CGJ|SP: Registro de imóveis – Pedido de retificação – Registro que reflete aquilo que consta da escritura pública – Compromisso de compra e venda que não foi registrado, o que impede o registro da cessão – Valor da transação que corresponde ao apontado no título – Inexistência de erro registrário – Necessidade de nova manifestação das partes, em re-ratificação da escritura – Recurso não provido.
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA
Processo CG n° 2011/68548
(205/2011-E)
Registro de imóveis – Pedido de retificação – Registro que reflete aquilo que consta da escritura pública – Compromisso de compra e venda que não foi registrado, o que impede o registro da cessão – Valor da transação que corresponde ao apontado no título – Inexistência de erro registrário – Necessidade de nova manifestação das partes, em re-ratificação da escritura – Recurso não provido.
Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:
Trata-se de recurso interposto por Alberto Fernandes contra decisão do Meritíssimo Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Sebastião, que indeferiu pedido de retificação de registro na matrícula nº 8.874 daquela unidade.
Sustenta o recorrente que firmou, em 17 de outubro de 2008, escritura pública de compra e venda com cessão de direitos, do lote 27 da quadra cinco do loteamento “Balneário Guaecá”. Ele figurou como comprador, José Américo Teixeira Câmera como vendedor e Luciana Leuzzi Lacava como cedente.
Consta da escritura que o proprietário José Américo havia firmado instrumento particular de compromisso de compra e venda com a cedente, pelo valor de R$ 90.000,00, em 22 de junho de 2002.
A cedente, por meio da escritura, transferiu ao recorrente os direitos relativos ao compromisso, pelo preço de R$ 450.000,00. Os dados, porém, foram transportados de forma equivocada para o registro, do qual constou que José Américo havia vendido diretamente ao recorrente, pelo preço de R$ 90.000,00.
Uma vez que o registro deve retratar com fidelidade os fatos, é preciso retificá-lo para que dele conste tanto o compromisso de compra e venda como a posterior cessão, e para que o valor da transação seja corrigido para R$ 450.000,00.
A Douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 68/69).
É o relatório.
Passo a opinar.
A questão discutida não versa sobre registro em sentido estrito. Por essa razão, decidiu Vossa Excelência que o recurso deveria ser recebido e processado como administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, embora tenha sido denominado apelação (fls. 71).
A escritura pública é negócio jurídico privado que consubstancia manifestação formal de vontade dos contratantes, e não pode ser alterada ou retificada na via administrativa. Somente as partes podem alterar-lhe teor, por escritura de re-ratificação.
O que pode ser corrigido é o erro do registro, derivado do descompasso entre o que dele constou e o que figura na escritura pública. Nesse sentido, o parecer da lavra do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria Walter Rocha Barone no Processo 26.445/2010, de 06/12/2010:
“A escritura pública constitui ato notarial que reflete a vontade das partes quanto à realização do negócio jurídico, devendo reproduzir ‘’ipsis literis’ o que foi pactuado pelas partes contratantes e declarado ao Tabelião ou a seu preposto.
Não se pode, por conseguinte, alterar manifestação de vontade contida em escritura pública através de procedimento administrativo, só se podendo fazê-lo, pois, através de outra escritura entre as mesmas partes”.
Da escritura pública de fls. 08 consta como comprador o recorrente e como vendedor José Américo Teixeira Câmera, que figurava na matrícula como titular do direito real. Há menção a um compromisso de compra e venda celebrado entre José Américo e Luciana Lacava, que teria sido objeto de cessão.
Mas não era possível ao registrador mencioná-la, uma vez que o compromisso nunca chegou a ser registrado.
A finalidade do registro de imóveis, como regra, é dar publicidade à constituição, modificação ou extinção de direitos reais, para que possam ter força “erga omnes”. Sem o registro, o compromisso não adquiriu eficácia real, e o nome de Luciana Lacava não chegou a constar da matrícula. Assim, não havia mesmo como registrar a cessão, indicada na escritura, sob pena de violação do princípio da continuidade, razão pela qual a transferência de titularidade foi feita diretamente de José Américo Teixeira Câmera para o recorrente.
O item quarto da escritura informa que o vendedor, “…pelo valor acima citado…”, de R$ 90.000,00, transmite ao comprador a propriedade e posse do imóvel. O item sétimo alude à cessão dos direitos decorrentes do compromisso de compra e venda, pelo valor de R$ 450.000,00, cujo pagamento foi feito à cedente, e não ao vendedor. Pelas razões já expostas, a cessão não pode figurar no registro, porque o compromisso nunca foi registrado. Só a compra e venda podia ser registrada, e pelo valor da escritura, R$ 90.000,00.
O apelante alega que adquiriu o imóvel por R$ 450.000,00, mas não é isso que consta da escritura. O que consta é a aquisição por R$ 90.000,00, e a cessão de posição contratual por aquele valor. E não é possível, nesta via, retificar o que consta do título.
Diante disso, o parecer que submeto à apreciação de Vossa Excelência, é pelo recebimento da apelação como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário Estadual e pelo não provimento do recurso.
Sub censura.
São Paulo, 08 de junho de 2011.
MARCUS VINÍCIUS RIOS GONÇALVES
Juiz Auxiliar da Corregedoria
DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, conheço da apelação interposta como recurso administrativo, na forma do art. 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo, negando-lhe provimento. São Paulo, 15.06.2011. – (a) – MAURÍCIO DA COSTA CARVALHO VIDIGAL – Corregedor Geral da Justiça.