STJ: Recurso especial – Ação civil pública – Impugnação de ato de incorporação imobiliária – Condomínio especial horizontal de casas (Lei 4.591⁄64) – Alegada burla ao sistema de loteamento urbano previsto na Lei 6.766⁄79 – Não configuração – Incorporadora – Responsabilidade pela construção – Atribuição aos adquirentes do imóvel – Possibilidade – Cumprimento dos requisitos previstos na Lei 4.591⁄64 – Súmulas 5 e 7⁄STJ.

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPUGNAÇÃO DE ATO DE INCORPORAÇÃO IMOBILIÁRIA. CONDOMÍNIO ESPECIAL HORIZONTAL DE CASAS (LEI 4.591⁄64). ALEGADA BURLA AO SISTEMA DE LOTEAMENTO URBANO PREVISTO NA LEI 6.766⁄79. NÃO CONFIGURAÇÃO. INCORPORADORA. RESPONSABILIDADE PELA CONSTRUÇÃO. ATRIBUIÇÃO AOS ADQUIRENTES DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NA LEI 4.591⁄64. SÚMULAS 5 E 7⁄STJ. 1. O recurso especial não é viável quanto à alegada ofensa ao art. 32 da Lei Municipal 3.525⁄98, tendo em vista o enunciado 280 da Súmula do eg. Supremo Tribunal Federal. 2. O loteamento, disciplinado pela Lei 6.766⁄79, difere-se do condomínio horizontal de casas, regulado pela Lei 4.591⁄64 (art. 8º). E a diferença fundamental entre o loteamento (inclusive o fechado) e o condomínio horizontal de casas consubstancia-se no fato de que no primeiro há mero intuito de edificação (finalidade habitacional), sem que, para tanto, haja sequer plano aprovado de construção. No segundo, no entanto, se ainda não houver a edificação pronta ou em construção, deve, ao menos, existir aprovação de um projeto de construção. 3. Na hipótese dos autos, a colenda Corte Estadual – com base na análise do projeto de implantação de condomínio de casas previamente aprovado pela Prefeitura, do memorial descritivo das especificações da obra, do ato de incorporação do condomínio registrado no Cartório de Registro de Imóveis, bem como dos contratos de compra e venda entabulados entre os adquirentes das unidades autônomas e a incorporadora – concluiu que se tratava de verdadeiro condomínio horizontal de casas e de incorporação imobiliária, e não de loteamento. Entendeu, nesse contexto, que foram cumpridos os requisitos previstos na Lei 4.591⁄64. Além disso, concluiu que não houve a alegada burla ao regramento cogente da Lei 6.766⁄79, uma vez que não ficou comprovada nenhuma intenção da incorporadora no sentido de vender unicamente lotes de terreno. 4. O fato de a incorporadora não ficar responsável pela edificação direta das casas do condomínio não caracteriza, por si só, burla ao sistema de loteamento previsto na Lei 6.776⁄79. Ao contrário, o art. 29 da Lei 4.591⁄64 expressamente prevê essa possibilidade, permitindo ao incorporador, quando não for também construtor, escolher tão somente alienar as frações ideais, sem se compromissar com a execução direta da construção do empreendimento incorporado, de modo que esta poderá ser contratada, em separado, pela incorporadora ou pelos adquirentes do imóvel, com terceiro – o construtor. Nessas hipóteses, para que fique caracterizada a vinculação entre a alienação das frações do terreno e o negócio de construção, basta que o incorporador, no ato de incorporação, providencie, perante a autoridade administrativa competente, a aprovação de projeto de construção. 5. No caso em apreço, consoante se dessume dos v. acórdãos (apelação e embargos infringentes) proferidos pela colenda Corte local, a incorporadora apenas celebrou contrato de compra e venda de frações ideais, vinculando-o a projeto de construção aprovado pela Municipalidade, não ficando ela própria responsável pela construção das casas nos condomínios. A incorporadora, autorizada pela Lei 4.591⁄64, providenciou a aprovação de projeto de construção perante a Administração Municipal e o incluiu no Memorial de Incorporação, levado a Registro no Cartório Imobiliário. No contrato celebrado com os adquirentes do imóvel, ficou firmada a responsabilidade destes em providenciar a obra em conjunto com a construtora. 6. Diante das conclusões da colenda Corte de origem, delineadas com base no acervo fático-probatório dos autos e nas cláusulas dos ajustes celebrados entre as partes, não há outra solução senão, na via estreita do recurso especial, adotar o suporte fático delineado na instância ordinária, tendo em vista os óbices previstos nos enunciados nº 5 e 7 da Súmula do eg. STJ, para, então, concluir pela lisura do ato de incorporação imobiliária do empreendimento, registrado no Registro de Imóveis competente e aprovado pelo Município. 7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido. (STJ – REsp nº 709.403 – SP – 4ª Turma – Rel. Min. Raul Araújo – DJ 10.02.2012)

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Marco Buzzi e Luis Felipe Salomão votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 06 de dezembro de 2011 (data do julgamento).

MINISTRO RAUL ARAÚJO – Relator.

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator):

Na origem, órgão do Ministério Público do Estado de São Paulo ajuizou ação civil pública contra SANP AGROPECUÁRIA LTDA, LUIZ PAULO DE CAMARGO ANDRADE, ÁLVARO CAMARGO ANDRADE, NÁDIA BAPTISTA DE CAMARGO ANDRADE e SÉRGIO CAMARGO ANDRADE, objetivando a declaração de nulidade de registro de incorporação imobiliária de empreendimento denominado “Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá”, localizado no Município de Indaiatuba, no Estado de São Paulo. Alegou, para tanto, o Parquet que, embora o empreendimento tenha sido nominado como condomínio especial horizontal, regido, portanto, pela Lei 4.591⁄64, na realidade, configurava loteamento disfarçado, o qual deveria observar as determinações da Lei 6.766⁄79 e a exigência de reserva de área pública, prevista na Lei Municipal 3.525⁄98. Requereu, na exordial, a declaração de nulidade do referido registro e a condenação dos requeridos a regularizar o loteamento, no prazo de 120 dias, reservando áreas públicas no percentual de 35%, nos termos da Lei Municipal 3.525⁄98, sob pena de multa diária de 100 salários mínimos, e, alternativamente – na impossibilidade de promover a referida regularização -, a responder em pecúnia.

Na primeira instância, o pedido foi julgado procedente (fls. 565⁄579), tendo sido acolhida, na r. sentença, a tese de que se tratava de loteamento disfarçado de condomínio horizontal e, assim, não foram observadas as exigências previstas na Lei 6.766⁄79 e na Lei Municipal 3.525⁄98.

Em sede de apelação, a Quinta Câmara de Direito Privado do c. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo deu provimento ao recurso para julgar improcedente o pedido formulado na ação civil pública, nos termos de acórdão assim ementado:

“1.) Apelação Cível – Ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público – Sentença de procedência

2.) Condomínio especial de casas – Lei 4591⁄64, artigo 8º, alíneas ‘a’, ‘c’ e ‘d’.

3.) Apelação plena (CPC, 515) – Admissão do pleito de assistência simples formulado por compromissada compradora – Reexame de todos os temas, inclusive os atinentes às questões prejudiciais – Rejeitado o pleito recursal de nulidade da sentença por argüição de inexistência de postulação de tutela declaratória quanto à nulidade do registro da incorporação.

4.) Interpretação do artigo 3º da Lei 7.347⁄85 – Polo passivo incompleto em razão da ausência de todos os adquirentes dos imóveis, dos credores hipotecários e da Municipalidade – Questão superada em decorrência do provimento recursal.

5.) Distinção entre propriedade vertical (CC, 623 e 628), propriedade horizontal (Lei 4591⁄64, 1º), condomínio especial horizontal de casas (Lei 4.591⁄64, 8º, ‘a’) e loteamento urbano (Lei 6.766⁄79).

6.) Condomínio especial aprovado desde 1992 – Incorporação do condomínio registrada previamente no Cartório de Registro de Imóveis local – Projeto de incorporação imobiliária previamente aprovado pela Municipalidade.

7.) Proteção constitucional (CF, 5º, XXII e XXI), 30, I, e VIII, 182, §§ 1º e 2º e 236), buscando a corporificação de uma forma de urbanização de propriedade privada.

8.) Incidência dos comandos dos artigos 115, 524, 526, 572, 623, 628, 859 e 1080 do Código Civil e artigos 1º e 252 da Lei 6015⁄73.

9.) Posicionamentos doutrinários a propósito do tema.

10.) Ausência de Ilegalidade no empreendimento imobiliário, pois, a Lei 4591⁄64 não prevê área mínima de construção para o condomínio de casas.

11.) Interesse urbanístico do Município preservado em face do princípio da legalidade (Lei 4591⁄64, art 32) e da autonomia municipal.

12.) Inaplicabilidade da Lei 6766⁄79.

13.) À unanimidade, admitida a apelação.

14.) Por maioria, vencido o I. Relator Sorteado, deram provimento ao recurso. Acórdão com o 3º Juiz.” (fl. 697, grifo nosso)

O referido acórdão foi mantido no julgamento dos embargos infringentes (fls. 770⁄774) pela colenda Corte estadual, conforme ementa a seguir transcrita:

“EMBARGOS INFRINGENTES – Ação civil pública proposta pelo Ministério Público – Pretensão de ver declarada a nulidade de ato registrário – Incorporação de empreendimento imobiliário – Acórdão que acolhe o apelo da incorporadora e julga improcedente a ação civil pública – irresignação – Alegação de que desrespeitada a Lei n° 6.766⁄79 – Descabimento – Lei n° 4.591⁄64 que não estipula a obrigatoriedade de observação de área mínima para construção de residências – Regularidade junto à Prefeitura Municipal – Mantido o entendimento da douta maioria – Embargos rejeitados.” (fl. 770)

Daí, o Ministério Público do Estado de São Paulo interpôs, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, o presente recurso especial, aduzindo, em suas razões recursais, violação aos arts. 1º, 3º, 8º, 28 e 29 da Lei 4.591⁄64, aos arts. 2º, § 1º, 4º, I, e § 1º, 6º, 7º, 9º, 12, 18, 19, 22, 43, parágrafo único, e 47 da Lei 6.766⁄79 e ao art. 32 da Lei Municipal 3.525⁄98.

Afirma, em síntese, que, embora “SANP AGROPECUÁRIA LTDA sinalizasse que incorporaria um condomínio especial horizontal de casas ao abrigo da Lei nº 4.591⁄64, portanto sinalizava empreender um condomínio deitado, tal direcionamento era apenas virtual, porque na realidade pretendia e na verdade empreendeu um loteamento, alienando lotes de terrenos e não casas, com o que infringiu as Leis Federais nºs 4.591⁄64 e 6.766⁄79, além da Lei Municipal nº 3.525⁄98” (fl. 786). Salienta, ademais, que a incorporadora não se responsabilizou pela construção das casas, o que descaracteriza a atividade de incorporação imobiliária e, assim, a intenção de formação de condomínio horizontal.

Aduz, ainda:

(…) a conclusão de que o empreendimento era um loteamento mascarado sob a forma de condomínio especial também é extraída da própria impossibilidade de se abrigar, em uma única unidade autônoma de 20,00 m2 (vinte metros quadrados), sala⁄quarto, cozinha e banheiro, como encontramos no memorial de especificação (art. 3º – fl. 107).

É óbvio que uma unidade autônoma tão pequena não abrigaria todos esses cômodos, nem uma família, e a empresa incorporadora, ao sinalizar a possibilidade de modificação do projeto, já indicava que o objeto principal da alienação era o terreno e a ampla possibilidade de se construir, típico loteamento de terrenos, burlando a Lei 4.591⁄64, que não admite a desvinculação do terreno e construção, e também a Lei Federal 6.766⁄79 e a Lei Municipal nº 3.525⁄98, as quais, ao tratarem de loteamento impõem regras restritivas que devem ser observadas pelos loteadores, o que não ocorreu no caso” (fl. 786)

Requer, ao final, o provimento do recurso especial para, restabelecendo a r. sentença que julgou procedente a ação civil pública, declarar nulo o registro de incorporação imobiliária, condenando os requeridos: (I) a regularizar o loteamento, no prazo de 120 dias, reservando áreas públicas no percentual previsto na Lei Municipal 3.525⁄98, sob pena de multa diária de 100 salários mínimos; e (II) na impossibilidade de promover a referida regularização, a responder em pecúnia.

Contrarrazões apresentadas às fls. 858⁄872, pugnando os ora recorridos pelo não conhecimento do recurso especial e, alternativamente, por seu desprovimento.

Admitido o recurso na origem, subiram os autos (fls. 875⁄878).

Instado a se manifestar, o d. órgão do Ministério Público Federal opinou, no parecer de fls. 893⁄896, pelo não conhecimento do recurso especial, sob o fundamento de que “o acórdão recorrido enfrentou a matéria de apelação com base nos fatos e nas provas da causa, carreadas aos autos. Rever o posicionamento do Tribunal a quo, no sentido de se examinar a natureza do empreendimento implantado, se condomínio especial horizontal ou simples loteamento, bem como se foram atendidas as especificidades técnicas de infra-estrutura, demandaria revolver as provas, o que é defeso sendo a Súmula n.º 07 dessa Corte“.

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO (Relator):

A controvérsia dos autos cinge-se à verificação, no caso concreto, de o empreendimento imobiliário denominado “Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá” – localizado no Município de Indaiatuba, no Estado de São Paulo – configurar condomínio especial horizontal de casas, regido pela Lei 4.591⁄64, ou loteamento urbano, disciplinado pela Lei 6.766⁄79. E, a partir dessa aferição, analisar a viabilidade do pedido, formulado pelo Parquet estadual, de declaração de nulidade de registro de incorporação imobiliária do referido empreendimento, por haver burlado as normas do sistema de parcelamento do solo urbano.

Cabe, então, de início, distinguir as duas espécies de empreendimentos.

De um lado, o PARCELAMENTO DO SOLO URBANO, do qual resultam lotes, é regido pela Lei 6.766⁄79, subdividindo-se nas seguintes espécies: (a) loteamento que consiste na subdivisão de glebas em lotes, destinando-se à edificação, com abertura de ruas, vielas ou outros logradouros públicos (§ 1º do art. 2º da Lei 6.766⁄79); (b) desdobramento que consiste na subdivisão de glebas em lotes, destinando-se à edificação, mas com aproveitamento da malha viária e dos equipamentos públicos já existentes (§ 2º do art. 2º da Lei 6.766⁄79); (c) desdobro – subdivisão de lotes em lotes – que não têm previsão na mencionada Lei 6.766⁄79, mas em leis municipais.

Convém transcrever o referido art. 2º da Lei 6.766⁄79:

“Art. 2º – O parcelamento do solo urbano poderá ser feito mediante loteamento ou desmembramento, observadas as disposições desta Lei e as das legislações estaduais e municipais pertinentes.

§ 1º – Considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes.

§ 2º – Considera-se desmembramento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem no prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes.

§ 3º (VETADO)

§ 4º Considera-se lote o terreno servido de infra-estrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos pelo plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe.

§ 5º Consideram-se infra-estrutura básica os equipamentos urbanos de escoamento das águas pluviais, iluminação pública, redes de esgoto sanitário e abastecimento de água potável, e de energia elétrica pública e domiciliar e as vias de circulação pavimentadas ou não.

§ 6º A infra-estrutura básica dos parcelamentos situados nas zonas habitacionais declaradas por lei como de interesse social (ZHIS) consistirá, no mínimo, de:

I – vias de circulação;

II – escoamento das águas pluviais;

III – rede para o abastecimento de água potável;

IV – soluções para o esgotamento sanitário e para a energia elétrica domiciliar.” (grifo nosso)

Nesse contexto, tanto os loteamentos como os desdobramentos pressupõem a subdivisão de glebas em lotes com destinação à edificação. A finalidade habitacional é pressuposto essencial ao parcelamento do solo urbano. Não o é, entretanto, a construção ou o projeto de construção propriamente dito. Basta que a divisão das glebas em lotes tenha a finalidade habitacional para a caracterização do parcelamento do solo urbano.

Uma das modalidades de loteamento, além do comum, é o fechado. Nas palavras de Luiz Antônio Scavone Junior, o “loteamento fechado nada mais é que o resultado da subdivisão de uma gleba em lotes destinados à edificação, com abertura de novas vias de circulação e de logradouros púbicos, cujo perímetro da gleba original, ao final, é cercado ou murado de modo a manter aceso controlado. Nesse caso, os proprietários, mediante regulamento averbado junto à matrícula do loteamento, são obrigados a contribuir para as despesas decorrentes da manutenção e conservação dos espaços e equipamentos públicos que passam ao uso exclusivo por contrato administrativo de concessão entre o Município e uma associação criada para esse fim” (Direito Imobiliário. Teoria e Prática. 3ª ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 111).

O loteamento fechado, no entanto, não tem disciplina específica na Lei 6.766⁄79, mas pode ser tratado, no que couber, segundo as regras do loteamento comum.

De outro lado, os CONDOMÍNIOS HORIZONTAIS têm regramento na Lei 4.591⁄64, a qual estabelece que, para sua caracterização, é necessária a existência de edificações construídas ou em construção (art. 1º) ou, ao menos, de plano para sua construção, aprovado pela autoridade administrativa competente (art. 8º), não bastando apenas a existência de terrenos meramente destinados à habitação, como ocorre com os loteamentos ou desdobramentos de que trata a Lei 6.766⁄79. Eis os dispositivos da referida lei, cuja transcrição é útil ao deslinde da controvérsia:

“Art. 1º As edificações ou conjuntos de edificações, de um ou mais pavimentos, construídos sob a forma de unidades isoladas entre si, destinadas a fins residenciais ou não-residenciais, poderão ser alienados, no todo ou em parte, objetivamente considerados, e constituirá, cada unidade, propriedade autônoma sujeita às limitações desta Lei.

§ 1º Cada unidade será assinalada por designação especial, numérica ou alfabética, para efeitos de identificação e discriminação.

§ 2º A cada unidade caberá, como parte inseparável, uma fração ideal do terreno e coisas comuns, expressa sob forma decimal ou ordinária

(…)

Art. 7º O condomínio por unidades autônomas instituir-se-á por ato entre vivos ou por testamento, com inscrição obrigatória no Registro de Imóvel, dele constando; a individualização de cada unidade, sua identificação e discriminação, bem como a fração ideal sobre o terreno e partes comuns, atribuída a cada unidade, dispensando-se a descrição interna da unidade.

Art. 8º Quando, em terreno onde não houver edificação, o proprietário, o promitente comprador, o cessionário deste ou o promitente cessionário sobre ele desejar erigir mais de uma edificação, observar-se-á também o seguinte:

a) em relação às unidades autônomas que se constituírem em casas térreas ou assobradadas, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação e também aquela eventualmente reservada como de utilização exclusiva dessas casas, como jardim e quintal, bem assim a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá às unidades;

b) em relação às unidades autônomas que constituírem edifícios de dois ou mais pavimentos, será discriminada a parte do terreno ocupada pela edificação, aquela que eventualmente for reservada como de utilização exclusiva, correspondente às unidades do edifício, e ainda a fração ideal do todo do terreno e de partes comuns, que corresponderá a cada uma das unidades;

c) serão discriminadas as partes do total do terreno que poderão ser utilizadas em comum pelos titulares de direito sobre os vários tipos de unidades autônomas;

d) serão discriminadas as áreas que se constituírem em passagem comum para as vias públicas ou para as unidades entre si.” (grifo nosso)

Como visto, nos termos da Lei 4.591⁄64, os condomínios horizontais pressupõem a existência de edificações. O art. 8º desse diploma legal, embora admita a possibilidade de condomínio em terreno onde não haja edificação, exige, ao menos, a existência de plano para a construção delas. Há, nesse caso, necessidade de aprovação de um projeto de construção de casas térreas ou assobradadas ou de edifícios, ainda que não sejam edificados de imediato.

Portanto, a conclusão inafastável é de que a mencionada Lei 4.591⁄64 não admite o condomínio sem vinculação à edificação, à construção. Não basta, assim, a mera destinação do empreendimento à edificação, conforme ocorre no loteamento ou desmembramento (Lei 6.766⁄79).

Com base nessas considerações, pode-se inferir que o loteamento, disciplinado pela Lei 6.766⁄79, difere-se do condomínio horizontal de casas, regulado pela Lei 4.591⁄64 (art. 8º). E a diferença fundamental entre o loteamento (inclusive o fechado) e o condomínio horizontal de casas consubstancia-se no fato de que, no primeiro, há mero intuito de edificação (finalidade habitacional), sem que, para tanto, haja sequer plano aprovado de construção. No segundo, no entanto, se ainda não houver a edificação pronta ou em construção, deve, ao menos, existir aprovação de um projeto de construção.

