TJ|SP: Ação anulatória de escritura pública e respectivo registro – Cadia de alienações – Compromissos de compra e venda e cessões de direitos não registrados – Relações de direito pessoal – Falta de quitação por compradores intermediários – Escritura lavrada em face do último adquirente – Impossibilidade – Ofensa ao princípio da continuidade dos registros públicos – Prescrição – Inocorrência – Ilegitimidade passiva do tabelionato reconhecida – Recurso provido.
EMENTA
AÇÃO ANULATÓRIA DE ESCRITURA PÚBLICA E RESPECTIVO REGISTRO. CADIA DE ALIENAÇÕES. COMPROMISSOS DE COMPRA E VENDA E CESSÕES DE DIREITOS NÃO REGISTRADOS. RELAÇÕES DE DIREITO PESSOAL. FALTA DE QUITAÇÃO POR COMPRADORES INTERMEDIÁRIOS. ESCRITURA LAVRADA EM FACE DO ÚLTIMO ADQUIRENTE. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DOS REGISTROS PÚBLICOS. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO TABELIONATO RECONHECIDA. RECURSO PROVIDO. 1. Caso envolvendo diversos contratos de cessão de direitos sobre imóvel. Compromissos não registrados. Escrituras não lavradas. Relações estritamente de direito pessoal. 2. Ação interposta por um dos compradores e alienante intermediário em face de todos os que figuraram na cadeira de relações jurídicas. Possibilidade. 3. Demanda que deve ser analisada sob a égide do princípio da continuidade registral, tendo em vista a ausência de relação jurídica entre o último adquirente (em favor de quem foi lavrada e levada a registro a escritura) e os anteriores proprietários. 4. Falta de pagamento do preço ajustado no contrato de cessão de direitos entabulado entre o autor e os corréus que alienaram o imóvel para o último adquirente. Compromisso de compra e venda não aperfeiçoado, eis que negócio bilateral. Impossibilidade de venda a terceiros e consequente outorga de escritura. Ofensa ao princípio supramencionado. 5. Inocorrência de prescrição. Direito de resolver que é potestativo, submetendo-se à decadência. Ação ajuizada menos de 10 anos após a celebração do compromisso entre o autor e os réus inadimplentes. 6. Ilegitimidade passiva do Tabelionato reconhecida. Ação sem cunho indenizatório. 7. Recurso provido para declarar nulos a escritura e respectivo registro, determinando-se a remessa de cópia dos autos à Egrégia Corregedoria Geral de Justiça para verificação de eventual conduta irregular do Tabelião. 8. Apelação do autor provida, com determinação e feito julgado extinto sem julgamento do mérito em relação ao Tabelionato. (TJSP – Apelação Cível nº 0023064-88.2007.8.26.0068 – Barueri – 6ª Câmara de Direito Privado – Rel. Des. Alexandre Lazzarini – DJ. 11.04.2012)
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0023064-88.2007.8.26.0068, da Comarca de Barueri, em que é apelante PAUL ZAHOUL sendo apelados SHIRLEI APARECIDA MARTINS MARTINEZ, JOEL ALLEMANY MINGATOS FILHO, CARTORIO DE REGISTRO CIVIL DAS PESSOAS NATURAIS E TABELIAO DE NOTAS DE PIRAPORA DO BOM JESUS SP, RICARDO CESAR PINTO ANTUNES, NEUSA VENTURINI ANTUNES e ANTONIO DOMINGUES MARTINEZ.
ACORDAM, em 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores FRANCISCO LOUREIRO (Presidente sem voto), VITO GUGLIELMI E PERCIVAL NOGUEIRA.
São Paulo, 22 de março de 2012.
ALEXANDRE LAZZARINI – Relator.
RELATÓRIO
A r. sentença (fls. 311/316), cujo relatório adota-se, julgou improcedente a “ação declaratória de cancelamento de escritura pública c/c cancelamento de registro imobiliário” movida pelo apelante, sob o fundamento de que, tendo este transferido os direitos que detinha sobre o imóvel para os réus Antonio e Shirlei, mediante instrumento particular, não tem legitimidade para reclamar o bem, nem discutir eventual irregularidade na escritura e registro do imóvel.
Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa para cada um dos patronos constituídos pelos réus.
Foram rejeitados os embargos declaratórios do autor (fls. 331), que ora apela, sustentando, preliminarmente, cerceamento de defesa, eis que não colhido o depoimento pessoal de todos os réus, como deferiu o magistrado.
Aduz que tais provas poderiam comprovar a falta de quitação, e a ausência de autorização para lavratura da escritura em nome de terceiros.
Quanto ao mérito, alega que os apelados Antonio e Shirlei (para quem alienou os direitos sobre o imóvel descrito na inicial) não quitaram integralmente o preço avençado, ficando inadimplentes desde a parcela vencida em 06/11/99, e que, de acordo com o contrato, a escritura apenas poderia ser lavrada aos compradores após a quitação total do preço.
Afirma, por conseguinte, que a cláusula 9ª do instrumento firmado com os recorridos Ricardo e Neusa, proibia a lavratura da escritura do imóvel em nome de terceiros, mas somente em nome do próprio apelante, ou a quem este indicasse.
Sustenta que a escritura lavrada em nome do réu Joel está contaminada por vícios de consentimento e erro, eis que não autorizada, e por conter a declaração falsa de que os apelados Antonio e Shirlei teriam pago ao apelante a integralidade do valor constante do documento particular de compra e venda firmado em 06/09/1999.
Alega ter havido violação aos princípios da boa-fé contratual e da função social do contrato, e não ter sido apresentada qualquer prova da quitação.
Requer sejam declarados nulos a escritura lavrada em 18/08/2003 e respectivo registro, fazendo constar como legítimo proprietário o autor, Paul Zahoul.
Afirma que competia ao Tabelião exigir os comprovantes de quitação, o que não foi observado.
Recurso processado sob os efeitos devolutivo e suspensivo (fls. 354).
Contrarrazões às fls. 356/358, 360/367 e 369/382.
Requer o apelado Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas de Pirapora do Bom Jesus-SP, seja acolhida a sua preliminar de ilegitimidade passiva ou a manutenção da r. sentença (fls. 369/382).
É o relatório.
VOTO
I) Observa-se nos autos que, em 20/03/1995, por meio de um “instrumento particular de compromisso de venda e compra de imóvel urbano com benfeitorias e dação em pagamento”, o apelante vendeu aos apelados Ricardo Cesar Pinto Nunes e Neusa Venturini Antunes, um imóvel localizado na Alameda Taquaritinga, 106, Alphaville, Residencial IV, Santana de Parnaíba/SP.
Como parte do pagamento, os apelados ofereceram o imóvel consubstanciado no “Terreno Urbano, Lote 2, Quadra 1, Residencial Tamboré” (dação em pagamento).
O autor/apelante, contudo, não providenciou a lavratura e registro da respectiva escritura.
Por conseguinte, em 06/09/1999, por meio de um “instrumento particular de promessa de cessão de direitos de domínio útil por aforamento da União”, o apelante vendeu o imóvel recebido em dação em pagamento aos corréus Antonio Domingues Martinez e Shirlei Aparecida Martins Martinez,tendo sido acordado entre as partes que o pagamento seria feito de forma parcelada.
Os mencionados réus, por sua vez, também não exigiram a escritura pública de compra e venda, e transferiram os direitos que tinham sobre o imóvel para o apelado Joel Allemany Mingatos Filho, o qual, finalmente, requereu aos promitentes vendedores originários (Ricardo e Neusa) a outorga da escritura, e formalizaram o registro.
A escritura pública foi lavrada em 18/08/03.
Importante mencionar, outrossim, que nenhum dos compromissos foi levado a registro pelas partes, de tal maneira que a questão envolve relações de natureza pessoal.
II) O autor, através da presente ação, pretende o cancelamento da escritura e respectivo registro lavrados em favor de Joel, sustentando, em síntese, que os corréus Antonio e Shirlei não teriam pago o preço total do imóvel, e que não foi chamado para autorizar a lavratura da mencionada escritura.
