STJ: Direito Civil. Aquisição de Imóvel gravado com hipoteca. SFH. Contrato de Promessa de Compra e Venda. Registro. Desnecessidade para a oposição de Embargos de Terceiro em que se discute posse. Súmula 84/STJ. Inexistência de eficácia do gravame hipotecário perante o adquirente do imóvel. Súmula 308/STJ. Dissídio notório. Recurso Especial Provido.
EMENTA
DIREITO CIVIL. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL GRAVADO COM HIPOTECA. SFH. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA. REGISTRO. DESNECESSIDADE PARA A OPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO EM QUE SE DISCUTE POSSE. SÚMULA 84/STJ. INEXISTÊNCIA DE EFICÁCIA DO GRAVAME HIPOTECÁRIO PERANTE O ADQUIRENTE DO IMÓVEL. SÚMULA 308/STJ. DISSÍDIO NOTÓRIO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO. (STJ – REsp nº 689.227 – AL – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 31.08.2010)
DECISÃO MONOCRÁTICA
1. Cuida-se de recurso especial, com fundamento no art. 105, III, “a” e “c”, da Constituição Federal, interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região resumido nos seguintes termos:
DIREITO CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. AQUISIÇÃO DE IMÓVEL HIPOTECADO EM GARANTIA DE DÍVIDA DO SFH. TRANSCRIÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. 1. A aquisição de imóvel só se perfaz mediante transcrição do título de transferência da propriedade no Registro de Imóvel (art. 530, do Código Civil). 2. A hipoteca que respalda a dívida contraída pela construtora através do SFH, devidamente inscrita no Registro de Imóvel, garante a satisfação do crédito da CEF, independentemente de o devedor ter vendido o imóvel a terceiro mediante contrato de compra e venda que, não registrado no competente Cartório de Imóveis, não implica transferência de propriedade. 3. Apelação improvida (fl. 159).
Os embargos de declaração opostos em seguida foram rejeitados (fls.166/171).
A recorrente alega que o aresto em destaque violou o disposto nos arts. 21 e 22 da Lei nº 4.864/65. Segundo entende, “a hipoteca não prevaleceria nos casos de financiamentos decorrentes do Sistema Financeiro de Habitação” (fl.178), pois a propriedade da construtora-mutuária seria transitória, uma vez que os imóveis seriam destinados à venda.
Invoca precedente desta Corte a fim de demonstrar divergência jurisprudencial a respeito do assunto.
Salienta que “o terreno onde foi levantado o empreendimento era de propriedade de terceiros que, como pagamento pelo imóvel, receberam unidades autônomas do prédio que iria ser levantado. Não houve a transmissão de propriedade entre os antigos donos do terreno e a Construtora, razão pela qual a Construtora não poderia ter ofertado em garantia o que não era seu” (fl. 183).
Assim, assevera que o contrato de mútuo firmado entre a Caixa Econômica Federal-CEF e a empresa construtora Ducon encontra-se eivado de irregularidades, devendo ser desconstituída a hipoteca então efetuada, e, por consequência, afastada a penhora da unidade residencial da recorrente.
Pugna pela reforma do acórdão regional “para desconstituir a penhora sobre o apartamento constante do empreendimento FIORDES, diante da impossibilidade da hipoteca sobre construções financiada através de operações financeiras junto a Caixa Econômica Federal” (fl. 187).
Nas contrarrazões, a recorrida argumenta que o dissídio interpretativo não se encontra devidamente configurado e que os temas objeto do recurso especial não foram prequestionados pelo Tribunal a quo. No mérito, pleiteia a manutenção do aresto impugnado defendendo a tese de que o registro da hipoteca torna o negócio público e tem o condão da sequela, seguindo o imóvel com quem o estiver possuindo.
Também houve interposição de recurso extraordinário (fls. 239/249), contrarrazoado às fls. 262/273.
Admitidos ambos os apelos excepcionais (fls. 282), subiram os autos a esta Corte.
É o relatório. Decido.
2. Tratando-se de dissídio notório, conheço do recurso pela alínea “c” e passo a examiná-lo.
A controvérsia tem origem em embargos de terceiro manejados pela recorrente contra a Caixa Econômica Federal-CEF e Ducon Construções Ltda relativos à ação de execução de contrato de mútuo firmado entre às rés.
O relatório do acórdão exarado pela Corte originária esclarece que os embargantes adquiriram imóvel que estava sendo construído pela segunda-ré, ingressaram na posse justa e pacífica desse e o concluíram com verbas próprias.
Do que consta, a hipoteca efetuada pela CEF estava registrada ao tempo em que celebrado o contrato de promessa de compra e venda entre a recorrente e a construtora, este não registrado.
O fato de não ter havido o registro do ajuste de promessa de compra e venda não afasta a possibilidade de se alegar posse por meio de embargos de terceiro, como fez a recorrente. É o que preconiza a Súmula 84/STJ, cujo teor é o seguinte: “É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro”.
Além disso, seja anterior ou posterior ao contrato de promessa de compra e venda, a hipoteca firmada entre a construtora e a CEF não atinge os adquirentes do imóvel. Essa orientação encontra-se cristalizada na Súmula 308/STJ, que dispõe: A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel”.
