TJ|MG: Apelação cível – Direito de família – Divórcio direto – Regime da comunhão parcial de bens – Imóvel pendente de financiamento – Partilha das parcelas quitadas durante a convivência conjugal até a data da separação fática – Recurso não provido.

EMENTA
APELAÇÃO CÍVEL – DIREITO DE FAMÍLIA – DIVÓRCIO DIRETO – REGIME DA COMUNHÃO PARCIAL DE BENS – IMÓVEL PENDENTE DE FINANCIAMENTO – PARTILHA DAS PARCELAS QUITADAS DURANTE A CONVIVÊNCIA CONJUGAL ATÉ A DATA DA SEPARAÇÃO FÁTICA – RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Na dicção arts. 1.658 e 1.666 do Código Civil, o regime da comunhão parcial implica a divisão de todos os bens adquiridos na constância do casamento, excetuadas as hipóteses legais de não comunicabilidade. 2. Em se tratando de imóvel financiado, só é cabível a partilha das parcelas que foram amortizadas durante o período da relação conjugal, considerando-se o marco final a data da separação fática do casal. 3. Sem o registro no Cartório de Imóveis, não há falar-se em direito de propriedade (art. 1.245 do CC), de modo que incabível a divisão do bem. 4. Recurso não provido. (TJMG – Apelação Cível nº 1.0720.10.001638-8/001 – Visconde do Rio Branco – 2ª Câmara Cível – Rel. Des. Raimundo Messias Júnior – DJ 24.02.2014)
ACÓRDÃO
(SEGREDO DE JUSTIÇA)
Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR – Relator.
RELATÓRIO E VOTO
O SR. DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR (Relator):
Trata-se de recurso de apelação interposto por A.A.A. em face da sentença proferida pela MM. Juíza de Direito da Vara Cível/Precatórias da Comarca de Visconde do Rio Branco/MG, a qual julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, decretando-se o divórcio do casal e determinando-se a partilha dos bens comuns nos seguintes termos (fls. 131/136):
Quanto à partilha de bens, reconheço como patrimônio comum dos litigantes: os direitos relativos a uma motocicleta Honda CG/150 CC, cor azul, modelo ano 2005, placa Haw-2945; os direitos relativos a um veículo Fiat Uno Mille, cor vermelha, ano 1995, placa LAW-9577; um lote situado na Rua Capitão Henrique de Almeida (Rua 6), nº 69, Bairro Primavera; e uma casa de morada localizada na Rua Maria Jorge, nº 24, Bairro Filipinho, tudo, na proporção de 50% para cada um dos cônjuges.
No que tange à edificação da casa situada na Rua Aristides Alvim, nº 182, Bairro Coronel Joaquim Lopes, nesta, deve a autora restituir ao varão 50% do valor pago a título de financiamento, no período de 20/11/2006 até março de 2010, bem como 50% do valor gasto na construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo-se a fase final da obra, ou seja, o acabamento, tudo a ser apurado em liquidação de sentença.
Insurge-se o apelante, exclusivamente, contra a forma da partilha do imóvel que servia de residência para o casal, qual seja, o situado na Rua Aristides Alvim, nº 182, Bairro Coronel Joaquim Lopes, adquirido mediante financiamento na constância do casamento.
A tese é que o bem foi acrescido de benfeitorias e foi valorizado ao longo do tempo. Assim, para uma justa partilha, seria necessário fixar a restituição ao varão, ora apelante, na fração de 50% do imóvel, recaindo sobre ele a obrigação de ressarcir a apelada em 50% dos valores gastos a título de financiamento e gastos comprovados com a reforma desde a separação de fato do casal. Nesses termos, pugna pelo provimento de sua irresignação, asseverando que a partilha do imóvel, tal como foi feita, segundo o valor das prestações do financiamento pagas na constância da vida conjugal, afronta seu direito de propriedade, requerendo, ainda, o exercício exclusivo sobre a posse do imóvel (fls. 142/146).
Sem contrarrazões (fl. 153-v).
A Procuradoria-Geral de Justiça considerou desnecessária a sua intervenção (fl.158).
Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se a controvérsia em aferir se o imóvel localizado na Rua Aristides Alvim, nº 182, Bairro Coronel Joaquim Lopes, adquirido mediante financiamento na constância do casamento, deverá ser objeto de partilha em sua integralidade, porquanto a sentença recorrida apenas determinou a partilha de metade dos valores pagos até a data de separação de fato do casal, além de 50% das quantias empreendidas na construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo-se a fase final da obra, ou seja, o acabamento, tudo a ser apurado em sede de liquidação de sentença.
Ponto conflitante, ainda, diz respeito ao pedido do autor de exercício exclusivo da posse sobre o imóvel litigioso.
Compulsando os autos (fl. 09), constata-se que as partes eram casadas pelo regime da comunhão parcial de bens, previsto nos arts. 1.658/1.666 do Código Civil.
Por tal regime, compreende-se que devem ser partilhados igualitariamente todos os bens adquiridos a título oneroso na constância do enlace matrimonial, independente da prova da contribuição de cada cônjuge para o atingimento da resultante patrimonial, porquanto se presume que o acúmulo de patrimônio seja produto da soma do esforço mútuo do casal.
A respeito do tema, preleciona Maria Berenice Dias:
A comunhão do patrimônio comum atende a certa lógica e dispõe de um componente ético: o que é meu é meu, o que é teu é teu e o que é nosso, metade de cada um. Assim, resta preservada a titularidade exclusiva dos bens particulares e garantida a comunhão do que for adquirido durante o casamento. Nitidamente, busca evitar o enriquecimento sem causa de qualquer dos cônjuges. O patrimônio familiar é integrado pelos bens comuns, que não se confundem com os bens particulares e individuais dos sócios conjugais. Comunica-se apenas o patrimônio amealhado durante o período de convívio, presumindo a lei ter sido adquirido pelo esforço comum do par. (DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p.245).
