TJ|SP: Agravo de Instrumento – Arrolamento – Indeferimento de expedição de alvará de levantamento de saldos existentes em contas bancárias dos autores da herança em favor do único herdeiro, em nome de seu advogado – Descabimento da postulação de substituição processual – Hipótese não configurada de legitimidade extraordinária – Direito próprio e exclusivo do herdeiro – Instrumentos particulares, públicos, peças processuais e quaisquer outros documentos devem mencionar o nome do titular daquele que adquiriu a propriedade e a posse plenas dos bens deixados por força de passamento, mediante homologação de adjudicação – Mandato judicial limita-se a autorizar a prática de atos como se fosse a própria pessoa detentora do objeto – Decisões mantidas – Recurso desprovido.
EMENTA
AGRAVO DE INSTRUMENTO – ARROLAMENTO – Indeferimento de expedição de alvará de levantamento de saldos existentes em contas bancárias dos autores da herança em favor do único herdeiro, em nome de seu advogado – Descabimento da postulação de substituição processual – Hipótese não configurada de legitimidade extraordinária – Direito próprio e exclusivo do herdeiro – Instrumentos particulares, públicos, peças processuais e quaisquer outros documentos devem mencionar o nome do titular daquele que adquiriu a propriedade e a posse plenas dos bens deixados por força de passamento, mediante homologação de adjudicação – Mandato judicial limita-se a autorizar a prática de atos como se fosse a própria pessoa detentora do objeto – Decisões mantidas – Recurso desprovido. (TJSP – Agravo de Instrumento nº 990.10.033206-6 – São Paulo – 8ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Salles Rossi – Julgado em 24.03.2010)
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n° 990.10.033206-6, da Comarca de São Paulo, em que são agravantes EDISON SCALISE (INVENTARIANTE), JOSEMARY DE FÁTIMA GOMES SCALISE, MARIA FORTINO SCALISE (ESPÓLIO) e RAPHAEL SCALISE SOBRINHO sendo agravado O JUÍZO.
ACORDAM, em 8ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Desembargadores CAETANO LAGRASTA (Presidente) e JOAQUIM GARCIA.
São Paulo, 24 de março de 2010.
SALLES ROSSI – Relator
RELATÓRIO E VOTO
Cuida-se de Agravo de Instrumento interposto contra as respeitáveis decisões interlocütórias (fls. 134 e 138) proferida em autos da Ação de Arrolamento, de rito sumário, que indeferiram a expedição de alvará de levantamento de saldos bancários pertencentes aos autores, em nome do advogado.
Inconformados, recorreram o único herdeiro e sua consorte, sustentando a necessidade de sua reforma, sob a razão de que foi homologada, por sentença a adjudicação dos bens deixados pelo falecimento de Maria Fortino Scalise e Raphael Scalise Sobrinho, em favor de Edison Scalise, como único e exclusivo herdeiro.
Prosseguiram dizendo que o seu patrono possui poderes expressos para receber e dar quitação, nas procurações outorgadas.
Alegou ainda que os alvarás foram expedidos em nome do herdeiro, em desconsideração à especial menção de que houvesse emissão em nome do advogado, devidamente autorizado.
Por tais argumentos, requereram o provimento recursal.
O recurso foi recebido (fls. 153/154).
Despicienda resposta, ante a falta de jurisdição contenciosa.
Satisfeita exigência do artigo 526, CPC, por prova documental aduzida pelos recorrentes.
É a síntese do relatório.
O recurso não comporta provimento.
Nada obstante precedente entendimento de parte da jurisprudência, há que se obtemperar a diferença entre os institutos jurídicos e legais envolvidos na presente causa.
Em primeiro lugar, o que se postula enquadra-se em legitimidade extraordinária, que encampa situação excepcional, para a substituição processual, segundo preconiza o artigo 6º do Código de Processo Civil, a saber:
“… Art. 6º Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei… ” (grifamos)
E como soa o fiel testemunho da lição albergada da obra denominada “CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL e legislação processual em vigor“, sob a lavra dos notáveis, Theotonio Negrão e José Roberto Ferreira Gouvêa, com a colaboração de Luís Guilherme Aidar Bondioli – 41ª edição, amplamente atualizada até 13 de janeiro de 2.009, à página 124 (nota 3), anota que:
“… Dá-se a figura da substituição processual quando alguém está legitimado para agir em juízo, em nome próprio, como autor ou réu, na defesa de direito alheio. Quem litiga, como autor ou réu, é o substituto processual; fá-lo em nome próprio, na defesa de direito de outrem, que é o substituto” (Amaral Santos, citado em RTFR 121/18)
Contudo, a circunstância de fato detém o perfil de mandato judicial, o que significa que o titular do direito está representado pelo mandante, devendo o seu nome ser apresentado em todos os documentos e peças processuais, na dicção do artigo 653 do Código Civil.
“… Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato… “ (nossos grifos)
À guisa exemplificativa, é o que sucede com a indicação do nome do autor (art. 282, II, CPC) na petição inicial, ou seja, descreve-se a identificação da pessoa que está representada processualmente por advogado que a redige e a subscreve.
Frise-se não é titular do direito, que consta dessa peça, que faz o seu pedido, pessoalmente, mas sim, o seu patrono, como se ele o fosse.
Assim sendo, compreende-se que a tarefa do mandatário é efetuar negócios, tal qual a própria pessoa interessada, aliás, como se fisicamente estivesse presente ao ato que se realiza, mas o nome que figura no instrumento, quer particular, quer público, sempre será o do mandante, cujo direito lhe pertence.