Seguindo a mesma esteira, confiram-se:
AGRAVO REGIMENTAL. AUSENCIA IMPUGNAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. ÔNUS DO AGRAVANTE. 1. Não basta a agravante alegar que a matéria não se acha pacificada nesta Corte sem impugnar especificamente os fundamentos da decisão, mormente quando o julgador decidiu com base em matéria sumulada. 2. “A Hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel” Súmula 308-STJ. 3. Manifestamente infundado o agravo, com fundamento no art. 557 do CPC, aplico à agravante a multa de 1% sobre o valor atualizado da causa. Nego provimento ao agravo, com a aplicação da multa (AgRg no REsp 691.818/AL, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 03/10/2005);
AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. AQUISIÇÃO DE UNIDADE IMOBILIÁRIA EM CONSTRUÇÃO. HIPOTECA. SÚMULA nº 308/STJ. 1. “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel” (Súmula nº 308/STJ). 2. Agravo regimental desprovido (AgRg no REsp 692.360/AL, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 14/11/2005);
PROCESSO CIVIL E CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. ADMISSIBILIDADE. GARANTIA HIPOTECÁRIA DE FINANCIAMENTO. TERCEIROS DE BOA-FÉ. PROMESSA DE COMPRA E VENDA. VIOLAÇÃO A DISPOSITIVO DE ORDEM CONSTITUCIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE EXAME NA VIA DO RECURSO ESPECIAL.OCORRÊNCIA DE JULGAMENTO EXTRA PETITA. SÚMULAS 282 E 356/STF. SÚMULAS 84 E 308/STJ. 1. A via do recurso especial não é própria para o exame de questões situadas no patamar do direito constitucional. 2. Aplicam-se os óbices previstos nas Súmulas n. 282 e 356/STF quando as questões suscitadas no especial não foram debatidas no acórdão recorrido nem, a respeito, foram opostos embargos de declaração. 3. “A hipoteca firmada entre a construtora e o agente financeiro, anterior ou posterior à celebração da promessa de compra e venda, não tem eficácia perante os adquirentes do imóvel” (Súmula n. 308/STJ). 4. “É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro” (Súmula n. 84/STJ). 5. Recurso especial parcialmente conhecido e improvido (AgRg no REsp 558.364/GO, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ 07/02/2007);
CIVIL E PROCESSUAL. ACÓRDÃO. NULIDADE NÃO CONFIGURADA. RECURSO ESPECIAL. PREQUESTIONAMENTO INSUFICIENTE. EMPREENDIMENTO HABITACIONAL. HIPOTECA INCIDENTE SOBRE UNIDADE AUTÔNOMA. PAGAMENTO INTEGRAL DO DÉBITO PELOS PROMITENTES COMPRADORES. CONSTRUTORA QUE NÃO HONROU SEUS COMPROMISSOS PERANTE O BANCO FINANCIADOR DO EMPREENDIMENTO. EXECUÇÃO HIPOTECÁRIA. EMBARGOS DE TERCEIRO. PROCEDÊNCIA. I. Ausência de prequestionamento em relação à temática vinculada à Lei de Falências. Incidência das Súmulas ns. 282 e 356 do C. STF. II. O adquirente de unidade habitacional somente é responsável pelo pagamento integral da dívida relativa aos imóvel que adquiriu, não podendo sofrer constrição patrimonial em razão do inadimplemento da empresa construtora perante o banco financiador do empreendimento, posto que, após celebrada a promessa de compra e venda, a garantia passa a incidir sobre os direitos decorrentes do respectivo contrato individualizado, nos termos do art. 22 da Lei n. 4.864/65, de sorte que havendo a quitação do preço respectivo, o gravame não subsiste. III. Precedentes do STJ. IV. Recurso especial não conhecido (REsp 600.528/PR, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 17/10/2005);
CIVIL E CONSUMIDOR. IMÓVEL. INCORPORAÇÃO. FINANCIAMENTO. SFH. HIPOTECA. TERCEIRO ADQUIRENTE. BOA-FÉ. NÃO PREVALÊNCIA DO GRAVAME. 1 – O entendimento pacificado no âmbito da Segunda Seção deste STJ é no sentido de que, em contratos de financiamento para construção de imóveis pelo SFH, a hipoteca concedida pela incorporadora em favor do Banco credor, ainda que anterior, não prevalece sobre a boa-fé do terceiro que adquire, em momento posterior, a unidade imobiliária. Súmula 308 do Superior Tribunal de Justiça. 2 – Agravo regimental não provido (AgRg no Ag 664.695/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 22/08/2005).
3. Ante o exposto, com fundamento no artigo 557, § 1º-A, do CPC, dou provimento ao recurso especial, para determinar o afastamento dos efeitos da penhora que recai sobre o imóvel objeto dos embargos de terceiro.
Publique-se. Intime-se.
Brasília, 24 de agosto de 2010.
Ministro Luis Felipe Salomão – Relator.
Fonte: Boletim Eletrônico INR nº 4485 – Grupo Serac – São Paulo, 11 de Março de 2011