Nesta perspectiva, depreende-se que, na constância da vida conjugal, o casal contratou financiamento imobiliário para aquisição do imóvel que servia de residência para a família (fls. 15/16 e fl. 23).
Tal financiamento, prevendo 300(trezentas) parcelas, não foi quitado na constância do casamento, sendo amortizadas, até a separação de fato do casal – a qual, segundo pontuado pelas partes, ocorreu em março de 2010 -, aproximadamente 20 prestações.
Dessa forma, permanecendo a apelada na posse do imóvel, e assumindo exclusivamente o pagamento das prestações remanescentes do financiamento imobiliário, consoante se extrai dos recibos de pagamento juntados às fls. 81/86, não merece reparo a sentença que determinou a partilha dos valores do financiamento que foram adimplidos durante a convivência marital.
Frise-se que as partes não possuem a propriedade do imóvel, o que só se perfectibiliza com o registro no Cartório de Imóveis, conforme preceitua o art. 1.245 do CC.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes:
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DE FAMÍLIA. DIVÓRCIO DIRETO. IMÓVEL FINANCIADO. PARTILHA DAS PARCELAS ADIMPLIDAS NO PERÍODO DA CONVIVÊNCIA CONJUGAL. SENTENÇA MANTIDA. – No regime da comunhão parcial de bens, todos os bens adquiridos na constância do casamento devem ser partilhados, pois, passam a integrar o patrimônio comum do casal, pouco importando se houve ou não contribuição financeira por ambos os cônjuges. Em se tratando de imóvel financiado junto à instituição financeira, somente àquelas parcelas adimplidas durante a relação conjugal deverão ser rateadas entre o casal. Tratando-se de imóvel financiado, quanto as prestações vincendas, não há como partilhar aquilo que sequer é de propriedade do casal, porquanto, até o adimplemento integral do contrato, não são eles proprietários do imóvel, mas somente promitentes compradores, conforme se verifica inclusive de cláusula contratual (Apelação Cível Nº 1.0024.11.183275-4/001, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Relator: Des.Washington Ferreira, Julgado em 30/10/2012).
APELAÇÃO CÍVEL. UNIÃO ESTÁVEL. RECONHECIMENTO E DISSOLUÇÃO. PARTILHA DE IMÓVEL FINANCIADO. MEAÇÃO ALCANÇA APENAS AS PARCELAS DO FINANCIAMENTO PAGAS DURANTE A CONSTÂNCIA DA UNIÃO. A meação deve incidir sobre o montante pago durante a união e não sobre a totalidade do bem, sob pena de enriquecimento indevido, somado ao fato de que após a separação de fato o apelado assumiu o pagamento das parcelas vincendas. APELO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70049009160, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Relatora: Desa. Munira Hanna, Julgado em 22/05/2013).
Não admitindo partilha de bem cuja propriedade ainda não foi registrada, pendente financiamento para a sua aquisição, não é viável a solução apontada pelo apelante para a partilha relativa ao bem.
Saliente-se, por oportuno, que a sentença cuidou de incluir nos valores a serem partilhados os afetos às benfeitorias relativas à construção da parte de alvenaria da segunda morada, excluindo, apenas, em escorreita decisão, as quantias empregadas no acabamento do pavimento suplementar do imóvel, posto que os recibos acostados às fls.89/121 atestam que a apelada suportou sozinha os custos da obra.
Com efeito, se o apelante sugere que a sentença deixou de reconhecer algumas benfeitorias, incumbir-lhe-ia o ônus de comprovar a alegada extensão das mesmas e os correspondentes custos, para, então, pleitear a partilha das despesas correspondentes, mas nunca a valorização do imóvel, assinalando que a propriedade do mesmo não é passível de partilha.
Acresça-se que a prova testemunhal foi devidamente interpretada pela magistrada a quo, cujos depoimentos sugeriram que o imóvel conjugal estava em fase preparatória para a edificação do segundo pavimento (fls. 66/67), tendo tal detalhe composto a conclusão da sentença para fins de partilha.
Por derradeiro, não merece prosperar o pedido do Apelante, de ter para si a posse do imóvel.
A uma, porque a apelada vem exercendo a posse desde a separação de fato.
A duas, porque a apelada assumiu a obrigação e vem pagando as parcelas do financiamento.
A três, porque irá reembolsar o apelante, os valores que contribuiu para o pagamento do financiamento.
Logo, a posse sobre o imóvel deve permanecer com a apelada, a qual vem se responsabilizando pelo pagamento das parcelas atinentes ao financiamento imobiliário.
Destarte, por todo ângulo, o apelante somente fará jus à metade do valor efetivamente pago das parcelas do financiamento do imóvel durante a convivência conjugal até a data limite da separação de fato do casal.
Com esses argumentos, NEGO PROVIMENTO AO RECURSO, e mantenho integralmente a sentença, pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.
Custas recursais pelo apelante, suspensa a exigibilidade, ex vi do art. 12 da Lei 1.060/50.
DES. CAETANO LEVI LOPES (REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a).
DESA. HILDA MARIA PÔRTO DE PAULA TEIXEIRA DA COSTA – De acordo com o(a) Relator(a).
SÚMULA: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO.”
Fonte: Boletim INR – Grupo Serac – nº 6303 – São Paulo, 27 de Fevereiro de 2014