A respeito do tema, a lição de Luiz Antônio Scavone Junior, in verbis:

“Não se pode negar a existência de condomínio de casas, as chamadas ‘vilas’, que encontram sustentáculo nos arts. 8º e 68 da Lei 4.591⁄64, e que também se tem chamado de condomínio horizontal ou fechado.

Entretanto, trata-se de instituto completamente diverso do loteamento e do desdobramento, regulados pela Lei 6.766⁄1979.

A atividade de parcelar o solo urbano, de acordo com a definição do ato trazida à colação pelo art. 2º da Lei 6.766⁄1979 deve, necessariamente, submeter-se às normas desta Lei.

Essa atividade, caracterizada pelo ato de subdividir uma gleba em lotes destinados à edificação, jamais pode ser confundida com a de incorporar e construir estabelecida pela Lei 4.591⁄1964.

Ora, o art. 28 da Lei 4.591⁄64 determina que é considerada incorporação imobiliária a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas.

Da atividade de parcelar o solo não surge a necessidade de edificar, mas, tão somente, a finalidade de edificação, inferência que se extrai do termo “destinação à edificação’ contido nos parágrafos do art. 2º da Lei 6.766⁄1979.

(…)

De fato, algumas semelhanças existem entre o loteamento fechado e o condomínio deitado, o que explicam, em parte, a confusão operada: perímetro de ambos os empreendimentos é cercado e o acesso ao interior controlado; ambos há comunhão de uso das vias internas e espaços livres; e, nos dois tipos de empreendimento há a necessária aprovação pela Prefeitura Municipal.

Entretanto, as semelhanças param por aí, começando as diferenças determinantes:

I – Regulamentação da via interna. No condomínio deitado ou horizontal, a vida interna é regulada pela Convenção nos moldes do art. 9º e seguintes da Lei 4.591⁄1964, enquanto que no loteamento fechado deve ser observado o regulamento de uso, que apenas subsidiariamente utiliza os ditames da Lei 4.591⁄1964.

II – Objeto. No condomínio deitado ou horizontal o objeto é uma casa térrea ou assobradada – unidade autônoma – bem como fração ideal dos espaços livres, enquanto que no loteamento fechado é um lote de terreno, sem construção.

III – Espaços livres internos e vias de circulação. No condomínio deitado, as vias de circulação e os espaços internos, que não compõem a unidade autônoma são frações ideais de uso comum e propriedade dos condôminos. No loteamento fechado, por força do art. 22 da lei 6.766⁄1979, os espaços internos e vias de circulação são bens públicos, apenas concedidos por ato administrativo ao uso exclusivo dos proprietários de lotes, podendo tal ato ser revogado.

IV – Registro. O condomínio deitado submete-se aos trâmites da Lei 4.592⁄1964, inclusive, às vezes, com prévio registro da incorporação, enquanto que o loteamento fechado submete-se ao disposto na Lei 6.766⁄1979, especificamente no seu art. 18.” (Direito Imobiliário. Teoria e Prática. 3ª ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: Forense, 2011, pp. 122-123, grifo nosso)

Na hipótese dos autos, a colenda Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – com base na análise do projeto de implantação de condomínio de casas previamente aprovado pela Municipalidade, do memorial descritivo das especificações da obra, do ato de incorporação do condomínio registrado no Cartório de Registro de Imóveis, bem como dos contratos de compra e venda entabulados entre os adquirentes das unidades autônomas e a incorporadora -, concluiu que se tratava de verdadeiro condomínio horizontal de casas e de incorporação imobiliária, e não de mero loteamento fechado. Entendeu, nesse contexto, que foram cumpridos os requisitos previstos na Lei 4.591⁄64. Além disso, que não houve a alegada burla ao regramento cogente da Lei 6.766⁄79, uma vez que não ficou comprovada nenhuma intenção da incorporadora no sentido de vender unicamente lotes de terreno.

Eis alguns tópicos delineados pela c. Corte de origem, no julgamento da apelação, que aqui se revelam importantes citar (fls. 699⁄713):

I – “De pronto, inafastável acentuar que (a) a incorporação do condomínio especial em questão foi registrada no Cartório Imobiliário local em 08⁄07⁄93; (b) antes, em 24⁄12⁄92, o projeto de incorporação imobiliária obteve a aprovação da Municipalidade, acolhendo parecer favorável da sua Secretaria dos Negócios Jurídicos.”

II – “Não há dúvida nos autos que a apelante incorporadora, titulada na propriedade de área de terreno, decidiu sobre ela implantar um condomínio de casas nos moldes das alíneas ‘a’, ‘c’ e ‘d’ do art. 8º da Lei 4.591⁄64.”

III – “Não se deu, como apregoado pelo apelado e acolhido na sentença, a ocorrência de vícios na proposta de comercialização encorpada pelo memorial da incorporação e documentos que o instruíram.”

IV – “Deve-se ter presente, também, que, ao contrário dos edifícios de apartamentos ou de conjuntos comerciais, nos condomínios de casas a fração ideal, que compõe coeficiente estipulado pelos condôminos para, numa espécie de quinhão, permitir a proporcionalização do custeio da construção e do uso das coisas de uso comum e fim proveitoso do Condomínio, pode se realizar: (a) proporcionalmente ao valor da unidade imobiliária, ao qual se calcula em relação ao conjunto da edificação, critério que serve tanto para os condomínios de casas, quanto para os condomínios de apartamentos, de resto forma preceituada pelo § 3º do art. 1331 do Novo Código Civil brasileiro; (b) na proporção da área do terreno determinada como exclusiva de cada unidade autônoma (jardim + quintal + área ocupada pela edificação), critério que não se presta para os edifícios de apartamentos⁄conjuntos comerciais, pois a área ocupada pela edificação é a do conjunto (= edifício).

Vale notar que a fração ideal legitimamente indicada no memorial de incorporação do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’ é aquela nos moldes previstos na alínea ‘b’ retro, de resto aceita pelos condôminos adquirentes de frações ideais e compromisso de construção das unidades a elas vinculadas via adesão à proposta contida no memorial de incorporação.(grifo nosso)

V – “Não há potestatividade (CC, 115) no memorial de incorporação do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’ no concernente às regras para a construção de casas no espaço exclusivo de suas unidades autônomas.

A proposta contida no memorial de incorporação, ofertada publicamente ao mercado através do seu registro no Ofício Imobiliário competente, determinava que as casas tivessem 20 m2, assegurando-se aos condôminos aderentes o direito de postular a aprovação de projeto substitutivo junto à Municipalidade de Indaiatuba.

Essa condição não descaracterizou esta espécie de incorporação, mas permitiu ao Município que, no exercício do controle edilício, pudesse, a qualquer tempo, fazer cumprir a legislação vigente destinada a proteger o padrão urbanístico por ela determinado.”

