STJ: Direito Civil. Família. Ação de reconhecimento e dissolução de União Afetiva entre pessoas do mesmo sexo cumulada com partilha de bens e pedido de alimentos. Presunção de esforço comum.
Superior Tribunal de Justiça
RECURSO ESPECIAL Nº 1.085.646 – RS (2008/0192762-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : F J F
ADVOGADO : NÁDIA LUCY KINCZEL CAETANO E OUTRO(S)
RECORRIDO : R D C
ADVOGADO : MARIA LUIZA PEREIRA DE ALMEIDA
EMENTA: DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. AÇÃO DE RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO DE UNIÃO AFETIVA ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO CUMULADA COM PARTILHA DE BENS E PEDIDO DE ALIMENTOS. PRESUNÇÃO DE ESFORÇO COMUM.
1. Despida de normatividade, a união afetiva constituída entre pessoas de mesmo sexo tem batido às portas do Poder Judiciário ante a necessidade de tutela. Essa circunstância não pode ser ignorada, seja pelo legislador, seja pelo julgador, os quais devem estar preparados para regular as relações contextualizadas em uma sociedade pós-moderna, com estruturas de convívio cada vez mais complexas, a fim de albergar, na esfera de entidade familiar, os mais diversos arranjos vivenciais.
2. Os princípios da igualdade e da dignidade humana, que têm como função principal a promoção da autodeterminação e impõem tratamento igualitário entre as diferentes estruturas de convívio sob o âmbito do direito de família, justificam o reconhecimento das parcerias afetivas entre homossexuais como mais uma das várias modalidades de entidade familiar.
3. O art. 4º da LICC permite a equidade na busca da Justiça. O manejo da analogia frente à lacuna da lei é perfeitamente aceitável para alavancar, como entidades familiares, as uniões de afeto entre pessoas do mesmo sexo. Para ensejar o reconhecimento, como entidades familiares, é de rigor a demonstração inequívoca da presença dos elementos essenciais à caracterização de entidade familiar diversa e que serve, na hipótese, como parâmetro diante do vazio legal – a de união estável – com a evidente exceção da diversidade de sexos.
4. Demonstrada a convivência, entre duas pessoas do mesmo sexo, pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família, sem a ocorrência dos impedimentos do art. 1.521 do CC/02, com a exceção do inc. VI quanto à pessoa casada separada de fato ou judicialmente, haverá, por consequência, o reconhecimento dessa parceria como entidade familiar, com a respectiva atribuição de efeitos jurídicos dela advindos.
5. Comprovada a existência de união afetiva entre pessoas do mesmo sexo, é de se reconhecer o direito do companheiro à meação dos bens adquiridos a título oneroso ao longo do relacionamento, mesmo que registrados unicamente em nome de um dos parceiros, sem que se exija, para tanto, a prova do esforço comum, que nesses casos é presumida.
6. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, prosseguindo o julgamento, após o voto-vista do Sr. Min. Raul Araújo acompanhando o voto da Sra. Ministra Relatora e negando provimento ao recurso especial, por maioria, negar provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora, vencido o Sr. Ministro Vasco Della Giustina, que votou em sessão anterior dando provimento ao recurso. Declararão voto os Srs. Ministros Raul Araújo, Isabel Gallotti e Sidnei Beneti, que retificou voto proferido em sessão anterior, para acompanhar o voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros João Otávio de Noronha, Sidnei Beneti, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo (voto-vista), Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti e Aldir Passarinho Junior votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 11 de maio de 2011(Data do Julgamento).
MINISTRO MASSAMI UYEDA
Presidente
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora