENSA. CASO CONCRETO. LEI N. 9.728⁄96. ENUNCIADO N. 382 DA SÚMULA⁄STF. ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA⁄STJ. DOUTRINA. PRECEDENTES. RECONVENÇÃO. CAPÍTULO DA SENTENÇA. TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APELLATUM. HONORÁRIOS. INCIDÊNCIA SOBRE A CONDENAÇÃO. ART. 20, § 3º, CPC. RECURSO PROVIDO PARCIALMENTE.
Impende asseverar, por pertinente, que, “provada a separação de fato e a longa e estável união, cabível é que a mulher partilhe os bens adquiridos durante a convivência, não impedindo tal pretensão a circunstância de não ter havido a separação judicial” (REsp 202.278⁄SP, Rel. Min. CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, DJ 13.08.2001).
Por fim, vale ressaltar que os precedentes mencionados pelo agravante em suas razões recursais não se aplicam na espécie, haja vista a ausência de similitude fática, pois, naqueles casos concretos, não restou comprovada a separação de fato, ao passo que, no caso em tela, tal condição foi satisfeita, não podendo, como dito alhures, esta Corte Superior chegar a conclusão diversa, ante a vedação de se reapreciar, na via especial, fatos e provas.
Assim, resta afastada qualquer pretensão de alteração do julgado, tendo em vista a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, que ao consolidar o seu entendimento, opõe-se frontalmente às alegações do agravante.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.
É como voto.
Fonte: Boletim INR nº 4439 – Grupo Serac – São Paulo, 14 de Fevereiro de 2011