VI -“Os apelantes comprovam nos autos também que o terreno onde se acha implantado o ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’ não mais pertence à apelante incorporadora, mas titulado aos condôminos aderentes da incorporação que, ainda mais, aprovaram na Municipalidade de Indaiatuba e efetivaram a construção de residências em suas unidades autônomas.

Ora, são legítimos para pretender a nulidade do registro de eventual incorporação, por vício de forma, só aqueles que a tenham aderido, ou seja, os condôminos, pois, no interesse deles é que a lei determinou essa espécie de publicidade.

Não há, no entanto, qualquer intervenção de condôminos impugnando os termos da proposta que aderiram, corporificada no memorial de incorporação e publicizada através de seu registro no Ofício Imobiliário competente, sendo certo, ainda, que, o único deles que interviu no feito na condição de Assistente (fls. 646⁄647 dos autos), ‘… postula pelo provimento do recurso de apelação, porque lhe interessa a manutenção do empreendimento como condomínio (Lei 4.591⁄64) … uma vez que adquiriu para viverem segurança e qualidade de vida, benefícios esses advindos da proposta da incorporadora, o que também ocorreu com dezenas de outros adquirentes que já residem no local .’ (textual)”

VII“Enfim, não ficou constatada ilegalidade no empreendimento telado, pois a Lei 4591⁄64 não estipula a obrigatoriedade de observação de área mínima de construção para o condomínio de casas.

De outra parte, não há vedação para que o condômino promova o aumento de área construída, desde que respeite a convenção condominial e obtenha a aprovação municipal e dos demais condôminos, acautelando-se, ainda, para que não haja aumento da área do terreno.”

Citem-se, ainda, os fundamentos da c. Corte estadual no julgamento dos embargos infringentes:

“Não se ignora que os atos registrados estão sujeitos às possíveis irregularidades e de tal monta que podem levar à declaração de nulidade. O caso presente, todavia, não faz levar a este resultado.

Toda uma série de providências foram tomadas e levadas a efeito junto à Municipalidade de Indaiatuba, que aprovou a incorporação, vale dizer, seus projetos, não vendo neles irregularidades. Também o Registro de Imóveis ao proceder o registro cabível não oficiou no sentido de sua recusa, por irregularidades.

Aliás, a questão de fato, ou seja, a intenção das partes em burlar a lei e formar loteamento sob a capa de condomínio, que parece indispensável ao sucesso da ação, não se mostra de todo comprovada nos autos.

Apenas por constar no projeto algo que a lei não proíbe, isto é, área mínima de construção, não se pode deduzir burla; até porque a possibilidade de modificação do projeto se fazia possível pelos interessados e pelo que se percebe dos autos assim aconteceu.

Ora, a prática defende o direito do uso da propriedade, quando o proprietário faz dela uso respaldado pelo Poder Público competente. No caso, a evidência da aprovação dos projetos modificativos.

Outrossim, se ocorria nas modificações do projeto original, por cada um dos proprietários, lesão ao plano urbanístico da cidade de Indaiatuba, cabia ao Poder Público competente fiscalizar e impedir possíveis abusos. Aprovando as modificações e não obstando as construções que agora estariam sendo apontadas como irregulares, apenas respalda a regularidade que se propõe.

Parece demasiado entender que as pessoas que agiram na conformidade da lei e obtiveram apoio legal para suas pretensões, possam, agora, em procedimento do qual não participaram, ver seus direitos de propriedade e outros dela decorrentes, ou do uso das propriedades afastados em nome de um interesse sempre acobertado em outras esferas.” (fls. 773⁄774, grifo nosso)

Em resumo, o colendo Tribunal de Justiça estadual concluiu que:

(I) o empreendimento realizado pelos recorridos vincula as unidades autônomas do terreno a edificações, caracterizando-se como condomínio horizontal de casas;

(II) está configurada hipótese de incorporação imobiliária;

(III) foram cumpridos os requisitos previstos na Lei 4.591⁄64 para fins de formação de condomínio horizontal de casas. Tanto foi assim que os “documentos juntados aos autos permitem verificar que foi devidamente processada e fundamentada a aprovação do referido projeto pela Municipalidade de Indaiatuba, conforme se pode extrair dos judiciosos pareceres de fls. 258⁄259, 260⁄268 e 269 dos autos” (fl. 702);

(IV) não houve comprovação de intenção da incorporadora de burlar o sistema de loteamento fechado. A tese do recorrente de que teria ocorrido mera alienação de lotes de terrenos, ao invés da incorporação de um condomínio especial horizontal de casas, também não ficou evidenciada.

Diante dessas conclusões da colenda Corte local, delineadas com base no acervo fático-probatório dos autos e nas cláusulas dos ajustes celebrados entre as partes, não há outra solução senão, na via estreita do recurso especial, adotar o suporte fático delineado nas instâncias ordinárias, tendo em vista os óbices previstos nos enunciados n.º 5 e 7 da Súmula do eg. STJ, para, então, concluir pela lisura do ato de incorporação imobiliária de empreendimento denominado “Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá”, registrado no Cartório de Imóveis e aprovado pela Municipalidade.

Ademais, o fato de a incorporadora não ficar responsável pela edificação direta das casas do condomínio não caracteriza ofensa aos dispositivos legais invocados no especial. Ao contrário, a Lei 4.591⁄64 expressamente prevê essa possibilidade, conforme dispositivos a seguir transcritos:

“Art. 28. As incorporações imobiliárias, em todo o território nacional, reger-se-ão pela presente Lei.

Parágrafo único. Para efeito desta Lei, considera-se incorporação imobiliária a atividade exercida com o intuito de promover e realizar a construção, para alienação total ou parcial, de edificações ou conjunto de edificações compostas de unidades autônomas,

Art. 29. Considera-se incorporador a pessoa física ou jurídica, comerciante ou não, que embora não efetuando a construção, compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações a unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial, ou que meramente aceite propostas para efetivação de tais transações, coordenando e levando a termo a incorporação e responsabilizando-se, conforme o caso, pela entrega, a certo prazo, preço e determinadas condições, das obras concluídas.

Parágrafo único. Presume-se a vinculação entre a alienação das frações do terreno e o negócio de construção, se, ao ser contratada a venda, ou promessa de venda ou de cessão das frações de terreno, já houver sido aprovado e estiver em vigor, ou pender de aprovação de autoridade administrativa, o respectivo projeto de construção, respondendo o alienante como incorporador. (grifo nosso)

A interpretação a ser dada ao mencionado art. 29 da Lei 4.591⁄64 é no sentido de que o incorporador, quando não for também construtor, pode escolher tão somente alienar as frações ideais, sem se compromissar com a execução direta da construção do empreendimento incorporado, de modo que esta poderá ser contratada, em separado, pela incorporadora ou pelos adquirentes do imóvel, com terceiro – o construtor. Nessas hipóteses, para que fique caracterizada a vinculação entre a alienação das frações do terreno e o negócio de construção, basta que o incorporador, no ato de incorporação, providencie, perante a autoridade administrativa competente, a aprovação de projeto de construção.

