1ª VRP|SP: Registro de imóveis – Dúvida inversa – Duas compras e vendas sobre os mesmos imóveis, destinando-se a segunda a completar a primeira – Entre a primeira e a segunda compra e venda, entretanto, a vendedora, por outro título, adquiriu fração ideal dos imóveis – As duas compras e vendas, agora, não se completam, porque ficou excedida a disponibilidade dos vendedores – Dúvida procedente (mantida a recusa do ofício de registro de imóveis).
Processo 0053771-30.2013.8.26.0100
CP 273
Dúvida – Registro de Imóveis
Paraisópolis Agro Pastoril Investimentos e Participações Ltda
Registro de imóveis – dúvida inversa – duas compras e vendas sobre os mesmos imóveis, destinando-se a segunda a completar a primeira – entre a primeira e a segunda compra e venda, entretanto, a vendedora, por outro título, adquiriu fração ideal dos imóveis – as duas compras e vendas, agora, não se completam, porque ficou excedida a disponibilidade dos vendedores – dúvida procedente (mantida a recusa do ofício de registro de imóveis).
Vistos etc.
1. Paraisópolis Agropastoril Investimento e Participações Ltda. suscitou dúvida inversa perante o 6º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo, para ver registradas duas escrituras públicas (uma, lavrada em 11 de fevereiro de 2005, no livro 114, fls. 92/93v, do 1º Tabelionato de Notas e Ofício de Registro de Imóveis de Paraisópolis, Minas Gerais; outra, lavrada em 19 de julho de 2013, no livro 128, fls. 35, do 1º Tabelionato de Notas dessa mesma comarca; nestes autos, fls. 58-63 e 80-81) concernentes a negócios jurídicos sobre os imóveis das matrículas 155.416 e 155.417.
1.1. O requerimento veio instruído com procuração ad iudicia e outros documentos (fls. 06-87).
2. O 6º RISP prestou informações (fls. 90-92).
2.1. Segundo as informações, o primeiro título (fls. 58-63) não fora registrado porque era necessário comparecer Elisabete Cristina Camerin, casada com Moacir João Camerin em regime da comunhão de bens antes da Lei 6.515/1977, o qual Moacir João constava como solteiro na matrícula 155.416: em verdade, a fração ideal de Moacir João (= 1/12) se comunicara a Elisabete, a qual, portanto, também se presume titular (na proporção de 1/24).
2.2. A suscitada apresentou outra escritura pública, pela qual Elisabete lhe vendera 1/24 de cada imóvel. Houve nova devolução, ou para que Elisabete comparecesse como outorgante na primeira escritura pública, ou para que a parte alienada pelos outorgantes fosse reduzida para 21/24. Afinal, assim como estão, as escrituras públicas não se completam: se a parte ideal deles permanecer como 11/12 (= 22/24) no primeiro título, então a parte vendida por Elisabete (= 1/24) no segundo excederá a disponibilidade.
2.2. Os títulos foram prenotados sob n. 559.582.
2.3. As informações foram instruídas com documentos (fls. 94-97).
3. O Ministério Público opinou pela procedência da dúvida inversa, isto é, pela negativa do registro (fls. 99-100).
4. É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
5. A primeira escritura pública (fls. 58-63) de fato não podia ter sido registrada, porque nela devia ter comparecido, ao lado de Moacir João Camerim, a sua ex-mulher Elisabete Cristina Camerin (nascida Elisabete Cristina Guimarães): com efeito, a sociedade conjugal entre ambos existiu entre 15 de maio de 1976 e 15 de setembro de 1982 foram eles casados no regime da comunhão universal, antes da Lei 6.515/1977, de modo que por força do casamento se comunicaram a ela Elisabete as frações ideais que, durante o casamento, a ele Moacir João competiam em cada imóvel (isto é, 1/12, como veio das transcrições 84.257 e 84.256 – cf. a abertura das matrículas a fls. 94 e 97); assim, para que se verificasse que Moacir tinha a plena disponibilidade dessas frações, seria necessário prova cabal em sentido contrário (e. g., partilha em favor dele), o que não houve (cf. fls. 40, em que não se mencionam sequer os imóveis das mats. 155.416 e 155.417 = 6º RISP).
5.1. É insustentável a tese segundo a qual, tendo sido decretada a separação judicial em 1982 (fls. 39), quaisquer direitos de Elisabete à meação dessas frações ideais: afinal, se ex hypothesi houve comunicação, Elisabete era dona, e o domínio é imprescritível.
6. A suscitada Paraisópolis, anos depois do primeiro negócio jurídico (fls. 58-63), tentou obviar a dificuldade celebrando outro com Elisabete (fls. 80-81), ocasião em que ela vendeu a fração ideal de 1/24 de que era titular em cada imóvel. Porém, como estão os dois negócios não se completam: na primeira escritura, foi ajustada a venda do todo, ou seja, 12/12 ou 24/24; porém, desse todo, hoje já cabe 1/24 à suscitada (mat. 155.416, R. 3 – fls. 95; mat. 155.417, R. 2 – fls. 96-97); portanto, os figurantes do primeiro negócio só dispõem, hoje, de 23/24, aos quais não se podem acrescentar mais 1/24 do segundo negócio, do que resultaria a disposição sobre o todo, o que, por força da já mencionada aquisição de 1/24 pela suscitada, é impossível.
7. Do exposto, julgo procedente a dúvida inversamente suscitada por Paraisópolis Agro Pastoril Investimentos e Participações Ltda. perante o 6º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo (prenotação 559.582). Não há custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Desta sentença cabe apelação, com efeito suspensivo, para o E. Conselho Superior da Magistratura, em quinze dias. Oportunamente, cumpra-se a LRP/1973, art. 203, I, e arquivem-se.
P. R. I.
São Paulo, 11 de dezembro de 2013.
Josué Modesto Passos Juiz de Direito
(D.J.E. de 08.01.2014 – SP)