III) Em que pese o respeitável entendimento adotado pelo MM. Juiz de origem, contudo, o presente recurso deve ser provido, eis que de rigor a procedência da ação.
A análise da demanda deve ser feita sob à égide do princípio da continuidade dos registros públicos, segundo o qual, em relação a cada imóvel individualmente considerado, deve existir uma cadeia lógica e sequencial de titularidades, de tal maneira que a inscrição de um direito somente pode ser feita se o respectivo outorgante aparecer no registro como seu titular.
A respeito do mencionado princípio, alias, o Exmo. Des. Vito Guglielmi, no julgamento da apelação nº 276.519-4/2-00 (6ª Câmara de Direito Privado, j. em 20/04/2006) destacou a lição de Afranio de Carvalho, que ora se transcreve:
“O princípio da continuidade, que se apoia no de especialidade, quer dizer que, em relação a cada imóvel, adequadamente individuado, deve existir uma cadeia de titularidades a vista da qual só se fará a inscrição de um direito se o outorgante dele aparecer no registro como seu titular. Assim, as sucessivas transmissões, que derivam umas das outras, asseguram sempre a preexistência do imóvel no patrimônio do transferente”. (Registro de Imóveis. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1982. p. 304)
A menção ao referido princípio é importante, tendo em vista a ausência de relação jurídica entre os antigos proprietários (Ricardo e Neusa) e o último “comprador”, Joel, a favor de quem foi diretamente lavrada e registrada a escritura do imóvel.
Conforme o breve relato dos fatos realizado no item I, observa-se que a questão envolve uma cadeia de relações jurídicas, ou seja, vários contratos de cessão de direitos correspondentes ao “domínio útil por aforamento da União” relativo ao imóvel descrito na exordial.
E, de acordo com o art. 237, da Lei nº 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), “ainda que o imóvel esteja matriculado, não se fará registro que dependa da apresentação de título anterior, a fim de que se preserve a continuidade do registro”.
Anota-se, então, que a realização do registro depende da existência de título anterior, guardando um encadeamento lógico de direitos reais (os quais, diferente dos direitos de natureza pessoal, são dotados de oponibilidade erga omnes contra todos justamente em razão de sua publicidade), para que haja, assim, estrita observância ao princípio da continuidade registral.
Porém, como o caso em apreço envolve relações de direito pessoal, ante a ausência de registro dos compromissos e escrituras, e, repita-se, ante a inexistência de relação jurídica direta entre o apelado Joel e os correqueridos Ricardo e Neusa, perfeitamente cabível a presente demanda para discussão da escritura lavrada e respectivo registro.
IV) Conforme já reconheceu este Tribunal de Justiça em outras oportunidades, as ações de adjudicação compulsória, em que o último adquirente pretende a obtenção de escritura, devem ser propostas contra todos os cedentes que figuraram na cadeia de cessão de direitos do bem imóvel, sob pena de afronta aos preceitos da especialidade e continuidade dos registros públicos.
Nesse sentido: Apelação nº 0047583-06.2008.8.26.0000, Rel. Des. Moreira Viegas, 5ª Câmara de Direito Privado, j. em 15/02/2012; Apelação nº 9138496-41.2009.8.26.0000, Rel. Des. Caetano Lagrasta, 8ª Câmara de Direito Privado, j. em 13/10/2011; Apelação nº 377.220-4/4, Rel. Des. Waldemar Nogueira Filho, 6ª Câmara de Direito Privado, j. em 21/02/2008; Apelação nº 276.519-4/2-00, Rel. Des. Vito Guglielmi, 6ª Câmara de Direito Privado, j. em 20/04/2006.
O contrário, como a hipótese em apreço, portanto, também é verdadeiro, tendo o autor (participante de uma das relações jurídicas intermediárias) legitimidade e perfeito interesse em levantar eventual nulidade da escritura e registro feitos diretamente em favor de Joel.
V) Assiste razão ao recorrente quanto ao vício suscitado, qual seja, a falta de pagamento do preço ajustado no contrato de cessão de direitos entabulado entre ele e os correqueridos Antonio e Shirlei.
Isso porque, competia aos mencionados réus a prova de quitação (art. 333, II, CPC), o que poderia ter sido feito com a simples apresentação de recibo, comprovante de depósitos, etc.
Todavia, preferiram quedar-se inertes, trazendo a mera alegação de que “as provas carreadas nos autos em tela não trouxeram à baila certeza da ausência de quitação do contrato firmado com o Apelante” (fls. 357 trecho extraído das contrarrazões).
Em contestação, outrossim, limitaram-se a afirmar que o pagamento foi feito nos termos do contrato (fls. 219).
Desse modo, sendo certa que a prova do pagamento compete a quem pagou (art. 320, CC e art. 333, II, CPC), deve ser reputado como verdadeiro o inadimplemento dos réus Antonio e Shirlei.
Importante mencionar, ainda, que nenhum dos outros requeridos apresentou qualquer prova de quitação do mencionado contrato intermediário, de maneira que não se pode reputar como aperfeiçoado.
Evidente, portanto, que a informação contida na escritura, no sentido de que os valores ajustados no referido contrato foram integralmente recebidos pelo apelante na forma contratada (fls. 21/verso, item II, letra “b”), não é verdadeira.
Ademais, não pode a escritura pública da qual o apelante não foi parte estabelecer que “a presente escritura cumpre e torna sem mais nenhum efeito o seguintes instrumentos particulares (…)”, englobando, assim, o contrato entre Paul Zahoul (autor) e Antonio e Shirlei.
Daí, porque, impõe-se que o fato seja levado a conhecimento da Egrégia Corregedoria Geral de Justiça.
VI) Sem guarida, por outro lado, a prescrição suscitada pelos recorridos.
Isso porque, como é cediço, a ação de reconhecimento de nulidade tem natureza declaratória, visando eliminar eventual vicío que não convalesce e nem se confirma com o decurso do tempo (art. 169, CC), de maneira que não é suscetível de prescrição.
Sob outro aspecto, embora tenha prescrito o direito do apelante de cobrar as parcelas inadimplidas pelos réus Antonio e Shirlei, uma vez que o inadimplemento se deu em novembro/1999 e a presente ação somente foi ajuizada em agosto/2007, a pretensão à rescisão contratual com a restituição das partes ao seu status quo ante, ainda subsiste.
Conforme já apreciou esta 6ª Câmara de Direito Privado em outra oportunidade (Apelação nº 0184527-69.2009.8.26.0100, Rel. Des. Francisco Loureiro, j. em 16/02/2012), o direito de resolver o contrato não tem natureza de direito subjetivo em sentido estrito, pois, como envolve uma manifestação unilateral de vontade pelo contratante lesado, deve ser entendido como um direito potestativo propriamente dito.
Disso decorre que mencionado direito não se encontra sujeito à prescrição direta, mas sim à decadência.
Mas, nesse interim, não tendo sido fixado um prazo específico de decadência, a hipótese se insere na regra geral de 10 anos do Código Civil em vigor (art. 205, CC/2002) ou de 20 anos do Código Civil de 1916 (art. 177).
Para melhor ilustrar o raciocínio esboçado, abaixo se transcreve um trecho do voto de Relatoria do Exmo. Des. Francisco Loureiro, relativo ao precedente acima mencionado:
“A resolução se encaixa como um direito extintivo de impugnação, ou de agressão, com a ressalva de que tem origem em fatos ocorridos em momento posterior ao do nascimento do contrato. Importante essa ressalva, para fazer a distinção entre a natureza da resolução e a da anulação, ou declaração de nulidade, pautadas em fatos existentes no momento da estipulação. Lembre-se que, enquanto a ação de anulação ataca diretamente a relação em seu fundamento, invalidando o contrato, a ação anulatória mantém integro o contrato, no plano da validade, afetando somente os seus efeitos.
Como o exercício do direito de resolução supõe e requer uma manifestação de vontade unilateral do contratante lesado, com o propósito de formar ou extinguir relações jurídicas concretas, a doutrina mais moderna o tem tratado como direito potestativo. Fala-se, assim, em direito formativo (porque transforma um estado jurídico) extintivo (porque essa transformação desfaz a eficácia jurídica já produzida) (Ruy Rosado Aguiar Junior, Extinção dos Contratos por Incumprimento do Devedor, 2ª. Edição revista e atualizada, AIDE, p. 26).
Disso decorre que o direito formativo extintivo, por sua natureza potestativa, não se encontra sujeito à prescrição direta.
Na lição de Pontes de Miranda, a ação de resolução, em vista de sua natureza de direito formativo extintivo, não tem prazo fixado de decadência para ser proposta. Está, todavia, atrelada a um direito de crédito do autor, de tal arte que, prescrita a ação creditícia, ficaria sem base a ação de resolução(Pontes de Miranda, Tratado de Direito Privado, vol. XXV, p. 365).
Aliás, ainda que se admitisse que a pretensão de resolver o contrato se encontra sujeita a prazo prescricional e não está a ação é de cunho eminentemente pessoal, de modo que o prazo também seria vintenário no regime do Código Civil de 1.916.” (destaques no original)
Diante de tais fundamentos, e uma vez que a presente ação foi proposta menos de 10 anos da própria data de celebração do compromisso entabulado entre o autor/apelante e os réus Antonio e Shirlei, não há que se falar em decadência ou prescrição.
VII) Superada tal questão e evidente o inadimplemento dos réus Antonio e Shirlei, não há como se reputar aperfeiçoado o compromisso decessão de direitos celebrado entre as referidas partes.
Isso porque, tendo o negócio jurídico verdadeira natureza de contrato de compra e venda, possui como característica intrínseca a bilateralidade, em que a obrigação do alienante consiste na entrega da coisa, enquanto a prestação do adquirente se traduz no pagamento do preço (art. 481, CC).
Desse modo, se os corréus Antonio e Shirlei não adimpliram sua obrigação, não poderiam ter alienado direitos ao apelado Joel.
Nesse diapasão, uma vez rompida a cadeia de relações jurídicas de direitos pessoais que justificava o direito real do requerido Joel, de rigor a anulação da escritura e respectivo registro efetuados na matrícula do imóvel, sob pena de ofensa ao princípio basilar da continuidade dos registros públicos.
Importante lembrar, ainda, que não há qualquer prova nos presentes autos de que o autor tenha sido chamado para manifestar sua vontade a respeito da outorga da escritura.
Competia ao adquirente Joel, ao adquirir um imóvel de quem não é proprietário, tomar as cautelas necessárias no sentido de verificar a cadeia de relações precedentes, de maneira que lhe resta buscar eventuais direitos contra os alienantes (Shirlei e Antonio), se o caso, através de ação indenizatória.
VIII) Ademais, considerando que o apelado Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas de Pirapora do Bom Jesus/SP exerce função meramente administrativa sem responsabilidade jurídica, e que a presente ação não tem cunho indenizatório, deve ser acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva, de modo que, em relação ao referido réu, a ação deve ser extinta sem julgamento do mérito (art. 267, VI, CPC).
É importante consignar, porém, que tal fato não retira a responsabilidade do respectivo titular ou substituto pelos danos eventualmente causados a terceiros (art. 28), o que deverá ser analisado pela via própria, se o caso.
XIX) Conclusão.
Portanto, o presente recurso deve ser provido para declarar nulos a escritura (fls. 21/23) e respectivo registro efetuados na matrícula do imóvel descrito na inicial (R. nº 10/38.218).
Ademais, ante o acolhimento da preliminar de ilegitimidade passiva, declara-se o feito extinto sem julgamento do mérito (art. 267, VI, CPC) em relação ao réu Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas de Pirapora do Bom Jesus/SP.
Por fim, encaminhe-se cópia dos autos à Egrégia Corregedoria Geral de Justiça para verificação de eventual conduta irregular do Tabelião.
Portanto, dá–se provimento à apelação do autor, com determinação e julga-se o feito extinto sem julgamento do mérito em relação ao Tabelionato réu.
ALEXANDRE LAZZARINI – Relator.