Com efeito, o contrato de incorporação imobiliária não deve incluir, obrigatoriamente, a construção dos imóveis diretamente pela incorporadora. O ato de incorporação é diverso do ato de construção, embora se vinculem.

A doutrina, ao analisar a definição legal de incorporação imobiliária, salienta, in verbis:

“O texto legal fornece elementos para a caracterização da atividade de incorporação, permitindo conceituá-la como a atividade como a atividade de coordenação e consecução de empreendimento imobiliário, compreendendo a alienação de unidades imobiliárias em construção e sua entrega aos adquirentes, depois de concluídas, com a adequada regularização no Registro de Imóveis competente (art. 44).

Traço característico dessa atividade é a ‘venda antecipada de apartamentos de um edifício a construir’, que, do ponto de vista econômico e financeiro, constitui o meio pelo qual o incorporador promove a captação dos recursos necessários à consecução da incorporação; a captação de recursos, observam Orlando Gomes e Maria Helena Diniz, é a operação que ‘consiste em obter capital necessário à construção do edifício, mediante venda, por antecipação, dos apartamentos de que se construirá.’

A atividade de construção está presente no negócio jurídico da incorporação, mas incorporação e construção não se confundem, nem são noções equivalentes. A atividade da construção só integrará o conceito de incorporação se estiver articulada com a alienação de frações ideais do terreno e acessões que elas haverão de se vincular; mas, independente disso, a atividade de incorporação pode, alternativamente, ser representada somente pela alienação de frações ideais objetivando sua vinculação a futuras unidades imobiliárias. Obviamente, a incorporação compreende a construção, mas não é necessário que a atividade da construção seja exercida pelo próprio incorporador, pois este pode atribuir a outrem a construção.

(…)

Qualquer que seja a roupagem de que se revista, a incorporação tem como elemento central a figura de um incorporador, que é o formulador da ideia da edificação, o planejador do negócio, o responsável pela mobilização dos recurso necessários à produção e comercialização de unidades imobiliárias integrantes de edificações coletivas, bem como pela sua regularização no registro de Imóveis, depois de prontas.

O incorporador pode exercer uma ou todas as funções relacionadas à atividade, como são os casos da atividade de construção e de corretagem, mas para que fique caracterizada sua função de incorporador basta que, antes da conclusão da construção, efetive a venda de frações ideais de terreno vinculadas a futuras unidades imobiliárias que integrarão um conjunto dessas unidades, em edificação coletiva.

A atividade da incorporação tem natureza empresarial, pois a finalidade de lucro é da sua essência, pouco importando seja o incorporador pessoa física ou jurídica.” (CHALHUB, Melhim Namem. Da Incorporação Imobiliária, 3ª ed., rev. e atual., Rio de Janeiro: Revonar, 2010, pp. 11-12, grifo nosso)

“No art. 29, outras situações ressaltam aos olhos e devem ser comentadas para que não paire nenhum dúvida sobre os contratos que foram, inclusive, tipificados pela Lei n. 4.591⁄64. Trata-se do contrato de incorporação, já referido, e do contrato de construção, o qual será analisado. O legislador destacou: ‘(…) embora não efetuando a construção (…)’.

Na verdade, não é condição também para que se tenha a figura do incorporador que ele próprio seja o construtor. Pode até ser, como é mais habitual hoje em dia, ou seja, há as figuras das ‘construtoras e incorporadoras’.

Mais uma vez, recorre-se às palavras de Caio Mário da Silva Pereira sobre o assunto, para que se possam esclarecer os pontos obscuros. O professor destaca que o incorporador pode ser o próprio dono do terreno, que pretende promover a construção, pode ser um condômino ou um titular de direito de opção, ou até um simples especulador. Pode também ser o próprio construtor. É possível também que o incorporador adquira o terreno e contrate um construtor. O incorporador pode negociar, com o dono do terreno, a troca do terreno por área construída e contratar um construtor para a realização da obra. O incorporador pode ser, igualmente, um estabelecimento de crédito que financia a edificação. Os próprios adquirentes do terreno podem pagar todo o preço da obra no decorrer da construção ou financiar uma parte com o incorporador.

Vê-se, de forma clara, que não é necessário que o incorporador realize diretamente a construção do prédio, daí a alusão feita pelo art. 29 da LCI. Da mesma sorte, deve ficar patente que o incorporador não é necessariamente o proprietário do terreno sobre o qual sera erguida a edificação (art. 30, 1ª parte).

Everaldo Augusto Cambler é cristalino na sua explicação sobre o tema aqui focalizado. Para ele, não se pode confundir a noção de ‘promoção da incorporação’, que compete indiscutivelmente ao incorporador, com a noção de ‘construção do imóvel incorporado’.

O incorporador pode até realizar a construção, mas não é essa atividade que vai caracterizá-lo como incorporador.

O art. 29 refere, na sequência, que o incorporador é a pessoa que compromisse ou efetive a venda de frações ideais de terreno objetivando a vinculação de tais frações às unidades autônomas, em edificações a serem construídas ou em construção sob regime condominial. Infere-se daí que, necessariamente, o objeto da incorporação é coisa futura, ou seja, só se tem incorporação se a edificação é ainda projeto a ser erguido ou se estiver em construção, de modo que seja estiver pronta, vale dizer, após a expedição do ‘habite-se’ não se estará diante de uma incorporação, mas sim de uma compra e venda de unidades autônomas (art. 30, parte final). Além disso, o incorporador poderá celebrar contrato de promessa de compra e venda da unidade ou efetivar a venda, ainda que seja só projeto ou esteja em construção.

Não se pode olvidar, nesse sentido, que se a unidade autônoma ainda não está pronta, o incorporador só poderá negociar a fração ideal do terreno vinculada a unidade condominial autônoma futura.” (BRITO, Rodrigo Azevedo Toscano de. Incorporação imobiliária à luz do CDC. São Paulo: Saraiva, 2002, pp. 182-183, grifo nosso)

Infere-se, portanto, que o ato de incorporação não pressupõe, necessariamente, que a incorporadora responsabilize-se diretamente pela construção. Há casos em que a incorporadora é também construtora e, assim, além de promover a incorporação, executa, ela própria, a obra projetada, vendendo as unidades autônomas por preço global, compreendendo as cotas de terreno e de construção do imóvel (Lei 4.591⁄64, art. 41). Há casos, porém, que o incorporador, por não ser também construtor, celebra com o adquirente da fração ideal apenas contrato de compra e venda, ficando o contrato de construção separado, cuja celebração poderá ser estabelecida entre o construtor e o incorporador ou entre aquele e os adquirentes do empreendimento. Nesses casos, haverá um contrato de incorporação imobiliária separado, mas vinculado a um contrato de construção, na modalidade empreitada (Lei 4.591⁄64, art. 55) ou administração – preço de custo (Lei 4.591⁄64, art. 58).

