TJ|SP: Mandado de Segurança coletivo – inconstitucionalidade dos arts. 19 e 21 da Lei Municipal n° 11.154/91, com redação da Lei Municipal n° 14.256/2006, que impõe multa aos notórios que não exigirem certidões de regularidade do IPTU declarada pelo Colendo Órgão Especial — a competência municipal não pode invadir questões registrais ou criar obrigações acessórias a não contribuinte e não responsável (art. 134, VI, CTN) Recurso improvido.

EMENTA

Mandado de Segurança coletivo – inconstitucionalidade dos arts. 19 e 21 da Lei Municipal n° 11.154/91, com redação da Lei Municipal n° 14.256/2006, que impõe multa aos notórios que não exigirem certidões de regularidade do IPTU declarada pelo Colendo Órgão Especial — a competência municipal não pode invadir questões registrais ou criar obrigações acessórias a não contribuinte e não responsável (art. 134, VI, CTN) Recurso improvido. (TJSP – Apelação Cível nº 994.08.217573-0 – São Paulo – 12ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Venicio Salles – Julgado em 15.12.2010)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0103847-15.2007.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO sendo apelado COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL – SEÇÃO DE SAO PAULO.

ACORDAM, em 12ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. V. U.”, de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI (Presidente sem voto), J. M. RIBEIRO DE PAULA E EDSON FERREIRA.

São Paulo, 15 de dezembro de 2010.

VENICIO SALLES – Relator.

RELATÓRIO E VOTO

1. Cuida-se de mandado de segurança coletivo intentado pelo Colégio Notarial do Brasil – Seção de São Paulo, em face do ato do Secretário das Finanças do Município de São Paulo. A postulação se volta contra os atos concretos decorrentes dos art. 19 e 21 da Lei n° 11.154/91, na redação, dada pela lei n° 11.256/2006, que impõe multa ao notário que deixar de exigir certidão de regularidade do IPTU e prova do recolhimento das últimas parcelas. Sustentou que a exigência esbarra em inconstitucionalidade por invasão de competência, instituindo obrigação acessória e não contribuinte do imposto. Pugnou pela concessão da ordem.

A Municipalidade arguiu ilegitimidade pela ausência da ata de assembléia. Quanto a questão de fundo, pugnou pela improcedência, destacando que se trata de mera obrigação acessória, tendo a lei municipal sentido tributário.

O Ministério Público se manifestou pelo acolhimento da pretensão vestibular.

A r. sentença concedeu a ordem.

Apela a Prefeitura renovando seus argumentos. Vieram as contrarrazões.

Levado a mesa o recurso, foi suspendido o julgamento suscitando-se incidente de inconstitucionalidade.

O Colendo Órgão Especial julgou procedente o incidente declarando inconstitucional os arts. 19 e 21 da Lei n° 11.154/91, com redação dada pela Lei n° 14.256/06.

É o relatório.

2. A decretação de inconstitucionalidade dos arts. 19 e 21 da Lei n° 11.154/91 pelo Órgão Especial ratifica a posição apresentada, mantendo-se, assim os argumentos apresentados quando da suscitação do incidente.

“A postulação mandamental não acusa impropriedades processuais, concorrendo os pressupostos processuais, pertinentes a via procedimental e à legitimidade de parte.

A pretensão tem sentido preventivo, direcionando-se contra a produção dos efeitos concreto decorrentes da disposição legal em discussão, impedido a deflagração da severa sanção, caso não exigida a certidão e a prova de recolhimento do IPTU.

Não há vulneração de lei em tese.

O ataque formalizado pela presente via, destarte, visa coibir exigência fiscal e pecuniária em face dos notários de São Paulo, circunstância que afirma a legitimidade ativa.

Quanto a questão de fundo, em que pese a existência de um grande arsenal de normas que não se afeiçoam ao padrão constitucional, flagrante que a nova ordem constitucional cultua a desburocratização, reduzindo as obrigações fiscais acessórias, unificando outras, tudo no sentido de conferir cidadania aos integrantes de pequenas e médias empresas.

O art. 176 da Carta Política Federal sinaliza, de forma contundente, sobre a necessidade da redução das amarras obrigacionais, exigindo simplificação e razoabilidade para a estrutura legal tributária.

Recentemente, através do Decreto n° 6.932/2009, o Governo Federal veio dar mais uma demonstração deste propósito constitucional ligado à desburocratização e simplificação, ao determinar que os órgãos federais deixem de exigir dos administrados, documentos que possam ser obtidos diretamente na própria estrutura estatal.

A síntese de tal vetor constitucional (simplificação e desburocratização indica a impossibilidade de vinculação de qualquer operação mercantil ou imobiliária, à prévia comprovação do recolhimento de tributos não deflagrado na respectiva operação ou transação.

A certidão de regularidade do IPTU não pode ser exigida por ocasião de trespasse imobiliário, posto que não materializa “fato gerador” do tributo municipal, sendo indevida a exigência feita pela Lei Municipal. Seria absolutamente inviável, por exemplo, que a Receita Federal submetesse a mesma operação de compra e venda de imóveis, à comprovação do imposto de renda, para ter controle sobre a origem dos recursos, alteração patrimonial e para futura análise da ocorrência de lucro imobiliário. A existência de interesse FISCAL não representa sempre “interesse público”.

Assim, não se admite qualquer forma de vinculação não necessária. O fisco municipal deve se utilizar dos mecanismos ordinários para promover a cobrança forçada de seus tributos, sem estorvar negócios jurídicos e imobiliários pautados pelo ideal de liberdade. A Lei n° 7.433/85, que trazia exigência neste sentido, não foi recepcionada pela nova ordem introduzida em 1988. I

Assinale-se, ademais, que os notários não são contribuintes do IPTU dos imóveis transacionados por terceiros, bem como, não podem ser enquadradas como responsáveis em tal relação tributaria, pois art. 134, VI, do CTN, atinge apenas os “tributos devidos sobre os atos praticados”.

Existe uma lógica que impregna o texto constitucional e o Código Tributário Nacional, que limita as exigências de vinculação ao mínimo indispensável, representado pelos tributos que se formam ou são gerados com a transferência imobiliária.

Não sendo contribuinte ou responsável, os notários não podem experimentar qualquer reprimenda fiscal, seja de obrigação principal ou acessória, o que revela a fragilidade da norma municipal.

Acrescente-se, por fim, que, ao impedir ou proibir um “ato de registro”, a Lei n° 11.154/91 ganha sentido registral, e como tal inconstitucional, pois o art. 22, XXV, inadmite lei regional ou local sobre o tema, reservando a matéria para a competência Federal.

É de se ressaltar que a própria Lei de Registros Públicos, em seu art. 289, exige ao notário e registrador, rigorosa fiscalização do “pagamento dos impostos devidos por força dos atos que lhes forem apresentados em razão do ofício”, reforçando que apenas os impostos gerados com a operação é que podem ser exigidos (mesmo assim, quando tal exigência não venha a vulnerar o obstar o direito de defesa do contribuinte, que não pode ficar privado do contencioso administrativo junto ao Conselho de Contribuintes, TIT ou órgão municipal)”.

3. Pelo exposto, nega-se provimento ao recurso.

VENICIO SALLES – Relator.