Não é outra a lição ministrada, com excelência, em comento à disposição dessa regra, pelos notáveis doutrinadores, sob a coordenadoria de Regina Beatriz Tavares da Silva, na obra denominada “CÓDIGO CIVIL COMENTADO“, Editora Saraiva, 6ª edição revista e atualizada – 2.008, às páginas 598 e 599, que diz:
“… Quando o interessado na consecução de determinado negócio jurídico não pode, ou mesmo não quer, seja qual for a razão, praticá-lo, tem a faculdade de efetuá-lo por meio de outrem.
Tendo em vista a premência de um substituto para a feitura de atos de seu interesse, o interessado se coloca na contingência, então, de rogar a estranho, de sua confiança, a incumbência de realizar certo encargo, como se fora ele próprio. A essa transferência de responsabilidade se dá o nome de representação, cujos poderes derivam ou da lei (representação legal) ou do próprio negócio jurídico (representação voluntária ou negociai).
A par dessa colocação preambular, tem-se que o mandato é a relação contratual pela qual uma das partes (mandatário) se obriga a praticar, por conta da outra (mandante), um ou mais atos jurídicos, criando-se, daí, uma espécie de obrigação interna entre ambos. Afigura-se, pois, imanente e imprescindível a idéia de representação no mandato, desde que estabelece relação contratual direta entre o representado e a terceira pessoa, por intermédio do representante.
O mandato só pode ser conferido para a prática de atos jurídicos em que a lei não exige a pessoal intervenção do interessado, ou seja, para os atos destituídos de natureza personalíssima, vedando-se, p. ex., conceder mandato para elaborar e/ou revogar testamento, para o exercício do voto e para prestar depoimento pessoal. Há casos, contudo, embora raros, em que se dispensa a apresentação de mandato para tratar de negócios alheios, v. g., o registro e a averbação, no Registro Imobiliário, poderão ser provocados por qualquer pessoa (art. 217 da Lei n. 6.015/73).
Como ressabido, a procuração consubstancia o mandato, à medida que por ela o outorgante manifesta sua intenção de assenhorear alguém para a prática de atos em seu nome. O traço característico do mandato, portanto, é a representação decorrente da fidúcia, da confiança, possibilitando ao mandante agir como se estivesse a um só tempo em dois lugares… “
No caso em testilha, denota-se que os expedientes (fls. 122/127) foram confeccionados corretamente, uma vez que não paira sobre a identidade do verdadeiro titular do direito, como sendo o único e exclusivo herdeiro, o Senhor Edison Scalise, por força da sentença homologatória da adjudicação de todos os bens deixados pelos seus pais (Maria Fortino Scalise e Raphael Scalise Sobrinho), em decorrência da premissa do § 2o do artigo 1.031 do Código de Processo Civil, a saber:
“… Art. 1.031. A partilha amigável, celebrada entre partes capazes, nos termos do art. 2.015 da Lei n° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil, será homologada de plano pelo juiz, mediante a prova da quitação dos tributos relativos aos bens do espólio e às suas rendas, com observância dos arts. 1.032 a 1.035 desta Lei. (Redação dada pela Lei n° 11.441, de 2007).
§ 1º O disposto neste artigo aplica-se, também, ao pedido de adjudicação, quando houver herdeiro único. (Parágrafo único Renumerado pela Lei n°9.280, de 30.5.1996)
§ Transitada em julgado a sentença de homologação de partilha ou adjudicação, o respectivo formal, bem como os alvarás referentes aos bens por ele abrangidos, só serão expedidos e entregues às partes após a comprovação, verificada pela Fazenda Pública, do pagamento de todos os tributos. (Incluído pela Lei n°9.280, de 30.5.1996)… ” (grifamos)
Ora, se a propriedade dos bens dos autores da herança será transferida para o nome do herdeiro, evidente que os títulos referentes ao ato de mudança de titularidade, devem mencionar tão somente a denominação da parte, o que não impede a que seu advogado proceda à realização das medidas necessárias para sua efetivação, como se fosse a própria pessoa interessada à prática direta, presente fisicamente, perante os órgãos competentes, com a apresentação de procuração com outorga de poderes especiais declarados expressamente à celebração do respectivo negócio jurídico, subscrevendo registro de toda ordem inclusive, mas em nome de seu mandante, consoante o artigo 661, § 1º do Código Civil.
“… Art. 661. O mandato em termos gerais só confere poderes de administração.
§ 1° Para alienar, hipotecar, transigir, ou praticar outros quaisquer atos que exorbitem da administração ordinária, depende a procuração de poderes especiais e expressos… “
Enfim, “ad argumentandum tantum”, apenas pelo amor ao debate, somente assistiria o direito de figurar o nome do advogado, para objeto que lhe coubesse privativamente, como exemplo, os honorários advocatícios que lhe pertencem, como seu imediato titular, com espeque nos artigos 22, § 4º e 23 da Lei n° 8.906, 04dejulhodel.994.
“… Art. 22. A prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência.
§1°…
§ 4º Se o advogado fizer juntar aos autos o seu contrato de honorários antes de expedir-se o mandado de levantamento ou precatório, o juiz deve determinar que lhe sejam passos diretamente, por dedução da quantia a ser recebida pelo constituinte, salvo se este provar que já os pagou… “
“… Art. 23. Os honorários incluídos na condenação, por arbitramento ou sucumbência, pertencem ao advogado, tendo este direito autônomo para executar a sentença nesta parte, podendo requerer que o precatório, quando necessário, seja expedido em seu favor…
À vista de tudo o quanto fora exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.
SALLES ROSSI – Relator.
Fonte: Boletim Eletrônico nº 4487 – Grupo Serac – São Paulo, 14 de Março de 2011.