O art. 48 da Lei 4.591⁄64 bem explicita a questão, delineando que a construção do imóvel poderá estar incluída no contrato de incorporação ou ser contratada, em separado, sob o regime de empreitada ou de administração, seja por meio de ajuste celebrado entre a construtora e a incorporadora ou entre aquela e os adquirentes do empreendimento.

Eis o teor das normas citadas:

“Art. 41. Quando as unidades imobiliárias forem contratadas pelo incorporador por preço global compreendendo quota de terreno e construção, inclusive com parte de pagamento após a entrega da unidade, discriminar-se-ão, no contrato, o preço da quota de terreno e o da construção.

§ 1º Poder-se-á estipular que, na hipótese de o adquirente atrasar o pagamento de parcela relativa a construção, os efeitos da mora recairão não apenas sobre a aquisição da parte construída, mas, também, sobre a fração ideal de terreno, ainda que esta tenha sido totalmente paga.

§ 2º Poder-se-á também estipular que, na hipótese de o adquirente atrasar o pagamento da parcela relativa à fração ideal de terreno, os efeitos da mora recairão não apenas sobre a aquisição da fração ideal, mas, também, sobre a parte construída, ainda que totalmente paga.”

“Art. 48. A construção de imóveis, objeto de incorporação nos moldes previstos nesta Lei poderá ser contratada sob o regime de empreitada ou de administração conforme adiante definidos e poderá estar incluída no contrato com o incorporador, ou ser contratada diretamente entre os adquirentes e o construtor.

§ 1º O Projeto e o memorial descritivo das edificações farão parte integrante e complementar do contrato;

§ 2º Do contrato deverá constar a prazo da entrega das obras e as condições e formas de sua eventual prorrogação.”

“Art. 55. Nas incorporações em que a construção seja feita pelo regime de empreitada, esta poderá ser a preço fixo, ou a preço reajustável por índices previamente determinados.

§ 1º Na empreitada a preço fixo, o preço da construção será irreajustável, independentemente das variações que sofrer o custo efetivo das obras e qualquer que sejam suas causas.

§ 2º Na empreitada a preço reajustável, o preço fixado no contrato será reajustado na forma e nas épocas nele expressamente previstas, em função da variação dos índices adotados, também previstos obrigatoriamente no contrato.

§ 3º Nos contratos de construção por empreitada, a Comissão de Representantes fiscalizará o andamento da obra e a obediência ao Projeto e às especificações exercendo as demais obrigações inerentes à sua função representativa dos contratantes e fiscalizadora da construção.

§ 4º Nos contratos de construção fixados sob regime de empreitada, reajustável, a Comissão de Representantes fiscalizará, também, o cálculo do reajustamento.

§ 5º No Contrato deverá ser mencionado o montante do orçamento atualizado da obra, calculado de acordo com as normas do inciso III, do art. 53, com base nos custos unitários referidos no art. 54, quando o preço estipulado for inferior ao mesmo.

§ 6º Na forma de expressa referência, os contratos de empreitada entendem-se como sendo a preço fixo.”

“Art. 58. Nas incorporações em que a construção for contratada pelo regime de administração, também chamado ‘a preço de custo’, será de responsabilidade dos proprietários ou adquirentes o pagamento do custo integral de obra, observadas as seguintes disposições:

I – todas as faturas, duplicatas, recibos e quaisquer documentos referentes às transações ou aquisições para construção, serão emitidos em nome do condomínio dos contratantes da construção;

II – todas as contribuições dos condôminos para qualquer fim relacionado com a construção serão depositadas em contas abertas em nome do condomínio dos contratantes em estabelecimentos bancários, as quais, serão movimentadas pela forma que for fixada no contrato.”

A respeito do tema, Pedro Elias Avvad leciona:

Se o incorporador não for, ele próprio, construtor ou, melhor dizendo, se a incorporação não estiver sendo realizada por uma empresa construtora, nesse caso tem de existir um contrato de construção que, segundo dispõe o art. 48 da Lei nº 4.591, de 1964, poderá ser pelo regime de ‘empreitada’ ou por ‘administração’ e poderá ser contratada, pelo incorporador, ou diretamente entre os adquirentes e a construtora.

A ressalva inicial tem seu fundamento no fato de que o contrato de construção não é peça fundamental da incorporação, já que não se inclui entre os documentos necessários ao arquivamento do memorial e poderá não existir quando uma empresa construtora, além de promover a incorporação e executar, ela própria, a obra projetada, decide vender as unidades na forma do art. 41, isto é, por preço global, compreendendo a cota de terreno e a construção.

Na hipótese acima, não haverá um contrato formal de construção, que deixa de ser elemento específico da incorporação, já que o contrato existirá de forma acessória ou tácita. O mesmo ocorre quando o incorporador contrata a construção com terceiros, mas procede as alienações por prego global, hipótese esta que, como a anterior, será apreciada no título subseqüente.

Deve-se, ainda, destacar que as duas modalidades de contrato de construção previstas na lei podem ser ajustadas pela construtora escolhida pelo incorporador, diretamente com os adquirentes ou, então, celebrado entre a construtora e o próprio incorporador, nesse caso, com ou sem sub-rogação aos compradores de unidades.

Os contratos deverão conter, e⁄ou especificar, todos os elementos técnicos constantes do memorial de incorporação e subordinar a construção ao projeto aprovado, memorial descritivo, especificações, prazo de entrega, de preferência das diversas etapas e o prazo final, fixando-se; ainda, as hipóteses de prorrogação e suspensão do prazo, o preço, as condições de pagamento, as penalidades e multas, bem assim as condições especiais acaso acertadas.

A lei prevê, também, nessa parte geral que, no contrato de construção, celebrado com os adquirentes, ou a estes sub-rogado no momento da venda, se preveja a formação de um ‘condomínio construção’, com a realização de assembléias, modo de convocação e forma de instalação e funcionamento, registro das atas no Cartório de Títulos e Documentos e a constituição de Comissão de Representantes com as respectivas atribuições e prazo dos respectivos mandatos.

Finalmente, diz a lei, o contrato deve estabelecer de quem será a responsabilidade pelo pagamento das despesas com ligações de serviços públicos, nem sempre previsíveis ao início da construção, como às relativas a instalação do condomínio, decoração de portaria e mobiliário, que devem atender as deliberações dos compradores e possibilidades da maioria. Com esse dispositivo, o legislador liberou o incorporador da obrigatoriedade de incluir tais despesas no custo geral da obra, possibilitando, com isso, a cobrança de tais despesas, destacadamente do preço da construção, mediante rateio entre todas as unidades na proporção que for convencionada no contrato.” (Direito Imobiliário. Teoria Geral e Negócios Imobiliários. 2ª ed., rev. e ampl., Rio de Janeiro: Renovar, 2009, pp. 627-628, grifo nosso)

No caso em apreço, consoante se dessume dos v. acórdãos proferidos pela colenda Corte local, a incorporadora apenas celebrou contrato de compra e venda de frações ideais, vinculando-o a projeto de construção aprovado pela Municipalidade, não ficando ela própria responsável pela construção das casas no condomínio. A incorporadora, autorizada pela Lei 4.591⁄64, providenciou a aprovação de projeto de construção perante a Administração Municipal e o incluiu no Memorial de Incorporação, levado a Registro no Cartório Imobiliário. No contrato celebrado com os adquirentes do imóvel, ficou firmada a responsabilidade destes em providenciar a obra em conjunto com a construtora.

Esclarecedor é o trecho do v. aresto proferido em apelação:

“26. A apelante incorporadora, na proposta pública consubstanciada pelo registro do memorial de incorporação, compromissou-se pela alienação das frações ideais de terreno, pela implantação da infra-estrutura condominial e vinculou ditas frações ideais às unidades autônomas do ‘Condomínio Residencial Víllage Terras de Indaiá’, que também foram distinguidas no memorial da incorporação.

É verdade que a apelante incorporadora não se comprometeu a construir as residências em espaço próprio a elas reservado em cada unidade autônoma, nem poderia fazê-lo por lhe faltar habilitação técnica para tanto.

Supõe dizer que a infra-estrutura relativa às coisas de uso comum e fim proveitoso do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’ e das respectivas unidades autônomas foi mandada realizar pela própria apelante incorporadora, em regime de incorporação ‘a prazo e preços certos’ (Lei 4.591⁄64, 41 e 43).

27. Já a construção das residências (parte interna das unidades autônomas) foi assumida pelos próprios condôminos, cada um respondendo pela construção e custeio de sua casa, dadas as singularidades que os condomínios de casas (art. 8º, alíneas ‘a’, ‘c’ e ‘d’, da Lei 4.591⁄64) apresentam em relação aos condomínios de apartamentos, embora em ambos suas unidades sejam detidas em regime de ‘propriedade horizontal’ ou ‘por unidades autônomas’.

28. A assunção pelos condôminos da obrigação de construir as residências configura a adoção do chamado regime de ‘administração’ ou ‘a preço de custo’ para edificação dessas casas (Lei 4.591⁄64, 58 a 62).” (fls. 705⁄706)

Ressalte-se, por oportuno, que, como se vê, a aprovação, pela Municipalidade, do plano de construção foi alcançada, conforme exigência do parágrafo único do art. 29 da Lei 4.591⁄64, sem que houvesse nenhuma impugnação judicial do respectivo processo administrativo ou do alvará que autorizou a implantação do empreendimento. Este, aliás, não é o ato atacado na ação civil pública que deu origem ao presente recurso especial.

Veja-se trecho do v. acórdão em apelação cível que bem delineia essa afirmação:

“14. A implantação do condomínio de casas exigia, nos moldes das normas constitucionais e infra-constitucionais, a aprovação do respectivo projeto pela Municipalidade de Indaiatuba seja em função do já citado art. 182, especialmente seu ‘caput’ e §§ 1º e 2º, da CF, seja em razão de que ‘… Compete aos Municípios … I – legislar sobre assuntos de interesse local; … VIII – promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano;..’ – textual – (CF, 30, I e VIII).

15. Mandou, então, a proprietária elaborar os projetos através do eng° civil Oscar A. Beseggio, CREA 53.555⁄D-SP (fls. 255⁄256 dos autos), que confeccionou, ademais, o memorial descritivo das especificações da obra (fls. 252⁄254 dos autos), levando ao crivo dos órgãos competentes do Município de Indaiatuba.

A pretendida ‘… defesa do regular padrão de desenvolvimento urbano, que motiva a propositura da presente Ação…’ (fls. 7 e 611 a 614 dos autos), foi, assim, devidamente tutelada pela aprovação da Municipalidade de Indaiatuba do citado projeto de condomínio de casas, conforme alvará expedido por aquela Comuna em 24.11.92, trazido aos autos, seja peto MP apelado (fts. 103 dos autos), seja pelos apelantes (fls. 270 dos autos).

16. Acresce, ademais, que o MP apelado não sustenta em sua exordial nem a nulidade do processo administrativo de aprovação do projeto do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’, nem do alvará que autorizou a implantação daquele empreendimento.

Os documentos juntados aos autos pelos apelantes permitem verificar que foi devidamente processada e fundamentada a aprovação do referido projeto pela Municipalidade de Indaiatuba, conforme se pode extrair dos judiciosos pareceres de fls. 258⁄259, 260⁄268 e 269 dos autos.

Foi por esta razão que, certamente, o sentenciante determinou que fosse dada mera ciência desta ação à Municipalidade de Indaiatuba que, inclusive, não interveio no feito por manifesto desinteresse.

17. Quer se dizer que, no plano da legislação urbanística, os ora apelantes e os condôminos aderentes da incorporação do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’ (também ausentes do feito, embora atuais proprietários de suas frações ideais de terreno e respectivas unidades autônomas) têm até hoje o resguardo da aprovação pela Municipalidade competente dos projetos de implantação de um condomínio de casas.

(…)

No caso presente, as exigências urbanísticas foram supridas pela aprovação pela Municipalidade de Indaiatuba do projeto do ‘Condomínio Residencial Village Terras de Indaiá’.

A comercialização das unidades de dito empreendimento, durante sua fase de implantação, se operou, por seu turno, via proteção do consumidor, corporificada pelo correspondente registro da sua incorporação no Ofício Imobiliário competente, devidamente instruída pelo projeto aprovado pela Municipalidade e demais documentos exigidos pelo art. 32 da Lei 4.591⁄64.(fls. 701⁄704, grifo nosso)

Há que esclarecer, outrossim, que a Lei 4.591⁄64 não estipula a obrigatoriedade de observação de área mínima para a construção das casas, para fins de caracterização de condomínio horizontal. Por outro lado, não há vedação, no caso, ao aumento da área construída, desde que observada a convenção condominial, a aprovação municipal e dos demais condôminos, e ainda que não haja aumento da área do terreno. Essas questões, de acordo com o v. aresto hostilizado, foram respeitadas.

De todo modo, eventuais irregularidades quanto à execução ou modificação do projeto apresentado devem ser fiscalizadas e apuradas pelo órgão público competente perante o Município. Não cabe, nesta sede recursal, ultrapassar o posicionamento do v. acórdão recorrido para entender configurado algum fato lesivo ao Plano Urbanístico do Município ou mesmo o descumprimento dos termos do projeto de incorporação aprovado pela municipalidade, presentes também os óbices das referidas Súmulas 5 e 7⁄STJ.

Por fim, quanto à alegada ofensa ao art. 32 da Lei Municipal 3.525⁄98, o recurso especial não prospera, porquanto é inviável, nesta via recursal, o exame da apontada ofensa a dispositivo de lei local, consoante dispõe o enunciado nº 280 da Súmula do eg. Supremo Tribunal Federal: “Por ofensa a direito local não cabe recurso extraordinário.

Diante do exposto, o recurso especial deve ser parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

É como voto.

Fonte: Boletim INR nº 5183 – Grupo Serac – São Paulo, 30 de Março de 2012